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A Lenda de Beowulf

Nova animação de Robert Zemeckis não tem nada de infantil

29.11.2007, às 18H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H31

Mais que uma evolução tecnológica (sobre isso já falamos bastante aqui), A Lenda de Beowulf (Beowulf) levanta discussões interessantes.

A forte temática sexual da história, repleta de fortíssimo subtexto, diálogos sacanas e cenas de nudez mascarada, passou batida pelos orgãos classificatórios tanto aqui como nos EUA. A "casca" digital dos atores parece amainar o olhar censor, que deu ao filme o leve 14 anos no Brasil e 13 anos lá fora. Indícios de que a animação continua sendo vista como coisa de criança. Mesmo quando não tem nada de infantil.

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A estilização da violência, tão comum no cinema de ação, aproveita-se assim das brechas e migra para a história. Nada mais pertinente, afinal Beowulf é um filme que trata essencialmente de como mentiras e distorções - mesmo que sutis - operam os rumos da civilização, motivadas por tentações. O herói, o guerreira geata Beowulf (Ray Winstone), cria "versões estendidas" de seus feitos cada vez que os narra. Tais contos impressionam o fanfarrão Rei Hrotgar (Anthony Hopkins), que também tem lá sua parcela de culpas passadas.

São evidentes os méritos da qualidade do texto bem amarrado de Neil Gaiman e Roger Avary (leia entrevista), que adapta o poema épico ancestral da língua inglesa. Não é por acaso que a talentosa dupla deu um nó nos censores. Sua habilidade em registrar sutilezas, o que está fora da cena, só é superada pela direção de Robert Zemeckis, que efetivamente conseguiu migrar isso do papel para a computação gráfica, neste que é o filme mais expressivo já criado com essa tecnologia.

Ok, a "captura de performance", com a qual o longa foi desenvolvido, ainda tem espaço para ser aperfeiçoada. Em determinados momentos ainda acontece aquele bizarro fenômeno de repulsa que sentimos ao ver algo que parece humano, mas que traz consigo uma estranheza, como se observássemos um cadáver animado. O efeito, que imagino seja explicado por algum gatilho evolutivo (ninguém quer ficar perto da morte), era gritante em O Expresso Polar, primeira incursão de Zemeckis no 3-D, mas dá um salto absurdo adiante em Beowulf. Vale exaltar também a ousadia de Zemeckis em investir nessa evolução, já que todos esses problemas seriam extirpados se os bonecos tridimensionais fossem caricatos, o que imediatamente, pela distância estética, elimina a sensação de assistirmos a mortos-vivos.

Sem as limitações físicas do posicionamento de câmeras e iluminação real, Zemeckis também dá um show de enquadramentos (se bem que o filme fica muito melhor no formatão quadrado do Imax 3-D) e ângulos. Sozinha, a cena da corrente fechando a porta do Salão de Hidromel é exemplo disso. Além da beleza da tomada, quase artesanal, ela escancara uma conquista do cineasta que só posso comparar (guardadas às devidas proporções) às experimentações de Orson Welles com o tratamento da profundidade de campo. Vale lembrar, porém, que obviamente só notará isso quem assistir à versão RealD do filme (no Brasil, disponível nestas salas). Em todo o filme personagens destacam-se perfeitamente do fundo e outros personagens - ocupando seu próprio espaço. E a técnica é relevante também à história... ou o terreno não é fator fundamental à ira de Grendel (Crispin Glover)?

Igualmente bem pensada é a trilha sonora do ótimo Alan Silvestri, colaborador freqüente de Zemeckis. Ajuda o fato de Gaiman e Avary terem escrito as letras das canções, mas a música incidental é misteriosa e empolgante nas doses certas. Preste atenção no tema da Mãe de Grendel (Angelina Jolie). É excelente... transmite em poucas notas toda a ambientação do refúgio da criatura - e seu estado de espírito.

Numa nota menos positiva, as sessões 3-D no Brasil são todas dubladas, o que nos priva do talento vocal do elenco estreladíssimo. Mas aí entra uma limitação incontornável no momento: ainda não há tecnologia disponível para legendagem em 3-D. Isso deve mudar em breve, mas ao menos a dublagem nacional não compromete o filme. Fica a ressalva apenas ao dublador do protagonista. Em diversos momentos achei que estava ouvindo o Shrek... o vozeirão e o sotaque de Ray Winstone fazem toda a diferença.

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