Depois que Antônia foi mal na estréia, apesar de toda a cerimônia que a Rede Globo executou com uma minissérie antes do filme, reafirmou-se o consenso de que o público médio não gosta de ver a "realidade" no cinema, na linha já-basta-o-noticiário. Caixa Dois parte de um ponto semelhante - já é conhecido da audiência e nutre altas expectativas de bilheteria - mas a "realidade" estampada no filme é de outra ordem.
Adaptação da peça homônima de Juca de Oliveira para o cinema, a comédia mostra o que acontece quando o poderoso banqueiro Luiz Fernando (Fúlvio Stefanini) escolhe sua secretária Ângela (Giovanna Antonelli) como laranja para receber um cheque de 50 milhões de reais. Por um engano o dinheiro vai parar na conta de Angelina (Zezé Polessa), mãe de Henrique (Thiago Fragoso), namorado de Ângela. Angelina até devolveria o dinheiro, mas acontece que o seu marido, o caxias Roberto (Daniel Dantas), acaba de ser demitido do banco de Luiz Fernando.
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Como na peça, cada personagem está ali representando um estereótipo social. A ligação entre o banqueiro ricaço, Luiz Fernando, e a professora honesta, Angelina, é personificada em Roberto, o bancário que veste a camisa. O drama de Roberto, perder o emprego e ficar sem rumo, depois de ter dedicado a vida inteiro ao banco, é o mesmo de milhões de desempregados no país. O público vai rechaçar novamente esse lastro na realidade? Improvável. Justamente porque Caixa Dois, ao contrário de Antônia, fala da classe média para a classe média.
Há uma questão crucial aí, que é a maneira como o material de Juca de Oliveira, reproduzido sem grandes mudanças pelo diretor Bruno Barreto (O Casamento de Romeu e Julieta), se adequa à visão de mundo do seu público pagante. Condena-se o banqueiro, glorifica-se a família - se no meio disso sobrar um dinheirinho para os justos, ótimo, mesmo porque roubar de ladrão não é crime. No meio do seu discurso moralizante, o teatro filmado não perde a oportunidade de louvar o jeitinho brasileiro e defender o bom malandro.