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Da Frigideira: Shine a Light

Scorsese e um dream team de cameramen registram os Rolling Stones no palco

13.08.2007, às 00H00.
Atualizada em 06.11.2016, ÀS 19H01

A convite da Imagem Filmes, o Omelete assistiu a 20 minutos de Shine a Light, longa-metragem de Martin Scorsese que registra os dois dias de show dos Rolling Stones no Beacon Theatre de Nova York em 29 de outubro e 1º de novembro de 2006, parte da turnê do álbum A Bigger Bang.

A relação entre a banda e o cineasta começou há 34 anos, quando "Jumpin' Jack Flash" e "Tell Me" entraram na trilha de Caminhos Perigosos. Toca Stones em vários outros filmes de Scorsese. Shine a Light parte, portanto, de uma premissa invulgar: é como dois velhos amigos que só agora estão se conhecendo pessoalmente.

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Cheguei na prévia louco para identificar na tela os traços de estilo de Scorsese, mas é evidente que há estreita margem para "autorias" na gravação de um show. Na impossibilidade de controlar o que se passa no palco, de antever os atos de um Keith Richards, a aposta recai no "registro total": câmeras, trilhos, dollys e gruas em todos os cantos do apertado teatro. Cabe ao diretor, acima de tudo, saber eleger na montagem o melhor ângulo dentre os inúmeros oferecidos.

Não por acaso, Scorsese trouxe para o filme só operadores de câmera topo de linha. A título de curiosidade: Ellen Kuras (Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças), Emmanuel Lubezki (A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça), Andrew Lesnie (O Senhor dos Anéis) e Robert Elswit (Magnólia, Boa Noite e Boa Sorte), entre outros, todos sob o comando do diretor de fotografia Robert Richardson (Cassino, O Aviador).



Dimensões diferentes

20 minutos dá três músicas (mais algumas cenas de bastidores) - no caso, "Jumpin' Jack Flash", que abriu o segundo dia, "Champagne & Reefer" (a décima-primeira do set list) e, em seguida, "Tumbling Dice" (a décima-segunda). Cada uma delas ganha, de acordo com as instruções do diretor, uma dimensão diferente a partir do que é filmado e de como é filmado.

Em "Jumpin' Jack Flash", Scorsese investe na profundidade de campo. Se é a música que abre o show, convém mostrar a banda inteira. A câmera no lado direito do estreito palco do Beacon pega Richards no primeiro plano, Mick Jagger no segundo e Ron Wood, também em foco, no terceiro plano. Ao dispensar o ponto de vista frontal do palco e forçar no lateral, o diretor não apenas capta os três integrantes de uma vez, mas os integrantes em camadas sobrepostas - os Stones sendo um só.

Artifício diverso vale para "Champagne & Reefer", mesmo porque o blues cheio de solos escrito por Muddy Waters não tem a uniforme massa sonora de "Jumpin' Jack Flash". Scorsese privilegia os closes, e nessas horas é bom ter à mão uma variedade de perspectivas. Se Richards cospe o cigarro longe, há uma câmera pronta para pegá-lo. Se Buddy Guy (em participação especial) dá uma piscadela para Jagger, o espectador não perde.

É escorado pela boa operação de câmera que o cineasta faz, então, o que melhor sabe: mexer na montagem com a duração dos planos, intercalando cortes rápidos com tomadas mais longas, para dar sentido à imagem. Os personagens scorseseanos desde sempre se definem pela velocidade algo psicologizante com que cruzam a tela, e Buddy Guy acaba de se tornar um deles.

O momento é o ponto alto da sessão: depois de uma breve variedade de cortes secos de lado a outro do palco, a câmera se detém no rosto do blueseiro como se estivesse congelada. Ele toca a guitarra fora do quadro - é a introdução instrumental de "Champagne & Reefer" - mas a câmera continua detida no close-up. Devem se passar uns dez segundos de plano estático no rosto do músico, o resto do Beacon Theatre no extra-campo. E Buddy Guy, que ainda não tinha aberto a boca, solta o seu poderoso timbre grave. Quem já ouviu-o cantando sabe: Scorsese e os seus câmeras renderam ao blueseiro a cerimônia que ele merece.

Depois disso, dá até pena do mise-en-scène de "Tumbling Dice" - mesmo porque todas as câmeras escolheram seguir Jagger, mas o vocalista dos Rolling Stones, em seu balé de invertebrado, não se deixa enquadrar.



Convencional, mas elaborado

No fim da minisessão fica aquela inevitável sensação de prazer interrompido. Prazer de cinema e prazer de música, vale frisar, porque os shows de 2006 ainda tiveram participação de Jack White (em "Loving Cup") e Christina Aguilera (em "Live with Me"), além de canções raras ao vivo, como "I'm Free".

Shine a Light estava agendado para estrear em setembro, mas os produtores decidiram adiar o lançamento até 2008 - alegam eles, para melhorar o filme. Se os 20 minutos servem de amostra, podemos esperar algo convencional em termos de formato - não é um show conceitual como o Stop Making Sense de Jonathan Demme com os Talking Heads - mas elaborado em termos de olhar. Afinal, como diz Jagger em uma cena de bastidores ligeiramente exibida, "o show é de Marty".





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