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Extermínio 2

Num mundo desgovernado, só a autodestruição nos salva

31.05.2007, às 15H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H25

A certa altura de Extermínio 2 (28 Weeks Later), o grupo de sobreviventes, tentando fugir de uma Londres reinfestada por canibais contagiosos, chega a um descampado onde só há um velho carrossel. A câmera do diretor Juan Carlos Fresnadillo se prende aos desenhos de personalidades da política inglesa, ilustradas na lateral do brinquedo.

Eis o que sobrou do poder na apocalíptica Inglaterra do filme: um adorno.

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Filmes de zumbis são, em essência, metáforas sociopolíticas. O primeiro Extermínio, de 2003, já era assim. Mas só na continuação essa metáfora se desdobra. E o mundo retratado ali é o agora. Governos não mandam mais nada, sequer existem, quando entra em campo o exército dos Estados Unidos - Bagdá, Londres, diferença não há. Extermínio 2 é um filme que a todo momento registra o esforço de manter o mundo em ordem. O caso é que essa ordem já não é fruto de uma estrutura política, de uma democracia propriamente dita, mas de uma imposição bélica.

É o primeiro trabalho de Fresnadillo fora da sua Espanha natal, o primeiro de grande evidência internacional. E desde as tomadas iniciais do filme (leia sobre elas no Da Frigideira) ele mostra que entende de imagens e símbolos. Depois do breve início, que mostra como Don (Robert Carlyle) sobreviveu ao contágio nos arredores de Londres sem se exilar do país, a história se transfere para a Londres sitiada. Faz 28 semanas que ocorreu a infestação, e agora a situação na capital parece controlada. Don volta para lá e reencontra os filhos que haviam fugido da Inglaterra.

Fresnadillo dedica atenção especial à cidade. Sua câmera passeia pelos terraços da City, os grandes edifícios do centro financeiro da cidade, onde atiradores vigiam ruas e apartamentos. De lá de cima vemos o que é solidão. Se no primeiro filme as cenas de ruas vazias já impactavam, esse efeito é potencializado em Extermínio 2. Maior do que o terror de ver uma Trafalgar Square deserta é saber que esse terror pode mesmo acontecer um dia. E os Marines estarão lá para controlar o nada, sem dúvida.

Nem poderia ser diferente: quando a zumbizada volta com tudo, Fresnadillo despiroca. Mete filtro, efeito de luz, câmera na mão, corte clipado, tudo a que tem direito. O ataque no galpão de contenção só não é melhor que a visão noturna no metrô forrado de corpos. Filme de zumbi pressupõe catarse, afinal. Diante daquela visão apocalíptica, retrato do mundo militarizado que estamos construindo para a gente, o único escape possível é se juntar à torcida dos canibais. Não temos um poder a quem recorrer. Só a autodestruição nos vinga.

Ou não. Porque Fresnadillo se permite uma carolice: a família. Ah, a força do núcleo doméstico, essa coisa cristã que nada abala, nada destrói. Não vou falar mais para não estragar surpresas, mas fica a questão para além do filme: é a família que nos salvará? Porque, no fim das contas, foi uma certa culpa cristã de Don que provocou a reinfestação. E aí, como fica?

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