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Crítica

Entre os Vivos | Crítica

Julien Maury e Alexandre Bustillo fazem a sua noite (de terror) americana

01.10.2014, às 11H27.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Desde que despontaram em meio à nova geração do cinema de horror francês com A Invasora, de 2007, os diretores Julien Maury e Alexandre Bustillo flertam com uma mudança para Hollywood que, à exceção de um capítulo de O ABC da Morte 2 assinado pela dupla, ainda não aconteceu de fato. Entre os Vivos (Aux Yeux des Vivants, 2014) funciona, nesse sentido, como uma válvula de escape.

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Maury e Bustillo não são os primeiros franceses a buscar inspiração no cinema de gênero americano, mas talvez sejam os únicos a banhar de sangue sem pudor as inocentes histórias de terror juvenil que se contam nos EUA à beira da fogueira, num acampamento, entre um marshmallow e outro.

O filme começa em um Dia das Bruxas, com suas promessas de travessuras, e logo na primeira cena mostra a que veio: a personagem de Béatrice Dalle, ainda mais perturbada do que em A Invasora, tenta matar o marido, seu filho deformado e o bebê ainda na sua barriga, antes de cortar o próprio pescoço. O marido e o menino monstruoso sobrevivem, e são eles os maníacos que atormentarão ao longo de Entre os Vivos as vidas de quem cruzar seu caminho - no caso, três adolescentes que parecem saídos direto de um filme da Amblin dos anos 1980.

Há evidentes ecos de John Hughes, Steven Spielberg e John Landis nas situações e nos personagens tirados do imaginário americano: o último dia de aula antes das férias, a guerra de comida no refeitório, a detenção da diretora megera, a fuga, o campo de trigo. Um nerd com óculos remendado, a bombinha para asma, o filho rebelde de pai abusivo, a babá gostosa, o posto de gasolina de beira de estrada. De Conta Comigo a Os Goonies, Entre os Vivos cataloga todo tipo de referência que o cinema americano da nossa geração nos ensinou a associar com a puberdade.

Quando Entre os Vivos chega ao seu cenário principal, um terreno abandonado onde funcionava o estúdio de cinema Blackwood, a metalinguagem já está plenamente estabelecida. É curioso notar esse cruzamento de culturas em alguns momentos, como quando o trio de meninos sai do quadro, cobertos por um imenso barco pirata cenográfico, e ouvimos eles se xingando de um jeito que só os franceses pareciam capazes há 30 anos. Essa combinação da fantasia americana com o despudor francês soa promissora, de início.

Mas aos poucos, enquanto Maury e Bustillo realizam sua matança mecanicamente, parece que algo não fecha. É como se essa comunhão pagã fosse insatisfatória desde sempre, porque Entre os Vivos lida com elementos caros ao imaginário americano, como o Bem puro (criançinhas loiras) e o Mal essencial (os chifres de carneiro, símbolos do diabo), mas resiste ao escapismo, nega o que o terror de ninar juvenil tem de inofensivo e, por extensão, nega o acesso à imaginação.

No fim, Entre os Vivos faz de refém o romance de formação adolescente como se oferecesse seus jovens personagens não em provação, mas em sacrifício. Tem cara de cinefilia mas é um exercício de destruição.

Nota do Crítico
Bom

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