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Festival de Cannes é perturbado por retrato da pobreza de Ken Loach

Num dia lotado de filmes marcados por ruínas financeiras, o novo drama do diretor inglês teve recepção indigesta na Croisette, mas rendeu elogios a seu protagonista

12.05.2016, às 19H24.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Prestes a completar 80 anos e decidido a voltar atrás na decisão de se aposentar da direção, o cineasta inglês Ken Loach trouxe para o 69º Festival de Cannes o primeiro "filme-incômodo" da disputa pela Palma de Ouro, gerando mal-estar moral na plateia com I, Daniel Blake, drama de tintas políticas que deixou o público sem falas. Já espocam pela Croisette elogios rasgados ao roteiro, centrado na amizade de um faz-tudo sexagenário e uma mãe solteira, ambos desempregados e desamparados pelo Estado. Uma estrutura narrativa que se interrompe a cada virada - a cada situação de desconforto - com breus na imagem dão um ar de sofisticação atípico para o (necessário, mas) conservador cinema de Loach, laureado com o prêmio maior de Cannes em 2006 por Ventos da Liberdade e, uma vez mais, cotado para vencer.

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Embora o festival só esteja em seu segundo dia, já está aberto o bolsão de apostas para o protagonista de I, Daniel Blake ser premiado, o que seria uma transgressão visto que o já grisalho Dave Johns ganha a vida fazendo comédia stand up nos palcos do Reino Unido. Cinema é uma experiência rara em sua trajetória, dedicada ao teatro. Mas Johns comoveu o Palais des Festivals ao dar vida às amarguras de Blake. Com as finanças em crise depois de sofrer um infarto, ele pena na mão de assistentes sociais e de serviços telefônicos de Seguridade, mas sem perder a doçura... isso até uma cena onde sua paciência dá lugar a um ato desesperado.

Triste até o limite do desencanto, I, Daniel Blake faz um ataque feroz à burocracia inglesa, retratando o país como um território não muito distante de mazelas vividas por países na linha da pobreza. E este ataque é feito nas raias da ironia, o que atenua, ao menos na primeira meia-hora, a melancolia de Loach ao analisar lutas de classe. Seu filme chegou aqui num dia dedicado a questões financeiras na Croisette. Pela manhã, o thriller Jogo do Dinheiro, de Jodie Foster, foi muito aplaudido ao retratar as ruínas econômicas dos Estados Unidos. Na seção paralela Quinzena dos Realizadores, o drama Fai Bei Sogni, de Marco Bellocchio deu um panorama também desanimador da Itália, pulando entre os anos 1969 e 1990 nas trilhas emotivas de um jornalista às voltas com o trauma da morte da mãe.

Nesta sexta, a briga pela Palma segue com a aguardada comédia francesa Ma Loute, de Bruno Dumont, e com o drama alemão Toni Erdmann, da diretora Maren Ade.

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