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Boa Sorte | Crítica

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19.11.2014, às 17H00.
Atualizada em 02.11.2016, ÀS 00H05

Boa Sorte é o primeiro longa de ficção da diretora Carolina Jabor, filha do jornalista e cineasta Arnaldo Jabor. Antes do longa, Carolina dirigiu o documentário O Mistério do Samba, e então encontrou no conto "Frontal com Fanta", de Jorge Furtado, a oportunidade de estrear ficcionalmente. O cineasta e seu filho Pedro Furtado adaptam o roteiro, e a fidelidade ao texto do conto não fazem, de cara, os diálogos primarem pela naturalidade.

A atriz Deborah Secco quis mergulhar de cabeça no filme. Quando soube da produção, procurou a diretora e pediu para fazer o teste para protagonista, em seguida virou uma das produtoras e chegou a emagrecer 14 quilos para encarnar o papel de uma portadora de HIV. A trama acompanha um garoto, João (João Pedro Zappa), de 17 anos, que começa a tomar o calmante "Frontal" de sua mãe com Fanta laranja. Numa boa metáfora sobre o individualismo, quando toma Frontal com Fanta, João acredita que fica invisível, porque se dá conta de que os pais, o irmão e as pessoas na rua não percebem sua presença.

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O uso de remédios leva o garoto a ser internado numa clínica de reabilitação. Lá ele conhece Judite (Secco, atraente e exuberante apesar do regime extremo) e a jornada de autodescoberta tem início.

O filme se passa quase todo dentro da clínica - um velho casarão decadente e adaptado. Com uma direção de arte muito bem cuidada, os cenários misturam a degradação da clínica e uma natureza que invade o concreto. O resultado é lindo. É uma pena que os coadjuvantes e figurantes internados acabem tão estereotipados.

Apesar de Boa Sorte girar em torno da descoberta do amor entre um garoto perdido com uma mulher mais velha, pouco se nota a diferença de idade entre os dois. Judite age como uma adolescente, uma garota um pouco mais maliciosa e com meia dúzia de conselhos, mas tão jovem quanto o garoto. João e Judite vão se autodescobrindo conforme conhecem um ao outro em aventuras pelos cantos da clínica. O longa minimiza questões periféricas para se aprofundar no romance dos protagonistas. A causa dos problemas dos protagonistas é "terceirizada" e acaba sendo creditada aos pais disfuncionais e ausente de ambos.

Caminhando para o final, a metáfora da invisibilidade perde sua força conforme ela é tratada de forma tão literal que perde sua relação com a realidade. O diário de Judite fecha as pontas contando em animação a história que não foi mostrada. A cena é esteticamente linda, com imagens sutis e oníricas. O único problema é que tudo o que se explica na narração do diário já estava explicado nas entrelinhas. Mesmo sendo redundante, o filme acabaria melhor se parasse ao final dessa cena, mas ele peca por se prolongar alguns minutos a mais. A cena final não consegue passar a emoção que pretendia e até a atuação de Secco, que ia bem, se perde nessa sequência pensada para justificar o título do filme.

O longa de Carolina Jabor passa pela relação confusa entre pais e filhos, o uso de drogas ilícitas (pesadas e leves), o HIV, compra e venda de remédio sem receita, o escapismo dos jovens, enfermeiros que abusam das pacientes, a exploração do preço das clínicas. Porém, entre tantos temas complexos, nenhum consegue se desenrolar de maneira satisfatória e Boa Sorte acaba sendo apenas um romance raso, com um desfecho previsível e uma cena final dispensável.

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