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Festival de Berlim 2016 | Filme amazônico, Antes o Tempo Não Acabava retrata juventude indígena de Manaus

Filme gera surpresa com abordagem inédita da periferia da capital amazonense

13.02.2016, às 11H31.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Especiarias amazônicas perfumaram o Festival de Berlim com cheiro de selva e de sexo durante a exibição de Antes o Tempo Não Acabava, produção com CEP de Manaus trazida pelos diretores Fábio Baldo e Sérgio Andrade para a mostra Panorama do festival alemão. Exibido numa manhã de temperaturas mais amenas, graças a uma trégua do frio, o longa-metragem pintou Berlim com o colorido dos índios do Amazonas, ao narrar a trajetória de um jovem que tenta deixar para trás os rituais e as exigências de sua tribo para tentar assumir uma outra identidade, um “nome de branco”. A jornada do rapaz (vivido pelo ator indígena Anderson Tikuna) coincide com uma ciranda de descobertas sexuais, entre mulheres e homens, enquanto ele se ensaia uma carreira de cabeleireiro em uma Amazônia regada a rock’n’roll, de Kraftwerk à banda dos anos 1980 It’s Immaterial.

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Anderson Tikuna vive o protagonista

“Quando vim à Alemanha lançar meu longa anterior, A Floresta de Jonathan, comprei um CD no Museu Etnográfico com gravações de 1908 de manifestações indígenas. Era a simbologia da tradição nas minhas mãos. Mas, aos poucos, conforme o filme foi nascendo, Fábio e eu fomos nos abrindo para outras sonoridades e nos confrontando com algo mais moderno”, disse Andrade, ao fim da première mundial do longa, que despertou a curiosidade dos alemães acerca de ritos de certas tribos da Amazônia retratados na aventura do protagonista, entre eles, a prática de se eliminar crianças portadoras de problemas graves de saúde.

Mas não há, na abordagem dos realizadores, a acentuações de aspectos polêmicos na rotina dos índios. Mesmo as cenas de sexo têm a dose precisa de pimenta. Antes o Tempo Não Acabava passa a léguas de distância de qualquer excesso. Trata-se de um filme minimalista, de interiorização, sobre traumas culturais e utopia individual, com uma montagem que encontra um ritmo próprio (sem correr nem contemplar demais) ao equilibrar floresta e concreto, música eletrônica e gritos tribais. Não é um longa que arrebata, mas consegue, à força de seu rigor estético e de seu olhar avesso a folclorizações, gerar surpresa ao apresentar uma abordagem inédita da periferia de Manaus e do cotidiano da juventude indígenas da Região Norte.

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“Manaus é dicotômica: é centro e margem ao mesmo tempo, é uma cidade-estado, com estrutura labiríntica, onde troncos e paredes parecem travar embates o tempo todo”, disse Baldo ao Omelete por e-mail, antes do festival. “Esta é a Manaus que está no filme, uma cidade que também é roqueira, libidinosa e supermiscigenada”.

Depois de três dias de festival, alguns filmes apresentados em sessões de mercado ou projeções públicas caíram no boca a boca e começam a movimentar a Berlinale. Um dos mais comentados veio de Hong Kong: Dog Days, de Jordan Schiele. Na trama, ambientada em uma metrópole asiática esturricada pelo calor do verão, uma stripper é obrigada a unir forças com um travesti com quem tem rixas afetivas para saber o paradeiro de seu filho, que acaba de ser raptado. É um misto de thriller de suspense, melodrama e reflexões sobre homossexualidade

Outro longa que caiu no gosto de Berlim foi Posto Avançado do Progresso, produção portuguesa dirigida por Hugo Vieira da Silva sobre dois oficiais da pátria lusitana às voltas com questões coloniais em meio ao comércio de marfim no Congo. Sua narrativa sufoca ao falar de isolamento e de burocracia, tendo como base a literatura de Joseph Conrad (No Coração das Trevas). Faz sucesso também o argentino El Rey Del Once, espécie de continuação do cultuado O Abraço Partido (2004), no qual o diretor Daniel Burman faz retoma personagens de um bairro judeu da Argentina para falar de incongruências familiares e impotências sociais da América Latina.

Quanto à disputa pelo Urso de Ouro, o sábado será marcado por um dos títulos mais esperados de toda a berlinale: o documentário italiano Fuocoammare, de Gianfranco Rosi. É alta a expectativa sobretudo pelo assunto do longa: a condição social, física e emotiva dos refugiados africanos que tentam a sorte na Europa. Durante a projeção para a crítica, uma ovação saudou a narrativa panorâmica utilizada pelo realizador de Sacro Grã (Leão de Ouro em Veneza em 2013) para mostrar a realidade da ilha de Lampedusa, porto de chegada de expatriados.

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