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Son of Saul | "A emoção deste filme é a dor", diz diretor húngaro cotado ao Oscar por drama sobre o nazismo

Em entrevista ao Omelete, László Nemes conta o processo de produção do filme com visão diferente do Holocausto

31.10.2015, às 09H33.
Atualizada em 03.11.2016, ÀS 21H06

Encarado pela imprensa mundial como presença inquestionável no rol de concorrentes ao Oscar de melhor filme estrangeiro de 2016, Son of Saul, um mergulho nos horrores do Holocausto dirigido pelo estreante em longas-metragens László Nemes, da Hungria, terá neste sábado (31) uma última exibição na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, onde tornou-se uma sensação popular. Sua projeção será às 19h50 no Espaço Itaú de Cinema – Frei Caneca 1, alimentando ainda mais a expectativa por sua estreia em circuito, ansiada desde sua vitória no Festival de Cannes, em maio. O drama húngaro saiu de lá com o Grande Prêmio do Júri, o Prêmio da Crítica (atribuído pela Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica, a Fipresci) e o Prix François Chalais, que ressalta a documentação de fatos marcantes para a afirmação da vida. E o fato em questão no longa de Nemes é o calvário do Sonderkommando, grupo judeu forçado pelos nazistas a ajudá-los nos extermínios nos campos de concentração. 

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“Desde criança, eu sou assombrado pelos relatos da minha família sobre parentes que foram deportados por conta da 2ª Guerra Mundial”, confessou o diretor, hoje com 38 anos, em entrevista dada ao Omelete em Cannes. “Esse interesse de menino encontrou ainda maior ressonância quando descobri uma série de textos que haviam sido enterrados em Auschwitz-Birkenau em torno de 1944 narrando as experiências dos judeus que foram forçados a trabalhar nos fornos crematórios para a ajudar os nazistas. Eram documentos sobre uma experiência de submissão que eu queria compartilhar com o cinema. A partir desses textos, decidi que não poderia fazer um filme clássico sobre guerra e sim algo que transmitisse apenas as percepções sensoriais de uma pessoa. Era um meio de ressaltar os dilemas da condição humana, sem ficar submisso à História”.

Saul Ausländer foi a pessoa escolhida por Nemes para servir de guia para o olhar do espectador. Interpretado pelo poeta e músico Géza Röhrig numa atuação de gelar estômagos, Saul é um Sonderkommando húngaro encarregado de cuidar do forno crematório de Auschwitz-Birkenau. Ao encontrar o cadáver de um menino que deve incinerar, ele passa a crer que aquela criança poderia ser seu filho e decide dar a ele um enterro digno, sob as bênçãos de um rabino. Mas para isso, terá de driblar o cerco dos nazistas a seu redor. Suas idas e vindas entre os labirínticos corredores do campo de concentração rendem sequências vertiginosas, com a câmera sempre restrita aos limites do olhar de Saul, como se reproduzindo suas sensações.

“Podemos definir Son of Saul como um protótipo de pesquisa audiovisual, que busca reconstituir, fisicamente, a experiência do encarceramento, deixando todo o resto em relação ao entendimento da II Guerra para a imaginação do espectador”, explica Nemes, que antes só havia dirigido curtas e trabalhado como assistente do aclamado diretor húngaro Béla Tarr (de O Cavalo de Turim). “Este filme se atém ao registro do que se passa ao longo de um dia e meio em um lugar fechado e abafado por gritos, buscando transmitir à plateia as emoções de quem esteve preso ali. Mas não espere algo que corresponda ao conceito convencional de emoção. Tanto que eu evito expor o que se passa, por exemplo, nas câmaras de gás. Não poderia resvalar em nenhuma violência iconográfica, pois seria gratuito e óbvio”.   

Orçado em 1,5 milhão de euros, Son of Saul contou com muita câmera na mão, sem tripé, mas não abriu espaço para os tremores e o chacoalhar característicos de quem filma manualmente: tem um rigor quase matemático nos enquadramentos. Durante sua passagem por Cannes, a nata da crítica mundial saudou o filme. “É uma estreia arrebatadora para um diretor, criando um filme de horror real”, elogiou Peter Bradshaw, no The Guardian. Para o site Indiewire, Nemes “recontextualizou o Holocausto com um imediatismo raro”. Revistas como Awards Daily já apostam que ele pode concorrer também ao Oscar de melhor diretor e Géza ao de melhor ator. E, em geral, todos se surpreendem com a decisão do cineasta em ter filmado em película 35mm em um momento em que a opção geral é pelo digital. “Béla Tarr foi a minha escola no cinema e ele filma assim, em película, por enxergar que o verdadeiro processo do cinema passa por um suporte físico”, explica Nemes. “O que eu acredito é que a película te obriga a tomar decisões de véspera, decisões que são única da direção e que não podem ser adiadas. Filmando em digital, você não tem limitação de material algum. No máximo, descarrega o cartão de memória da câmera e o reaproveita. Por isso, pode filmar à vontade, sem o parâmetro do erro, com a opção de corrigir o que for na montagem. Mas eu tinha pela frente um set onde se falavam 8 línguas diferentes, do alemão ao iídiche. Era importante zelar por tudo. E a película me dava maior senso de vida. E a vida passa pela química, assim como a película”.

Sobre o fato de Son of Saul ser encarado como um filme de terror, Nemes concorda: “Não abriria concessão para a beleza falando de uma realidade dessas. A emoção aqui é a dor”

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