Não é nada empolgante dizer que Papers, Please coloca o jogador no papel de um funcionário burocrático de uma república socialista. No entanto, a obra do estadunidense Lucas Pope consegue transformar a tarefa em uma experiência inovadora e imperdível de contar histórias.

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Seu personagem é sorteado para trabalhar no posto de imigração da gloriosa república de Arstotzka. O trabalho começa fácil e desinteressante. No primeiro dia, apenas cidadãos daquele país podem entrar. Cabe a você aprovar ou negar a passagem com um antiquado carimbo.

Conforme os dias passam, gente de outras nacionalidades ganha permissão para entrar em Arstotzka. Cabe ao protagonista olhar atentamente cada documento em busca de incongruências - erros de digitação, informações que se contradizem, fotos que não correspondem ao rosto de quem está do outro lado do balcão. Estas pessoas podem querer visitar parentes ou trabalhar, mas entre elas há terroristas, traficantes de mulheres, procurados internacionais. Sua missão é perceber quem são eles antes que seja tarde demais.

Mas quem se importa? Bem, sua família se importa. Ao fim de cada dia, uma tela exibe o salário irrisório que o protagonista conseguiu e despesas como aquecimento da casa, aluguel, comida e remédios para os parentes - filho, esposa, tio, sogra e sobrinha. O dinheiro nunca é suficiente. Com pouco tempo de jogo já é preciso decidir entre comprar comida ou curar a doença de alguém. Se o gasto for maior do que se possui, o resultado é a prisão. Arstotzka não perdoa devedores.

Cada erro na cabine da imigração garante uma notificação quase instantânea. As primeiras são apenas avisos, mas erros sucessivos trazem descontos nos salários. Nos primeiros dias, tive que decidir entre comprar remédios para meu filho ou minha esposa. A criança morreu porque não havia dinheiro. No dia seguinte, eu, que queria fazer tudo certo pelo bem de Arstotzka, comemorei uma entrega de propina. Saindo do trabalho, consegui comprar remédios para a sogra.

Para evitar os descontos, é preciso ter o máximo de atenção para não errar. Difícil é saber que correto é negar a entrada de uma senhora que foge de uma ditadura violenta. Por causa de um visto vencido, ela foi enviada para a morte. Eu poderia salvá-la, mas a custo das vidas de minha casa.

Repleto de decisões difíceis, Papers, Please consegue contar histórias aos poucos, através de cada documento ou pessoa na fila. Lucas Pope conseguiu nesta obra algo que raros desenvolvedores de games executam com maestria: criar uma trama envolvente, que importe a alguém.

*Na seção Programa de Indie, os redatores do Omelete indicam jogos criados por produtoras independentes. As sugestões são publicadas de forma quinzenal - deixe a sua opinião e compartilhe outros games independentes nos comentários!