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Crítica

Guns N' Roses em São Paulo | Crítica

Não é mais o Guns, mas o fã brasileiro parece não ligar para isso

29.03.2014, às 12H07.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H39

Alguns minutos depois do relógio marcar 21 horas, a banda brasiliense Plebe Rude, grande nome do rock nacional dos anos oitenta, subiu ao palco da Arena Anhembi. Eles sabiam que eram punks e não tinham nada a ver com hard rock ou heavy metal, inclusive deixaram isso claro em sua fala, mas quem vai recusar um convite para abrir o show do Guns N' Roses?

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Fotos: Manuela Scarpa/ Rio news

Mesmo não tendo muita simpatia do público, que esperava já há algum tempo grudado na grade, o grupo que hoje conta com Philippe Seabra e Clemente Nascimento (Inocentes) dividindo os vocais e guitarras levou clássicos da banda como "Até Quando Esperar" e até covers de "Should I Stay Or Should I Go", do The Clash, e "Faroeste Caboclo", da Legião Urbana. Também aproveitou para protestar contra a situação atual do país e homenagear o músico Redson, do Cólera, que faleceu em 2011.

Mas o pessoal queria Guns. E gritava por Guns. Adolescentes com bandanas vermelhas na cabeça, patricinhas com seus namorados, covers de Axl Rose tão iguais que pareciam até ter feito plástica para ficar com o queixo quadrado como o do cantor. Ao fim da abertura, o Anhembi encheu, sem lotar, mas também sem nenhum buraco no público que deixasse Mr. Axl chateado.

Na fila do banheiro feminino, ouviu-se uma gritaria vindo da plateia. Acharam que o show já havia começado, mas não. "Ainda não é ele, amiga", disse a moça esperando. Porque a banda que toca hoje é Guns N' Roses, mas o show é dele. Os anos podem passar mas Axl não perde seu apelo entre o público feminino. Deu 22h30, horário previsto para o início do show, e nada. Aparentemente todos que estavam lá já contavam com o atraso da banda, que virou marca registrada.

A partir de um momento deixei de olhar no relógio, desliguei o celular para a bateria não acabar, mas certamente já eram mais de 23h quando os telões começaram a exibir uma animação de rosas nascendo em um crânio. Pouco a pouco os músicos entraram no palco. O Guns N' Roses conta hoje com três guitarristas, um baixista, dois tecladistas e um baterista. Parece um pouco uma banda terceirizada, mas todos os músicos cumprem extremamente bem seu papel ao longo da apresentação, dando o apoio necessário para o vocalista Axl Rose, que sem dúvida alguma é o motivo de tanta gente estar ali naquela noite.

A música que dá início aos trabalhos é "Chinese Democracy", do álbum homônimo – sim, aquele que levou anos para sair e quando saiu não era nada de mais. Só os fãs mais apaixonados, os que estão nas grades da pista premium e pista comum, que cantam junto. Mas logo em seguida vem uma sequência matadora para começar o baile da saudade: "Welcome To The Jungle", "It's So Easy", "Mr. Browstone" e "Estranged", assim, numa sentada só. E nesta última, uma camiseta com o rosto de Charles Manson foi exibida pelo cantor.

A partir daí, o repertório começa a variar entre canções dos álbums mais antigos, faixas de Chinese Democracy, covers de clássicos do rock como a versão de "Holidays In The Sun", dos Sex Pistols, interpretada pelo baixista Tommy Stinson, e muitos solos e jams. Espectadores menos atentos à moda podem deixar passar desapercebido, mas em diversos momentos do show Axl aparece com jaquetas, chapéus, camisetas e óculos escuros diferentes. Foram seis ou sete combinações diferentes. Os óculos escuros permaneceram até o final do show, e se não fosse pela voz e pelas mechas ruivas que caíam do chapéu, poderia até duvidar se era mesmo Axl Rose ali.

Sobre seu alcance vocal, não há muito do que reclamar: obviamente não é o mesmo dos anos de ouro, mas é o esperado para um artista veterano que já abusou de todas as substâncias que podia abusar. A performance ao vivo de seus contemporâneos, como Sebastian Bach do Skid Row, não é muito diferente. Lógico que algumas canções que exigem mais do fôlego do cantor foram evitadas para não passar vergonha, como "My Michelle".

Num setlist de 30 músicas, incluindo os solos e jams, o melhor certamente foi deixado para o final. Quem queria ouvir "Sweet Child O' Mine" teve seu desejo realizado no meio do show, mas já passava da 01h quando Axl se sentou ao piano para entoar "November Rain" e fazer os casais apaixonados se entregarem. Seguida de "Don't Cry" e "Knockin' On Heaven's Door", foi o momento emocionante, mas logo depois veio a agitada "Nightrain", do álbum de estreia Appetite For Destruction, lançado em 1987. Axl Rose tira os óculos escuros, mas seus furiosos olhos azuis ainda são cobertos pela sombra do chapéu. Seu olhar passa uma sensação um pouco desagradável, de uma pessoa perturbada. Sempre foi assim. A graça é essa.

De volta ao palco para o bis, o assobio de "Patience" começa a ser ouvido sem o ruivo no palco. Ele aparece outra vez, com uma nova combinação de jaqueta de couro, óculos escuros e chapéu. Isqueiros acesos podem ser observados acima das cabeças que acompanham o espetáculo e cantam junto. No momento em que Axl sussurra "patience..." bate a saudade de Slash, Izzy, Duff e Steven Adler. Podiam estar juntos ali naquele palco, mas o frontman não quer. Paciência.

Mais uma jam e a querida "Paradise City" para encerrar. Se Axl foi blasé durante a maior parte do show (e da sua vida), seu agradecimento ao final foi bastante surpreendente. Ele jogou o microfone para a plateia, e embaixo de uma chuva de papel picado e fogos de artifício estourando no palco, agradeceu com veemência. Não, Guns N' Roses não é mais a mesma coisa. O Velvet Revolver em porcentagem tinha mais membros da formação atual. Mas fã brasileiro não se importa muito com essas coisas, e uma chance de ver de perto um dos maiores rockstars de todos os tempos não é abalada nem se ele estiver completamente fora de forma. Na verdade, acabam aceitando o fato de que ele vai se atrasar, não vai cantar como antes, não vai interagir muito com o público, etc. Ninguém saiu da Arena Anhembi frustrado, e já eram mais de 2h da manhã quando o show terminou.

Nota do Crítico
Bom

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