Música

Artigo

Rock´n´roll is here to stay

What exactly the matter with me?

25.10.2002, às 00H00.
Atualizada em 22.01.2017, ÀS 11H07

What exactly the matter with me?

Enquanto a ilha britânica produzia criatividade, novidade, estilo, fúria, o que rolava nos Estados Unidos?

Rolava a invasão do rock’n roll por cavaleiros tristes.

Nenhum elogio quixotesco a estas tristes figuras. Elas eram, de fato, dramáticas sem o humor e a insanidade de Quixote. São eles Pat Boone, Paul Anka, Brian Hyland e Brenda Lee. Essa turma, é certo, aqui e ali, fizeram algo engraçadinho. Por exemplo o Biquíni de bolinha amarelinha (o nome em inglês é muito complicado!); um chuchu de rock’n roll. Mas foi a época do arroubo americanista e beligerante de Elvis Presley, alistado no exército e da marca de pregador evangélico de Boone. Esta vertente, apesar das gracinhas eventuais, se privilegiada, levaria o rock ao túmulo. Não tenho idéia do que o substituiria ou qual seria o epitáfio, mas ainda bem que não progrediu.

Rolava o rhythm and blues e a soul music. Sam e Dave, Otis Redding que, ao lado do blues autêntico, continuavam a música feita por negros com muito mais criatividade e legitimidade do que os brancos babacas. Os Stones e os Animals que o digam. Trocaram figurinhas até a explosão lisérgica.

Rolava a surf music. Do grande Beach Boys ao surfin’ bird do Trashmen, a guitarra virtuosa de Dick Dale e muita adrenalina. Muita rapidez. Muito carro veloz. Muito sol. Muita loira gostosa de peitão e maiô duas peças. Muita pele bronzeada. Frank Zappa começou aí sua carreira. Produtor de uma série de bandas dedicadas a este estilo. Não é à toa que os longínquos punks, acelerados e vivendo rápido, deixam claro o quanto são fãs desta rapidez, deste despojamento, desta pressa.

E rolava a folk music. A vertente da música não erudita que portava, certamente, a semente revolucionária. Leadbelly, Woody Guthrie foram redescobertos e retirados do limbo. A voz anasalada e a competência poética de Bob Dylan ocuparam o cenário. A graça de Mary Travers, a bela voz Peter Yarrow, a presença de Paul Stockley cantavam diretamente para um nascente coração revolucionário. Kingston Trio pareciam revelar a gravidade do momento que se vivia. Pete Seeger era o corajoso a cantar hinos revolucionários e a lembrar ao povo que Guantanamera ficava naquela ilha. P. F. Sloan compunha, sem parar, um bando de sucessos populares. Crise dos mísseis em Cuba, Vietnam War, direitos civis dos negros. Os Estados Unidos estavam conflagrados. No entanto, ninguém sabia muito bem o que fazer. Afinal de contas, o momento mais fascista da história daquele país acabava de acontecer, o MaCarthismo, e a União Soviética tinha posto o Sputinik no céu. A turbulência, o espírito de riot estava no ar.

Interessante é realçar que esta multiplicidade repete o cenário britânico, onde as bandas passavam a apresentar estilos diferentes: o blues e o mersey sound. E não se procurava mais escrever o rock’n roll símbolo. Se Beatles, Stones e outros gravaram Perkins, Berry, Richard, foi para prestar um tributo, indicar de onde partiram; de onde partiram para levar o rock mais longe; como discurso, como musicalidade, como participação no laço social.

É isso. O rock não era mais o mesmo.

Novas texturas musicais, novos estilos e novas influências. Não esqueçam que os malucos da geração beat estavam entupindo-se de drogas e entulhando a nascente Sociedade da Comunicação com poemas, romances e contos. Textos que rompiam com a estética bem pensante da literatura norte-americana e mundial. Escritos que glorificaram a marginalidade, a delinqüência, o rompimento com qualquer ordem de mando, controle e organização.

A era do cavaleiro solitário, do crooner, do cantor que encantava multidões sozinho, com uma anônima banda por trás, foi enterrado. A banda tomava de assalto a cena. Estabeleciam-se a turma, o bando, a identificação feita de grupos de adolescentes ou não tão adolescentes assim com o grupo de rock definitivamente.

Apesar de toda a estética e do discurso novo, uma praga escondia-se e esconde-se atrás da porta: a indústria musical e a possibilidade de fazer dinheiro, muito dinheiro, com a transformação da revolta em produto consumível. Esta tensão, esta luta, nunca abandonou a estrada do rock. Lembro agora o filme Privilégio, a mais contundente denúncia da intervenção do consumismo e da chance de manipulação de corações e mentes no e pelo o rock’n roll. Neste filme, trabalha uma das inglesas mais graciosas que a tela mostrou: Suzanne Pleshette (espero que a memória do memorialista não pregue uma peça!).

Trata-se, portanto, de um belo cenário, de um belo enredo. Mocinhos, os músicos, e vilões, os empresários e muita história acontecendo. Drogas, Timothy Leary e o LSD, revolução dos jovens barbudos cubanos, on the road, guerra fria, intervenção no Vietnã, negros em polvorosa descobrindo-se mais do que Pai Tomás e mais do que os bichinhos de estimação dos brancos que achavam uma gracinha como dançavam e cantavam.

Um novo mundo foi anunciado e eu esquecia a pílula. Aquela, a anticoncepcional. Trepar por prazer, sem risco de reprodução estava ao alcance. Na drugstore próxima.

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