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The Clash - 25 anos de <i>London Calling</i>

The Clash - 25 anos de <i>London Calling</i>

14.12.2004, às 00H00.
Atualizada em 07.11.2016, ÀS 07H06
London Calling
The Clash
5 ovos

O pigarro do punk rock nunca desceu tão suave na garganta do mercado fonográfico como naquele disco. Lançado na Inglaterra em dezembro de 1979, tragava o aroma dos gêneros musicas mais populares das três últimas décadas (do rockabilly ao jazz, do reggae ao soul, do blues à música latina) sob o filtro do punk rock e assoprava uma fumaça sonora densa e irresistível. Ao mesmo tempo, apresentava a fórmula pop dos anos 80 - pena que a maioria esmagadora dos grupos daquela geração tenha maltratado tanto um modelo artístico tão promissor.

London Calling, o LP duplo e maior clássico do The Clash, foi tudo isso: fez o punk inglês recuperar o fôlego perdido com o desaparecimento precoce dos Sex Pistols, antecipou o new wave, apresentou estilos desprezados pela maior parte da juventude rebelde e, sobretudo, alçou o quarteto inglês - Mick Jones (guitarra e vocais), Joe Strummer (guitarra e vocais), Paul Simonon (baixo e vocais) e Topper Headon (bateria) - à condição de grande banda de seu tempo. Agora completando 25 anos, o disco volta à mira da imprensa especializada. A revista mensal londrina Uncut de setembro, por exemplo, dedicou matéria de capa com 18 páginas. A conterrânea Mojo oferece reportagem de 12 páginas.

E a data nem é redonda, embora o dia 14 de dezembro de 1979 seja o mais aceito. Mas o culto ao álbum é tão grande que só faltava um bom pretexto para se voltar a falar dele exaustivamente. A discussão puxa com ela o que mais interessa (material inédito) e o público inglês já tem à disposição um relançamento de luxo - além do CD original remasterizado, um DVD com documentário sobre as gravações e um CD extra com valor especial: The Vanilla Tapes oferece 16 versões demo de músicas que entraram em London Calling e cinco faixas desconhecidas do público. Segundo a gravadora Sony, o material deve chegar às lojas no Brasil agora em dezembro.

The Vanilla Tapes guarda uma daquelas histórias que garantem graça aos bastidores do rock and roll. Esse material era dado como perdido até agosto passado. Mas Mick Jones, guitarrista e cantor do Clash, encontrou as fitas em uma caixa de papelão quando mudava de casa. Até então, a versão oficial dava conta de que o roadie Johnny Green havia esquecido as únicas fitas em um vagão de metrô. Sua missão era muito simples: levar as fitas para o produtor de London Calling, Guy Stevens. Uma parada estratégica em um pub e muitas cervejas, porém, teriam feito Green dormir no trem, acordar apressado para fazer baldeação e deixar as fitas para trás.

Tanto a Uncut como a Mojo ainda se pautam por essa versão em suas reportagens. As fitas encontradas por Jones, portanto, devem ser cópias das originais. Ou a história do metrô não passa de lenda. Curiosamente, as duas revistas também abordam nos primeiros parágrafos de suas matérias uma crítica que Charles Shaar Murray - jornalista do semanário londrino NME - fez sobre o segundo álbum do Clash, Give ‘Em Enough Rope, de 1978. O artigo era duro e culminava com a observação de que o grupo devia "voltar urgentemente para a garagem". Pois o mesmo crítico, depois do lançamento de London Calling, mudou de idéia e decretou que o Clash era a banda mais importante de sua geração.

A síntese do conceito do álbum está na introdução da faixa-título - não por acaso, a primeira do repertório de 19 faixas: guitarras e bateria duras, linha de baixo escorregadia, sonoridade inclassificável. Entra o vocal e Joe Strummer disserta sobre uma Londres decadente, à beira do caos civil. A essência punk está na acidez da letra e no jeito agressivo de tocar mas, musicalmente, o Clash desobedece a cartilha dos três acordes e da velocidade desenfreada. London Calling apresenta a agressividade em andamento cadenciado e arejada por harmonias mais elaboradas.

As 18 faixas seguintes reforçam a idéia de expansão do punk rock. Brand New Cadillac é rockabilly nervoso. Guns of Brixton é um reggae perturbado por guitarras imundas. Lost in Supermarket oferece sonoridade suave para versos ácidos. E Train in Vain encerra o disco com uma espécie de tributo punk ao legado soul das gravadoras Stax e Motown. No atual rock, os efeitos do álbum reluzem principalmente sobre o grupo londrino Libertines. Totalmente influenciado por Clash, a banda tem seus dois discos produzidos por Mick Jones e se apresentou no Tim Festival (leia aqui).

E engana-se quem deduz que London Calling só fez barulho na Europa. Nos Estados Unidos, onde foi lançado em 1º de janeiro de 1980, foi eleito pela renomada revista Rolling Stone o Álbum da década. Aqui no Brasil, o disco também explodiu como bomba, porova disso são os 25 depoimentos colhido junto a representantes do rock brasileiro. "Quem não ouviu London Calling não teve infância", crava Samuel Rosa, do Skank. "Fui morar em Londres para assistir ao Clash, em 80. Vi o show do London Calling e passei metade da apresentação chorando", soma Kid Vinil, ex-Magazine e diretor da rádio Brasil 2000. "Quando ouvi, foi um chute no meu estômago. Desenhei a capa do disco em uma camisa rasgada e ia para faculdade todo rabiscado de London Calling", completa Fred 04, líder do Mundo Livre S/A.

De todos depoimentos, no entanto, o do vocalista Nasi, do Ira!, é o mais devoto. "Foi o disco mais esperado da minha vida. Eu já era fã do Clash e li várias resenhas sobre o London Calling antes de ser lançado no Brasil. Eu pressentia que seria meu disco preferido mesmo antes de escutá-lo. Encomendei ao Museu do Disco e fiquei esperando de manhã a loja abrir. Quando ouvi, foi dito e feito. É o álbum que concede ao punk contornos artísticos: tem ares jazzy, de blues, do Caribe, de rockabilly... E a qualidade das letras? Jones e Strummer, para mim, são Lennon e McCartney do punk", derrete-se.

"Eu não ouvia rock na adolescência, escutava black music. Achava que rock era coisa de velho. Tudo mudou com ‘London Calling. O Clash podia tocar qualquer estilo com atitude roqueira. Virou uma das minhas bandas preferidas a partir desse disco. É um divisor de águas", MARCELO YUKA, do grupo F.U.R.T.O.

"Até hoje é um chute no estômago. Foi o primeiro disco do Clash que ouvi. Pintei a capa do disco em uma camisa rasgada e ia para faculdade todo rabiscado de London Calling. Até hoje está entre os antológicos da minha coleção", FRED 04, Mundo Livre S/A.

"Musicalmente, é o maior disco da época original do punk rock pelas idéias, composições e arranjos. É um dos meus discos preferidos. Quando comprei não botei muita fé mas, para minha surpresa, era excelente", ALVIN L., guitarrista.

"Acho o disco maravilhoso, revolucionário, verdadeiro. Ouvi muito. O legal do Clash é que tem esse vigor da guitarra mas tem uma mistura legal. É equilibrado, não é só punk rock. É a diferença em relação aos Sex Pistols. É um disco que todo mundo tem que ter", YVES PASSAREL, Capital Inicial.

"Foi com London Calling que eu virei fã do Clash. É ali que aparece o trabalho dos dois compositores. Está entre os meus três preferidos de punk rock e os meus dez mais da história", DINHO OURO PRETO, Capital Inicial.

"Comecei a aprender a gostar de punk rock mais tarde, eu só gostava de heavy metal. Mas o Clash revolucionou porque fez de tudo, parece que cada música é tocada pora uma banda diferente", ANDREAS KISSER, Sepultura.

"Assisti ao Clash em Leeds (Inglaterra) durante a turnê de London Calling. Para mim, é um marco. Para aquela geração, esse disco marca uma mudança de comportamento musical. Fui morar em Londres para assistir ao Clash e passei metade do show chorando. Talvez tenha sido o show da minha vida. Foi uma das minhas maiores emoções", KID VINIL, Brasil 2000.

"Quando saiu, não gostei. Achei devagar, que não era punk. Hoje em dia gosto muito do álbum. Eu era muito radical na época. Mas é Clash, né? London Calling abrange mais um monte de som além do punk rock", JOÃO GORDO.

"Gosto muito do disco inteiro. É na medida certa. Na época, tinha que encomendar na importadora para comprar. Era tudo tão novo, tão recente... Os velhos punks eram tão novos. O Clash não era uma banda preocupada com a imagem do punk de carteirinha, o que eu achava ótimo. É um grande álbum", MARCELO NOVA, Camisa de Vênus.

"Ouvi muito London Calling. Entre Sex Pistols e Clash, prefiro Clash. O catálogo é bem mais extenso, sabiam dosar a bandeira política com a musical. É um discão, né? Fez minha cabeça e de muita gente. São essas obras que resistem ao tempo", BETO LEE, guitarrista.

"É um dos discos que eu mais gosto e é uma das capas mais loucas do rock - tanto que foi copiada exaustivamente. Gosto da seqüência das músicas, gosto de ouvir no carro... Tem músicas mais contemplativas, mais lentas, foge um pouco da coisa punk", PITTY, vocalista e compositora.

"É um dos discos que eu mais ouvi na vida. Extrapola a estética punk com novas soluções para a fórmula. A banda está em uma fase muito legal, mistura rock and roll básico com jazz. A faixa-título é meio rock, meio ska. É muito bom", CLEMENTE, Inocentes.

"Acho que é um disco importante. Quando começamos a ouvir punk rock em Belo Horizonte, influenciou bastante o Sepultura até por ter um lance de experimentar, de não ser fechado no punk. Isso é o mais importante do Clash junto com a atitude", IGOR CAVALERA, Sepultura.

"O London Calling provocou a única onda de novidade dos anos 80. A mistura de punk com reggae, letras mais políticas, muita criatividade nos timbres e nas harmonias... Era uma surpresa atrás da outra e uma grande influência nossa", ROGER MOREIRA, Ultraje a Rigor.

"Para mim, é o melhor disco da época. Sou fã, tenho uma banda tributo ao Clash. Ouço o disco do começo ao fim. É pop mas ao mesmo tempo tem pegada. Vira e mexe estou ouvindo, não consigo parar. É de cabeceira", MINGAU, Ultraje a Rigor.

"É tão importante quanto Never Mind the Bollocks, dos Sex Pistols. E é o mais importante do Clash, o mais significativo. É influente até hoje. Você ouve Libertines e vai falar o quê? É puro Clash", THUNDERBIRD.

"Realmente eu gosto muito: um disco perfeito para festa. Para ouvir, dançando e pulando, gritando os refrões. Não lembro da primeira vez que ouvi, mas provavelmente foi numa noite de ensaio com os Replicantes. Acho que foram várias cervejas... Ou seria um vinho tinto?", WANDER WILDNER, Replicantes.

"É o melhor disco do Clash e, para muitos, o maior disco de rock de todos os tempos. Para mim, junto com Nevermind the Bollocks, é o melhor disco de punk rock. Gosto dos timbres das guitarras, dos trabalhos vocais e do jeito deles de tocar reggae - que é muito particular. É um tremendo disco de banda, não tem um destaque individual", EDGARD SCANDURRA, Ira!

"Um dos maiores discos da história, com certeza. Os Libertines ainda estão muito longe. É um clássico: letras bem sacadas, a sonoridade da bateria... Não se fazem mais discos como aquele", SUPLA.

"Comecei a ouvir esse disco mais tarde, quando comecei a ser influenciado por Ramones e outras coisas. É legal para constatar que a simplicidade pode trazer para música muito mais do que todo virtuosismo do rock progressivo, por exemplo. Abriu as portas da minha percepção. Quando estou compondo algo que acho muito rebuscado, ouço London Calling porque é uma aula de rock and roll no sentido da simplicidade", PIT PASSAREL, Viper.

"O Clash me deu meu primeiro disco de rock da minha vida. Era o Combat Rock. Foi louco, a partir desse disco minha vida enveredou pelos rumos do rock e comecei a conhecer outros discos fundamentais, como o London Calling", SYANG.

"Foi o disco mais esperado da minha vida. Antes de sair, li várias resenhas e fiquei instigado porque eu já era fã do Clash. Eu já pressentia que seria o disco da minha vida. Já esperava um disco divisor de águas. É o disco que o Clash viaja por vários ritmos norte-americanos, pelo reggae, pelo blues, pela música do Caribe, pelo jazz, pelo rockabilly. É quando o punk rock ganha contornos artísticos. E a qualidade das letras? Strummer e Jones são como Lennos e McCartney para o punk rock", NASI, Ira!

"Gosto demais desse disco. Quem não escutou London Calling não teve infância. É fantástico. É muito talento para o punk rock", SAMUEL ROSA, Skank.

"Acho o disco ‘bonzão. Me influenciou indiretamente porque influenciou minhas influências. Tenho muita bagagem de punk rock brasileiro. Mas é um dos discos mais importantes da história, um dos discos duplos mais vendidos. É uma parada única, revolucionária", B-NEGÃO, Planet Hemp

"É um dos discos mais importantes para os anos 80. Acho sensacional. Musicalmente, é uma evolução para o punk rock básico dos Sex Pistols. A dupla de compositores é muito boa. Foi meu disco predileto durante anos e ainda escuto muito. Tem vários clássicos", FLÁVIO LEMOS, Capital Inicial

* Texto originalmente publicado no Jornal da Tarde e gentilmente cedido ao Omelete.
** O jornalista Ramiro Zwetsch também escreve na Radiola Urbana, um site que fareja o melhor da nova música e não deixa juntar poeira nos clássicos.

Leia também: Sugestões dos Chefs: London Calling

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