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Crítica

Juiz Dredd Megazine 1 a 4 | Crítica

Como se acostumar aos quadrinhos britânicos

28.08.2013, às 11H41.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 15H05

Os jeitos de fazer, ler e comprar gibi mudam de país para país. Os EUA estão acostumado com as revistinhas mensais em loja especializada, a França com seus álbuns de livraria, nós com o gibi polpudo e barato em banca. Já os ingleses ainda curtem a revista-antologia semanal. E a mais famosa delas é a 2000AD.

A opção feita por uma antologia como a 2000AD implica em decisões de conteúdo: se a revista vai ter umas 30 páginas e precisa de várias atrações, cada uma delas vai ficar com seis, oito páginas. Essas decisões de conteúdo levam a escolhas de narrativa: se antigamente cobrava-se dos autores uma história completa nas seis, oito páginas, hoje elas se estendem por vários capítulos e várias edições - mas alguma coisa tem que acontecer em cada capitulozinho de poucas páginas.

Trinta e seis anos depois de estrear no Reino Unido, o modelo da 2000AD tenta a sorte de novo no Brasil. Agora atende pelo nome Juiz Dredd Megazine, tentando aproveitar a fama do ícone da revista - que todo mundo mais ou menos conhece, seja pelo filme com Sylvester Stallone ou pelo estrelado por Karl Urban, mesmo que poucos tenham lido de fato.

As decisões dos editores brasileiros, Pedro Bouça e Hélcio de Carvalho, são bem interessantes. Primeiro em relação ao formato: para compensar o fato de ser mensal, e não semanal, cada série ganha de dois a três episódios por edição de 64 páginas (o dobro da original), e sai nas dimensões da britânica.

Quanto ao conteúdo, melhor ainda: seria insanidade tentar uma sincronia com a 2000AD original, e igualmente maluco publicá-la desde o início. Então, com acesso aos 36 anos da revista, pegou-se as atrações mais interessantes destes últimos tempos (Área Cinzenta, Áquila, Nikolai Dante), combinadas a histórias também recentes e relevantes de Dredd ("Guerra Total") e outras já consagradas.

Entre os clássicos, é óbvio que Alan Moore entra como chamariz de público (seu nome está sempre no alto da capa). Faz quase três décadas que o barbudão não colabora com a revista, mas estava lá no início de carreira cumprindo estágio para chegar ao estrelato. Moore já demonstrava que era gênio em algumas Future Shocks e Time Twisters que escreveu aos 20 e tantos anos - inclusive em colaboração com o futuro parceiro de Watchmen, Dave Gibbons -, e escavar essas pérolas já vale a Megazine (quem sabe um dia passe de pérolas a diamante: a série A Balada de Halo Jones é a HQ mais famosa de Moore na 2000AD).

Dredd em si tem a mesma premissa há décadas: uma ficção científica violenta com sátira de costumes. Os autores só refinaram as histórias em torno desse conceito. Em meio a uma trama (por John Wagner e Henry Flint) sobre um grupo terrorista que explode bombas nucleares em Mega-City Um, o divertido são as tiradas com bebida em chupeta, o vendedor de carros que segura o estoque ("se acha que os preços estão altos agora, espere até detonarem a próxima bomba!") e a lanchonete McBalofo.

Área Cinzenta (Dan Abnett / Karl Richardson) também vai pelo caminho de deixar sua crítica na cara: na metáfora sci-fi, os migrantes que invadem os países ricos são raças alienígenas na Terra, sujeitas a guetos e sob controle de uma espécie de BOPE (a série é da perspectiva desses policiais). Indo fundo na metáfora, aos aliens é permitido praticar suas próprias culturas - como ouvir música tão pesada que explode a cabeça de um humano -, um respeito fingido pelo extraterreno.

Áquila (Gordon Rennie / Leigh Gallagher) é a trama mais fraca: um ex-escravo romano que recebe uma dádiva divina para ser imortal e vingar-se dos escravagistas. Na prática, é um brutamontes andando pelo Império Romano e estourando a cabeça dos outros, sempre com bastante sangue. Nikolai Dante (Robbie Morrison / Simon Fraser), por sua vez, faz muito sucesso lá fora - o protagonista é um malandro aventureiro com mais sorte que juízo, vivendo num Império Russo futurista -, mas começa devagar.

A revista também traz uma canja de Sláine - o bárbaro que já teve histórias publicadas no Brasil - e também clássicos de Dredd em preto e branco. É um esquema de fuçar os arquivos da 2000AD que deve se manter, principalmente como curiosidade para o leitor brasileiro. Por falar em curiosidade, as edições vêm bem abastecidas de textos sobre o histórico da revista, dos personagens e dos autores.

Mas o grande diferencial da Juiz Dredd Megazine é mesmo essa diferença de ritmo, nas histórias de capítulos curtos e que, por mais curtos que sejam, têm que fazer a trama avançar. Em alguns casos, rende histórias densas, carregadas de texto, como as de Dredd; em outros, como Nikolai Dante e Área Cinzenta, há uma sintonia melhor entre arte e trama. Para quem está acostumado às HQs de super-herói, também se nota a ausência de subtramas - por mais que todas estejam coalhadas de personagens coadjuvantes (às vezes mais difíceis de acompanhar que um episódio solto de Game of Thrones).

No geral, a Megazine vem com a proposta de trazer gibis diferentes do que se vê no Brasil, com um grande cuidado editorial para que o modelo funcione. Vale a pena conferir e apoiar para que essa proposta diferente siga trazendo mais variedade para as bancas.

Nota do Crítico
Bom

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