Séries e TV

Crítica

Narcos - 1ª Temporada | Crítica

Com ambição de painel sociopolítico, série se resolve melhor nos seus poucos momentos episódicos

25.08.2015, às 11H05.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H43

Quando demos nossas primeiras impressões dos três episódios que abrem Narcos, o que chamava atenção era a tendência, nem sempre bem resolvida, das narrativas de José Padilha de criar uma rede de relações que expressasse a complexidade de determinadas questões criminais, políticas, econômicas e sociais - assim foi em Tropa de Elite, RoboCop e agora na história de Pablo Escobar estrelada por Wagner Moura. Padilha não volta para dirigir os sete episódios restantes, e a rede, já estabelecida, no fim acaba funcionando como uma gangorra.

Ao escolher contar a trajetória de Escobar - desde sua ascensão até as "férias" em La Catedral - entrecortada pelo dia a dia público e privado dos homens da lei responsáveis por sua caçada (o DEA, a CIA, o exército, o governo), e ao fazer desses personagens peões numa grande competição de gato e rato, Narcos não consegue escapar da armadilha de reduzi-los todos a um caráter funcional: mesmo os protagonistas da série parecem movidos por decreto e não por uma verdade interior, que os torne de fato personagens multidimensionais.

Nessa gangorra, em que pouco tempo de cena acaba determinando que certo arco pareça mais simplista que outros, o Escobar de Moura é quem sai perdendo mais. Depois dos primeiros três episódios (quando acompanhamos sua "origem" e o evento político que determinou sua ruína), ele se torna um personagem apático. Realmente não é fácil gerar empatia com uma figura real que, por anos, personificou o mal puro na Colômbia, mas a série se ilude ao acreditar que o rancor de Escobar contra a classe política (um rancor tão fácil de gerar e alimentar, sendo a "classe política" esse objeto amorfo e folclórico) pudesse dar tudo o que o personagem precisa para ter uma autonomia dramática, um moto. Mas o fato é que esse Escobar se revela na série um personagem sem propósito.

Talvez tudo se resuma a um problema de cálculo. Numa narrativa de dez episódios, que nas maratonas da Netfix se traduz como um longo longa-metragem, provavelmente Pablo Escobar ficou Cego de Vingança (fim digno de todo grande gângster de cinema) cedo demais. Resta a Wagner Moura fazer o que domina, atuar numa chave melancólica, com aquele desamparo no olhar que está em todas as suas atuações.

Mas tudo tem um lado bom: e em alguns momentos da série, especificamente em episódios que abraçam a natureza funcional de seus personagens e se concentram no lado da lei e do governo, Narcos vai contra essa vocação de longa-metragem e entrega experiências interessantes de televisão episódica. É quando a série mais se aproxima do formato tradicional dos chamados procedurais, aqueles programas de investigação forense que resolvem um caso por semana, como CSI.

E então temos episódios como o quinto, que estabelece bem o clima de mau agouro e de insegurança, particularmente na cena em que o carro do presidente passa entre populares e cada sombra espelhada no vidro nos parece uma ameaça. O desfecho trágico nesse episódio também é mostrado de forma interessante, porque o instante de violência não é encenado, e sim resgatado em imagens de arquivo (um recurso que o restante de Narcos usa apenas como ferramenta de exposição). Numa série que vive o tempo todo ameaçada pela banalização da violência, esse episódio é um alento.

Há outros, como o oitavo, que gera interesse não necessariamente pelo arrojado plano-sequência do brasileiro Fernando Coimbra (O Lobo Atrás da Porta) no sítio de Escobar e mais porque o mistério da identidade do homem que entregou o local do Edifício Monaco consegue dar ao episódio um pequeno propósito além da grande teia de vários fatores. A filmagem elegante de Coimbra, que vai ao close-up com zooms lentos, como se se aproximasse com cautela, torna essa busca envolvente. Em comum, o quinto e o oitavo episódios têm a sensibilidade de priorizar não a exposição, o didatismo das explicações geopolíticas, mas pequenos dramas que se resolvem na hora. De modo geral, falta a Narcos - uma série tão preocupada em criar um painel complexo em dez episódios - a noção dessas pequenas entregas.

Não que o grande arco não se justifique. A temporada termina com as devidas amarrações (como o econômico e direto flashback do piloto que encerra o episódio oito), e a subtrama do agente americano do DEA, que também parecia patinar na apatia, se conclui como um conto moral espelhado na história de Escobar, de isolamento, rancor e desconfiança. Embora fique um gancho relativamente intenso para a segunda temporada, Narcos conta em dez episódios uma história fechada, entre seus altos e baixos.

Nota do Crítico
Bom

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