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Às Cinco da Tarde | Crítica

Às cinco da tarde

15.06.2006, às 00H00.
Atualizada em 22.02.2017, ÀS 13H08

Às cinco da tarde
Panj é Asr
Irã /França, 2003
Drama - 101 min

Direção: Samira Makhmalbaf
Roteiro: Samira e Mohsen Makhmalbaf

Elenco: Agheleh Rwzaie, Abdolgani Yousefrazi, Razi Mohebi e Marzieh Amiri

Se a globalização é questionada por seus efeitos danosos aos países de terceiro e quarto mundo, ela também pode ser apreciada na questão da divulgação de suas produções cinematográficas. Tudo bem que os lendários cineclubes do final dos anos 60 já promoviam sessões com esse estilo de filme. Mas é notório como cineastas de países que não possuem uma tradição no mercado, conseguem hoje exibir cada vez mais seus trabalhos em um incontável número de salas espalhadas pelo mundo.

Às cinco da tarde (Panj é asr, 2003) é um desses casos. O título se refere ao poema espanhol que fala sobre encontrar tempo para sonhos e ambições depois de um dia de trabalho. Ele é um dos primeiros longas-metragens rodados no Afeganistão após a queda do regime Talibã. Com o uso de não-atores e cenários reais, o filme investiga a situação das mulheres no país ao narrar a trajetória de Noqreh, uma jovem que sonha ser candidata à presidência da república. Assim que as escolas voltaram a aceitar o sexo feminino, Noqreh retomou os estudos. Quase todas as alunas, porém, ainda usavam a burca. Aos poucos, durante as aulas, instaura-se o debate em torno da condição feminina e da possibilidade de as mulheres conquistarem os mesmos direitos dos homens. Com a ajuda de um poeta, que estimula seu desejo de se tornar presidente, Noqreh entra em conflito com o pai.

A diretora Samira Makhmalbaf já é uma velha conhecida do público que freqüenta festivais de cinema. Com essa nova produção, a iraniana realiza um belo trabalho que reside entre o choque da tradição com a liberdade. Ao mesmo tempo em que a sua protagonista, Noqreh, questiona o regime machista e autoritário por parte do Talibã, ela não consegue se libertar das amarras da tradição do regime. Em público, longe dos olhos de seu pai, ela usa sapato com salto, vai à escola e dispensa a burca. Atos que são sufocados por ela mesma ao chegar em casa. É nesse ponto que o filme tem o seu maior choque. Será que essas pessoas estão preparadas para ter uma vida de liberdade dos arcaicos mandamentos do Talibã? Ao mesmo tempo, ainda existirá vida se esses mesmos conceitos continuarem a ser seguidos cegamente? E esse questionamento por parte de Samira nos proporciona um olhar de dentro do problema.

A narrativa é envolvente e está repleta de momentos espirituosos com um significado profundo. A discussão sobre política e religião emerge naturalmente sem se tornar piegas. O elenco nos transmite tanta credibilidade, que muitas vezes parece que estamos assistindo a um documentário. E Samira tem um olhar clínico para captar todas essas transformações com sua câmera. Podemos citar diversas cenas como quando a família de Noqreh se refugia nos destroços de um avião ou o palácio bombardeado guardado pelas forças ocidentais a espera de um novo presidente. Até as metáforas se fazem presentes quando um grupo de mulheres com burcas azuis andando pela rua nos lembra um riacho no meio do deserto, isto é, uma representação da esperança. Em contrapartida vemos viajantes se dirigindo para próxima vila, dando uma idéia de que a areia os estaria engolindo literalmente. Essas cenas combinadas provocam uma contradição entre a vida e a morte, ou seja, entre seguir em frente ou padecer.

A câmera de Samira também registra com maestria as paisagens desérticas e destruídas de um país que continua em luta constante para se tornar uma nação. Esse clima bucólico estático provoca uma depressão fílmica, em que a solução do problema está muito longe de acontecer. Se o conflito interno de cada pessoa é uma realidade, como resolver algo tão maior? Inteligentemente, Samira não tenta apontar caminhos, mas sim provocar uma discussão. E talvez esse seja o primeiro passo de uma longa jornada.

Nota do Crítico
Ótimo
Às Cinco da Tarde
Panj é Asr
Às Cinco da Tarde
Panj é Asr

Ano: 2003

País: Irã, França

Classificação: 12 anos

Duração: 105 min

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