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Marcelo Milici | Inferno de Amar – 12 Filmes de Horror para o Dia dos Namorados

Produções para acelerar o coração

12.06.2015, às 18H31.

Abandone toda a esperança aquele que aqui estiver em busca de respostas para seu tormento! "Este Inferno de Amar" já foi explicitado por diversos poetas como Almeida Garret e o ultrarromântico Álvares de Azevedo, sendo o convite audacioso para que Dante Alighieri conhecesse os nove círculos e o sofrimento dos condenados até reencontrar Beatrice. Heathcliff também atravessou a fronteira dessa ilusão tortuosa numa vingança sem fim contra aqueles que o afastaram dos encantos de Catherine, assim como Vlad Tepes renegou a Deus e passou a beber sangue quando perdeu sua amada Elisabeta. As semelhanças entre Inferno e Amor passeiam pela literatura e chegam à Sétima Arte, derrubando King Kong do Empire State Building e obrigando Henry Frankenstein (Colin Clive) a construir uma parceira para sua Criatura (Boris Karloff) para salvar sua esposa Elizabeth (Valerie Hobson).

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Se para você o Amor no Cinema Fantástico não vai além da série Crepúsculo e das adaptações de A Bela e a Fera, é preciso rever seus conceitos. Neste Dia dos Namorados, em vez de apenas presentear o amor de sua vida com aparelho celular, roupas e cartões, por que não aproveitar o momento a dois, após um jantar romântico, para assistir a um bom filme de horror? Afinal, cada susto conduzirá a uma aproximação, um aperto mais forte das mãos e uma troca de olhares temerosos, com o seu bem buscando em você um meio de evitar o Mal! Pensando nisso, para festejar a data dos apaixonados, convido vocês para um passeio por doze produções que podem levá-los a sensações parecidas com as da paixão, partindo de leves calafrios que sobem pela espinha até o acelerar do coração e a falta de ar!

Nossa viagem começa na década de 40, durante a Segunda Guerra Mundial, época em que a enfermeira canadense Betsy Connell (Frances Dee) fazia uma entrevista de emprego para cuidar do atual estado de catatonia da esposa de Paul Holland (Tom Conway), Jessica (Christine Gordon), na ilha caribenha de St. Sebastian. Com o envolvimento dos locais com feitiçaria e vodu, associados a uma conturbada relação com a família Holland, Betsy começa a perceber que a enferma pode estar amaldiçoada e que, talvez, a cura possa vir de rituais comuns na região. Essa descida tenebrosa, com travessia por um canavial assustador, sob o comando do gigante zumbi Carrefour (Darby Jones), conduzirá Betsy e Jessica ao Inferno das tradições, tudo por conta de seu encanto pelo contratante. Inspirados na atmosfera romântica de Jane Eyre, de Charlotte Brontë, Curt Siodmak e Ardel Wray, a partir de um argumento de Inez Wallace, desenvolvem um filme belíssimo, repleto de simbolismos, sem os exageros que consumiriam o gênero nas décadas seguintes. A Morta-viva (I Walked With A Zombie, 1943) é uma belíssima história de amor, daquelas que trazem arrepios e momentos perturbadores e poéticos!

Aliás, poesia é o fio condutor do segundo longa desta série, o mágico Pelo Amor e Pela Morte (Dellamorte Dellamore, 1994), de Michele Soavi. Nele, conhecemos a ingrata profissão de Francesco Dellamorte (Rupert Everett), o administrador de um cemitério onde os mortos se levantam após sete dias. Além das funções burocráticas e mórbidas que seu emprego oferece, ele tem sempre um revólver à disposição para mandar os defuntos de volta para a terra, com um tiro certeiro na cabeça. Mais acostumado com os mortos, tendo apenas a companhia do grotesco Gnaghi (Francois Hadji-Lazaro), certa vez ele se encanta por uma viúva (a estupenda Anna Falchi), com quem inicia uma ardente e curta paixão, já que ela acabará sendo mordida pelo próprio marido, o primeiro zumbi-corno do cinema! Caberá a Francesco a dura tarefa de matá-la, conforme o seu roteiro habitual, mesmo que o ato seja precipitado o suficiente para a culpa levá-lo a visões da amada em outras mulheres. Transbordando ternura e grafismo, na alternância de cenas de romantismo com violência e bizarrices como uma cabeça que se locomove sem o corpo, Pelo Amor e Pela Morte traz paixões reconstruídas pela morte, cadáveres ambulantes e momentos belos como uma declaração de amor.

Um dos principais elementos da mitologia vampírica já surge como um contraponto à ingenuidade de Eli (Lina Leandersson), um convite facilmente aceitável, proposto pelo escritor sueco John Ajvide Lindqvist, autor da obra-prima que inspirou o excelente Deixe Ela Entrar (Let the Right One In, 2008), de Tomas Alfredson. Se antes os vampiros eram caracterizados pela sedução, Eli conseguiu acrescentar beleza e inocência, sem deixar de lado a agressividade e o gosto por sangue. Não teve dificuldades para conquistar o introspectivo Oskar (Kåre Hedebrant), vítima de bullying, morador do subúrbio de Estocolmo. O pequeno deixa transparecer sua insegurança e desejo de vingança numa coleção de recortes de jornal contendo notícias de assassinatos, além da vontade de se tornar mais forte para evidenciar seu instinto violento. A aproximação dos dois, facilitada pela relação difícil com seus "pais" - já que Eli convive com um ex-professor pedófilo e Oskar é praticamente ignorado pela mãe ausente e pelo pai alcoólatra - leva o espectador a acompanhar uma relação estranha, mórbida e condescendente. Os erros do tutor de Eli, Håkan (Per Ragnar), evidenciarão a presença de um assassino cruel nas redondezas, obrigando os pequenos a encontrar meios de enfrentar essas dificuldades com sangue e mortes, carinho e compaixão, num lindo conto que justifica sua terceira posição.

Ela morreria por você“. O que chama a atenção no filme de Brian Yuzna A Volta dos Mortos-Vivos 3 (Return of the Living Dead III, 1993) é o mesmo que moveu Louis Creed em Cemitério Maldito: a incapacidade de aceitar a morte. Como um sentimento bonito, que conduz a uma taquicardia positiva, pode ser interrompido com o cessar das batidas do coração? Assim, o jovem Curt Reynolds (J. Trevor Edmond) aproveita os experimentos do governo para trazer sua amada de volta, embora não imaginasse que ela fosse mudar tanto. Ora, se um relacionamento se alimenta de concessões, o jovem terá que se adaptar à nova Julie Walker (Melinda Clarke), a morta-viva mais bela e sexy do cinema fantástico, inspirando masoquistas com seus penduricalhos dolorosos. Não é para menos que essa produção irregular, bem distante dos filmes anteriores, tenha imortalizado a personagem como representante de um amor necrófilo e nauseante.

A mesma sensação de tocar um Inferno de dor e sofrimento é representada no japonês Audition (Ôdishon, 2000), do ousado diretor Takashi Miike. Pensando num meio alternativo para encontrar sua futura esposa, o viúvo Shigeharu Aoyama (Ryo Ishibashi) faz uma audição fictícia para um filme. Entre as entrevistadas, há a linda, doce e aparentemente frágil Asami (Eihi Shiina), por quem ele se apaixona perdidamente, apostando na garota como sua pretendente ideal. Contudo, o passado desconhecido da jovem revela acontecimentos trágicos que conduzem o apaixonado a uma sessão de torturas brutais, físicas e sonoras, sem que ela saiba que os sentimentos dele são verdadeiros. Amor e dor rimam ricamente nesta obra-prima que metaforiza as sensações desagradáveis proporcionadas por determinadas emoções.

Se está difícil encontrar a pessoa ideal e você não quer arriscar numa audição às cegas, que tal fazer uma? Para a jovem e problemática May (Angela Bettis), protagonista de May - Obsessão Assassina (May, 2002), ainda existe uma chance de encontrar o parceiro perfeito mesmo que, para isso, ela tenha que criá-lo. Já pensou se você pudesse trocar partes de seu amor por aquelas consideradas adequadas para o seu gosto? Desse modo, May observa as qualidades, principalmente as físicas, de cada pessoa com quem se relaciona e resolve extraí-las para montar a ideal, numa versão moderna e ainda mais doentia de Frankenstein, da criação de Mary Shelley. Bullying, assassinatos e desmembramento fazem deste filme de Lucky McKee um obra de autoajuda, daquelas que você poderia recomendar para aquele amigo que só valoriza o rótulo de suas companhias. Só tome cuidado se encontrar May por aí, "ela pode levar o seu coração".

"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas", já dizia a raposa para o Pequeno Príncipe. Já a paráfrase de Lola (Robin McLeavy) seria trocar o verbo "cativar" por "torturar", pois a garota mimada não aceita a recusa de Brent (Xavier Samuel) como parceiro no Baile de Formatura da escola. Assim, pai e filha sequestram o rapaz com a intenção de realizar uma formatura particular para a garota, com altas doses de sangue e feridas abertas. Entes Queridos (The Loved Ones, 2009), de Sean Byrne, é um representante romântico do estilo torture-porn, com violência e zumbis "reais", desenvolvidos a partir de técnicas de trepanação. Martelos, furadeiras e qualquer utensílio cortante são os versos proferidos pela garota que acredita que o amor não correspondido é um machucado que não se cicatriza.

E são exatamente essas feridas que irão atrair os desejos dos adolescentes JT (Noah Segan) e Rickie (Shiloh Fernandez), quando eles descobrem num manicômio abandonado o corpo de uma mulher (Jenny Spain), nua, e presa a uma mesa. A garota-zumbi irá satisfazer os intentos sexuais, nos mais insanos atos de necrofilia, transformando-se num objeto de obsessão e encanto, perturbando e comovendo o público, na representação de uma sociedade por vezes machista. Deadgirl, lançado em 2008, codirigido por Marcel Sarmiento e Gadi Harel, traz em escala menor o que Nekromantik fez em 1987, optando por uma linguagem mais branda, sem exageros, embora deixe transparecer sua força romântica e doente. Uma narrativa de zumbis voltada para o lado humano, com mais conteúdo do que Meu Namorado é um Zumbi (Warm Bodies, 2013), aquela comédia light com boas referências.

Deadgirl é totalmente o oposto do próximo item da lista em homenagem ao Dia dos Namorados. Trata-se do splatter Fome Animal (Braindead, 1992), da época em que Peter Jackson engatinhava na direção e estava distante de sua versão exagerada de King Kong. Entre mortos-vivos, sangue em profusão e todo tipo de nojeiras, existe uma história de amor envolvendo o apaixonado e atrapalhado Lionel (Timothy Balme) e a comerciante Paquita (Diana Peñalver). Depois que a mãe do rapaz é mordida por um macaco-rato da Sumatra, inicia-se um festival de bizarrices, incluindo a estranha relação entre uma enfermeira e um padre-zumbi, gerando um bebê maldito e sarcástico. Uma boa opção para os casais sujos e que dispensarão o jantar romântico.

Já para os casais selvagens, aqueles que trocam carícias na mesma proporção em que se agridem, uma boa escolha é Lobo (Wolf, 1994). Depois que o publicitário Will Randall (Jack Nicholson) é mordido por um lobo, começa a sofrer mudanças físicas e de personalidade, temendo que os crimes na região possam ter o seu envolvimento. Enquanto luta para se manter no emprego, ele se encanta pela filha do chefe, Laura Alden (Michelle Pfeiffer), e os sentimentos são recíprocos, tornando-se evidentes no último ato com uma regra alternativa para a licantropia: você se torna um lobisomem se for mordido ou se apaixonar por um. Elenco espetacular, atuações interessantes e uma briga de peludos que homenageia o clássico O Lobisomem de Londres (Werewolf of London, 1935), estão entre as justificativas para que essa obra seja recomendada!

A décima primeira posição é ocupada pelo amor platônico, aquele que as diferenças tentam reparti-lo a qualquer custo. Talvez você tenha pensado em Ghost - Do Outro Lado da Vida (Ghost, 1990) ou até mesmo Tromeo and Juliet (1996), a versão da Troma da clássica obra de William Shakespeare. Poderiam estar presentes aqui, cada um com sua própria defesa e responsabilidade, mas prefiro uma outra produção com a mesma oposição. Trata-se da aventura sci-fi O Feitiço de Áquila (Ladyhawke, 1985), trazendo mais uma vez a belíssima Michelle Pfeiffer. Ela interpreta Isabeau, cobiçada pelo terrível Bishop (John Wood), mas apaixonada por Navarre (Rutger Hauer). Por conta dessa paixão proibida, o casal foi amaldiçoado por um encanto: todas as manhãs, ela se transforma em águia; e ele, em todas as noites, em lobo, impedindo contatos físicos. No auxílio do casal, está o ladrão Philipe Gastone (Matthew Broderick), disposto a encontrar meios de quebrar o feitiço, mesmo que a solução exija assassinato e sacrifício. Esse filmaço de Richard Donner é auxiliado pela fotografia avermelhada de Vittorio Storaro, que permite que a paixão se acentue em cada frame. Como bem disse Carlos Drummond de Andrade: "As coisas tangíveis tornam-se insensíveis à palma da mão, mas as coisas findas, muito mais do que lindas, essas ficarão".

Para finalizar esta seleção apaixonada, peço desculpas pelo óbvio. Seria uma injustiça, e motivo de muita cobrança dos omeleitores, se eu não mencionasse o slasher Dia dos Namorados Macabro (My Bloody Valentine, 1981), da época em que datas comemorativas serviam de justificativas para o nascimento de serial killers. A motivação da vez envolve um incidente nas minas da pequena Valentine Bluffs, culminando na morte de vários mineradores graças à irresponsabilidade de dois seguranças que optaram por participar de uma festa de Dia dos Namorados. O único sobrevivente, Harry Warden, teria sido encontrado semanas depois no local devorando um cadáver. Passados 20 anos, o prefeito (Larry Reynolds) acredita que a tragédia já foi esquecida e quer trazer de volta as comemorações da data, pelo lado comercial e festivo, porém logo receberá de presente uma caixa de bombons em formato de coração, contendo em seu interior...um coração de verdade, ensanguentado, e alguns versos. Periodicamente, jovens serão vítimas do assassino com roupas de minerador, portando uma afiada picareta, e levando todos a questionar se Harry teria voltado para encerrar as comemorações. Será? Um bom exemplar do período, Dia dos Namorados Macabro traz muitas mortes e violência sugerida, sob muita influência de Sexta-Feira 13 e Halloween. Teve uma refilmagem inferior em 2009, com efeitos em 3D e sangue em profusão.

Como um fim de relacionamento sem mágoas, encerramos por aqui nossa lista de produções que homenageiam o Dia dos Namorados. É provável que o leitor sinta falta de muitos filmes com casais apaixonados e paixões vingativas como O Dia do Terror (Valentine, 2001), Drácula de Bram Stoker (Bram Stoker’s Dracula, 1992), A Múmia (The Mummy, 1932), A Noite do Terror (Night Tide, 1961), Atração Fatal (Fatal Attraction, 1987), A Marca da Pantera (Cat People, 1982) etc. São exemplares interessantes e que também merecem menção e recomendação - quem sabe podem aparecer numa continuação ou remake deste artigo no próximo ano? E vocês, caros omeleitores, para estreitar a nossa relação, que filmes sugeririam para esta data especial, como parte do gênero fantástico?

"Sei que vou sentir a falta dela. Então tive que mantê-la por perto. Está enterrada bem no meu quintal". ("Used to Love Her", Guns N' Roses)

*  Marcelo Milici é professor, com especialização em Horror Gótico, idealizador do Boca do Inferno, fã de rock´n roll e paçoca.

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