Filmes

Artigo

Festival de Cannes | Desenho iraniano surpreende em competição para estreantes

Na briga pela Palma de Ouro, filme francês sobre AIDS é ovacionado

20.05.2017, às 12H14.
Atualizada em 20.05.2017, ÀS 14H06

De onde menos se poderia esperar um filme de animação, o Irã, cuja industria do local, no setor, faz mais curtas-metragens e comerciais, chegou um dos títulos mais impressionantes (e visualmente vigorosos) do Festival de Cannes até agora: o desenho Tehran Taboo.

Feito na técnica chamada rotoscopia, na qual imagens captadas com atores são animadas até parecerem desenhos vivos, este mergulho no lado B da cultura iraniana é uma ode à força feminina, alternando humor e lagrimas num grau até agora não experimentado em sua secção, a Semana da Critica. Paralelo à peleja pela Palma de Ouro, este evento é dedicado a estreantes que estão no primeiro ou no segundo longa. Ali Soozandeh, que nasceu em solo iraniano mas tem nacionalidade alemã, dirige este drama animado de 96 minutos tendo no currículo uma vasta experiência em curtas.

Todo ano, em maio, o Irã é agitado por eleições, um período em que muita violência se espalha entre o meu povo. Mas este ano, não se derramou tanto sangue”, afirmava o animador antes de exibir este filme coral sobre uma série de personagens que se esbarram em algum momento seja pela corrupção estatal (policial, sobretudo), seja pelo sexo.

Entre os protagonistas estão uma garota de programa que leva o filho consigo para o “trabalho”, uma mulher-pipa (que usa um papagaio para voar) e um musico que precisa de dinheiro para submeter sua amante a uma operação para restaurar sua virgindade. Cada ação deles revela detalhes sobre o modo como o Irã lida com o sexo, pago ou não, e com a tolerância.    

Neste domingo, Tehran Taboo vai conhecer seu rival brasileiro, Gabriel e a Montanhai, de Fellipe Gamarano Barbosa, o único longa nacional em concurso em Cannes em 2017. Quem já viu afirma que a produção pode surpreender pela força visual da fotografia de Pedro Sotero, o mesmo de 'Aquarius', ao visitar diferentes países. Diretor do cult 'Casa Grande', Gamarano revive a história real do economista brasileiro Gabriel Buchmann, morto ao escalar o monte Mulanje. Na trama, ele é vivido por João Pedro Zappa (de Boa Sorte).

Na competição pela Palma de Ouro, onde o russo Loveless (trágica reflexão sobre o desamor, a partir da batalha de um ex-casal para recuperar o filho desaparecido) vinha disparado como o mais elogiado competidor, o jogo parece ter virado em favor da França. A cidade hoje suspira de amores por 120 Battements Par Minute, de Robin Campillo, cuja narrativa febril revive um período histórico bem recente no qual a Aids segrevava seus potadores num de violência intolerável – que abrandou, mas não acabou. Teve até ola pro diretor ao fim da projeção, aplaudida com ardor neste sábado. Aula de solidariedade, o filme revive o ativismo em prol da luta dos seropositivos nos anos 1990, a partir de um grupo que muda sua vida ao se engajar na defesa dos doentes mais segregados – inclusive pelo Estado. Sua abordagem calorosa - sobretudo da cena gay europeia - tem tudo para amolecer o coração do diretor espanhol Pedro Almodóvar e seus jurados na briga pela Palma dourada. É um olhar para universo LGBT como raras vezes se viu. Nervoso, feérico e isento de moralismo, ele faz ficção a partir de reminiscências reais, com agilidade documental, incorporando vivências geracionais do seu próprio diretor. É a prova de que boas intenções podem render filmes bons ainda que formalmente mal comportados.

Coladinho com 120 Battements Par Minute chega o sueco The Square. Neste exercício de provocação politica e estética, há um incômodo (mas hilário)  ensaio sobre constrangimento, que é dirigido por Ruben Östlund (Força Maior) com foco no universo das artes plásticas. Sequências antológicas como uma performance na qual um artista imita um gorila em um jantar de luxo ou uma entrevista mesclada a uma cantada bastariam para fazer deste longa-metragem o mais provocativo do festival até agora. Mas há mais do que o desejo de incomodar no esforço de o diretor discutir o limite entre liberdade de expressão e terrorismo cultural.

Na Quinzena dos Realizadores, o cultuado Abel Ferrara (O Rei de Nova York) mostrou estar no auge de sua forma documental ao registrar os bastidores de um concerto em Paris, com as musicas de seus filmes, em Alive in France. Contagiante em seu mergulho na cena musical parisiense, o doc é um autorretrato que mais parece autoficção, pois, ao abrir sua intimidade, Ferrara nos apresenta um recorte quase folclórico de si mesmo.

 

Leia mais sobre Festival de Cannes

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.