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Crítica

Negócio das Arábias | Crítica

Tom Hanks faz o seu melhor Jacques Tati em simpática comédia sobre a arquitetura do isolamento

04.08.2016, às 12H37.

Embora Negócio das Arábias (A Hologram For The King, 2016), adaptação ao cinema do romance Um Holograma para o Rei, de Dave Eggers, publicado no Brasil ano passado, tenha todas as características das comédias dramáticas americanas edificantes, não deixa de ser um filme do alemão Tom Tykwer. A predileção do diretor de Corra, Lola, Corra e Cloud Atlas por enxergar nossos espaços urbanos como um passo para a distopia está presente neste filme também.

Tom Hanks vive o consultor Alan Clay, que está passando por uma crise existencial ligada à recessão nos EUA: foi responsável por levar empregos locais para a China, divorciou-se, tem dificuldade de pagar os estudos da filha. O filme já começa com Alan embarcando para a Arábia Saudita, onde ele tentará vender uma tecnologia de TI para o Rei Abdullah baseada em holografia. O eterno aliado dos EUA no Oriente Médio, assim como os emirados enriquecidos pelo petróleo, está construindo uma cidade do zero no meio do deserto, e a empresa de Alan quer uma fatia do negócio.

O ótimo tempo cômico de Hanks e a presença magnética do estreante Alexander Black (ator americano que faz um motorista saudita bastante convincente) inicialmente dão a sensação de que Negócio das Arábias tem tudo para ser uma agradável comédia de erros, a partir do choque cultural do americano médio com o mundo árabe. Tykwer, porém, aos poucos transforma o filme num boy-meets-girl ao seu modo, lidando com a precariedade das relações num mundo cuja arquitetura, mesmo aquela pensada para os grandes espaços coletivos, parece nos isolar cada vez mais.

Então Negócio das Arábias vai mudando da comédia de erros para uma de absurdo, enquanto Hanks passeia com seus tropeços (ele nunca pareceu tão chapliniano nesse sentido) por espaços de nonsense como palacetes, bacanais, a vida selvagem. O filme não é radical como um Playtime e Hanks não é Jacques Tati, mas o parentesco é evidente, não apenas nas gags das cadeiras. Tykwer abraça a noção das miragens de oásis no deserto de um jeito curioso, jogando sempre com o choque dos bolsões de ostentação no meio do canteiro de obras que é a prosperidade oriental, como se tudo no filme fosse um simulacro de realidade. Não por acaso, o diretor se esmera nos planos aéreos (Boston vista de cima na abertura do filme, Meca vista de cima) para tornar essas cidades grandes globos-de-neve, evocando a obsessão que os paises emergentes têm de construir cartões postais do Ocidente em miniatura, nos seus parques temáticos.

Felizmente, o risco de que Negócio das Arábias se transformasse numa presepada com as declarações de princípios da América diante do mundo não se consuma totalmente. Há um componente forte de resgate da autoestima americana, sim, diante da incompreensão que é estar do outro lado do mundo quando todas as decisões hoje são tomadas do meridiano para lá, no Oriente, essa terra folclórica. Tudo isso fica embalado, porém, numa simpática trama amorosa, e embora o interesse romântico de Hanks tenha todo o perfil de uma MPDG, Tykwer consegue filmar o relacionamento com alguma sensibilidade, cujo clímax não seria outro senão a cena do mar, a suspensão do espaço, o não-lugar, remover-se do mundo para se encontrar novamente.

Nota do Crítico
Bom
Negócio das Arábias
A Hologram For The King
Negócio das Arábias
A Hologram For The King

Ano: 2016

País: EUA

Classificação: 14 anos

Duração: 98 min

Direção: Tom Tykwer

Roteiro: Tom Tykwer

Elenco: Tom Hanks, Ben Whishaw, Sarita Choudhury

Onde assistir:
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