"Esse é o início de uma bela amizade". Assim Emir Kusturica, guitarrista da No Smoking Orchestra, recebe o público em todos os shows de sua banda, numa mistura engraçada de inglês com sotaque iugoslavo. Kusturica já se apresentou por toda a Europa e América Latina, sempre com grande êxito, num percurso que se iniciou em 1986, ano em que ingressou no grupo. Mas o guitarrista não se notabiliza exatamente pela sua função na Orchestra. Antes disso, Emir Kusturica é cineasta, daqueles que não se curvam diante da indústria e, por isso mesmo, colecionam troféus internacionalmente.
Por "Você se Lembra de Dolly Bell&qt&" ("Sjecas li se, Dolly Bell", de 1981), sua estréia no cinema, ganhou o Leão de Ouro em Veneza para os diretores estreantes. Com "Quando Papai Saiu em Viagem de Negócios" ("Otac na sluzbenom putu", de 1985), ganhou a Palma de Ouro em Cannes. "Arizona Dream" (1993) lhe valeu o Urso de Prata em Berlim. Por "Underground - Mentiras da Guerra" ("Underground", de 1995), levou a segunda Palma de Ouro. "Gata Preta, Gato Branco" ("Crna macka, beli macor", 1998) abocanhou o Leão de Ouro.
Claro, enquanto Kusturica mantém a fama de grande cineasta, continua se divertindo com a No Smoking. Fundada em 1980 por um grupo de fanfarrões iugoslavos, a Orchestra cresceu paralelamente ao nome de seu guitarrista ilustre. Porque não aliar as duas carreiras&qt& Em 2000, Kusturica resolveu registrar a turnê do grupo pela Europa com uma câmera Super 8, um formato quase artesanal, de tão obsoleto, em tempos de captação digital. Com o material, lançou em 2001 o documentário "Memórias em Super 8" ("Super 8 Stories"), uma espécie de "Buena Vista Social Club" do Leste Europeu, mas sem a afetação americanófila de Win Wenders ou o oportunismo de Ry Cooder.
Música cigana
Com suas atividades iniciadas logo após a morte do Marechal Tito (1892-1980), o governante carismático responsável pela união do povo iugoslavo, a No Smoking procurou mesclar um discurso irônico e político com a criatividade musical. Assim, quando não era criticada publicamente pela acidez com que tratava os governantes - fato que provocou um hiato forçado entre 1984 e 1986 -, a banda conseguia divulgar sua mistura de Rock e instrumentos clássicos com música étnica cigana e naipe de metais. Cantor expansivo, Nele Karajilic, deixara o humor da televisão para fundar a Orchestra. Em 1984, durante um show ao vivo, uma brincadeira do vocalista com a morte de Tito custou a suspensão pública das atividades do grupo. Ao retornarem, as vendas do primeiro e do segundo disco, "Das ist Walter" (1984) e "Dok cekas sabah sa sejtanom" (1985), estouraram.
Filmado em PB e em cores, o filme-documentário exibe apresentações ao vivo e detalha a trajetória de cada um dos músicos. Zoran Milosevic, o acordeonista, tocava em casamentos. Aleksandar Balaban, o tubista, tocava em enterros. Entre os históricos pessoais, Kusturica relembra imagens de seu pequeno filho, em brincadeiras na neve. Em seguida, Kusturica desafia o baterista, Stribor Kusturica, o mesmo filho das cenas anteriores, para uma briga "amigável". O clima de despretensão permeia todos os depoimentos, todos os registros. Os únicos momentos de tensão acontecem antes da entrada no palco. O diretor/guitarrista não dispensa algumas imagens poéticas, algumas boas tiradas de câmera. Mas, o que fica mesmo, é a empolgação contagiante da música da Orchestra. E sem a choradeira de "Buena Vista".
Ano: 2011
País: EUA
Classificação: 12 anos
Duração: 112 min
Direção: Ernst Hofbauer
Roteiro: Günther Heller
Elenco: Wolf Ackva, Puppa Armbruster, Sandra Atia, Astrid Boner, Rolf Castell, Elke Deuringer, Marianne Dupont, Yvonne Dwyer, Jürgen Feindt, Marisa Feldy, Roswitha Geuther, Joachim Hackethal, Carlamaria Heim, Lis Kertelge, Carina Kreisch, Carl-Heinz Kühn, Eduard Meisel, Jörg Nagel, Jürgen Schilling, Gisela Schwartz, Werner Singh, Christine Szenetra, Claus Tinney
