Filmes

Entrevista

Deserto | “Esste filme é um poema visual feito com pedra, poeira, nuvens”, diz Lima Duarte

De volta às telonas, ator faz radiografia sobre perseverança brasileira em entrevista exclusiva

16.09.2017, às 12H58.
Atualizada em 17.09.2017, ÀS 01H11

Eternizado no imaginário popular brasileiro por tipos como Sinhozinho Malta ou Sassá Mutema, o mineiro Lima Duarte, aos 87 anos, volta às telas neste final de semana no longa-metragem Deserto. Ele vive o severo Dom Aleixo, numa atuação que anda comovendo críticos e espectadores no circuito nacional dos filmes de invenção.

Sua presença em tela é curta, mas o monólogo que faz sobre o lugar da Arte numa sociedade sintetiza toda a reflexão sobre resistência, perseverança e fantasia dessa produção dirigida pelo também ator Guilherme Weber.

Na trama, uma trupe de artistas de circo-teatro percorrem um sertão nunca identificado, atrás de água, comida e teto, até que encontram uma cidade abandonada. Lá, eles vão fundar uma nação.

Na entrevista exclusiva a seguir, Lima aponta ao Omelete semelhanças entre ficção e realidade.

Omelete: Que mundo ou que Brasil a gente encontra em Deserto?

Lima Duarte: Guilherme Weber resolveu estrear como cineasta fazendo uma parábola sobre uma nação que é construída por artistas. Mas, no fundo, Deserto é uma ode ao ser humano. É bonito ver como os personagens apostam num mundo ideal. E é uma aposta que se dá por um sorteio de papéis sociais: uma será a médica, outra será a caçadora e, por aí vai. Mas a discussão central ali é: qual é a posição do artista numa sociedade ideal?

Omelete: Como o senhor avalia o desempenho de Guilherme Weber na estreia dele como diretor?

Lima Duarte: Começar na direção por um filme como esse, uma parábola, é um gesto de muita coragem. Weber é um ator muito bom e um grande colega. Mostrou que é também corajoso, afinal, fez um poema visual com pedra, poeira, nuvens e os olhares de nós, atores, sobre a realidade. Existe uma reflexão bonita em Deserto sobre a necessidade de se construir algo a partir dos escombros, o que tem muito a ver com o Brasil de hoje. A trupe de artistas do filme diz: “Vamos reformar, vamos gritar, vamos erguer um país do zero. E se tivermos que comer carne de urubu para isso, que ela seja cozida de um jeito que pareça apetitosa”. É bonito ver um jovem artista pregar isso.

Omelete: Seu primeiro filme, Quase no Céu, de Oduvaldo Vianna, é de 1949. São 68 anos de cinema, com direito a obras-primas como Sargento Getúlio (1983) e Guerra Conjugal (1974) em seu currículo. Depois de tanto tempo, o senhor ainda encara a produção cinematográfica nacional com entusiasmo?

Lima Duarte: O que temos hoje no Brasil é um cinema em busca de si mesmo: de um lado, há filmes mais populares, feitos pra grandes plateias, como Policia Federal: A Lei É Para Todos; do outro, há pequenas produções como Deserto, buscando espaço, com um olhar mais radical. Mas, em todos eles, cada um à sua maneira, há uma procura por conteúdo, uma procura pela Beleza. E há um aumento claro de qualidade. Eu me vejo, nesse cenário, como um cara que procura acertar, alguém que tenta fazer de seus papéis grandes personagens. O que me resta no meu ofício é buscar a Beleza.

Omelete: Escalado como par de Fernanda Montenegro na próxima novela das 21h da TV Globo, O Outro Lado do Paraíso de Walcyr Carrasco, o senhor tem mais filmes inéditos para lançar este ano?

Lima Duarte: Terminei faz pouco tempo um filme novo do Andrucha Waddington que tem um roteiro tinindo de bom, O Juízo. É uma coisa sobrenatural, rodado em Barra do Piraí, que evoca o terror a partir de nossos dogmas. Agora, sobre a novela, que beleza vai ser poder contracenar com a Fernandona agora. Nós dois com mais de 80, juntos, num projeto de peso do Walcyr... é uma bela experiência.

Omelete: Seu otimismo acerca do futuro político do país é similar ao seu otimismo sobre nosso cinema? Como o senhor vê a realidade política do Brasil hoje?

Lima Duarte: Tudo é matéria para bom cinema. Afinal, o que mais tem por aí são situações inusitadas à espera de um bom cineasta que eternize este nosso momento. Mas existe a esperança. E eu acredito nela.

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