Filmes

Entrevista

"Me tornei o diretor que quer contar pequenas grandes histórias humanas", diz Selton Mello

Conversamos com o ator sobre O Filme da Minha Vida, longa que dirige e atua

24.06.2017, às 13H47.
Atualizada em 27.06.2017, ÀS 14H09

Daqui a duas semanas, Selton Mello vai matar as saudades de seu público de cinema ao voltar às telonas ao lado de Seu Jorge em Soundtrack, misterioso exercício de reflexão existencial ambientado na neve, que estreia dia 6 de julho, no mesmo  momento em que ele faz o parto de sua nova – e mais ousada – cria como realizador. O Filme da Minha Vida é o terceiro longa-metragem dirigido pelo ator, tendo o francês Vincent Cassel no elenco, e estreia no dia 3 de agosto, cercado de forte expectativa pelo mercado exibidor, frente ao prestígio popular de Mello, atuando e dirigindo. E, neste momento, ele começa a correr o país na divulgação de seu “rebento”, capaz de comover todos os que mergulham em sua evasão no tempo e no espaço para um Brasil do interior, regado a Sergio Reis Nina Simone.

Omelete conferiu uma projeção para convidados desta produção da Bananeira Filmes (a mesma de cults premiados como A Festa da Menina Morta e Redemoinho), que terminou em lágrimas de emoção diante da narrativa doce, com ecos de cinema italiano (de Giuseppe Tornatore, de Cinema Paradiso e do Bertolucci de 1900, sobretudo), ambientada no Sul do Brasil. Com base no romance Um Padre de Película, do chileno Antonio Skármeta (autor de O Carteiro e o Poeta), o filme é uma espécie de parábola sobre o amadurecimento com base na acomodação das angústias afetivas do jovem professor de Francês Tony Terranova (Johnny Massaro, em uma memorável atuação), cujo pai abandonou a família. Seu coração, que bate pela jovem Luna (Bruna Lynzmeyer), busca algum conforto nos conselhos do amigo mais velho, Paco (papel do próprio Mello). E tudo a sua volta é observado por um velho guardião do tempo, um maquinista de trem encarnado pelo apresentador e compositor Rolando Boldrim, que animou manhãs de domingo na TV aberta no extinto programa Som Brasil.   

Este é um filme sobre memórias e a figura do Boldrim no filme é um guardião dessas memórias que podem desaparecer. Foi um processo de muitas trocas. Dirigi Skármeta numa cena e ele me deu um achado ao me dizer que o personagem do Johnny é um protagonista que não se sente principal e sim um coadjuvante de si mesmo”, diz o ator, que integra ainda o elenco de O Mecanismo, a série de José Padilha para a Netflix sobre a corrupção política no país.

Na entrevista a seguir, o ator e cineasta mineiro de  44 anos fala sobre suas escolhas estéticas e suas perspectivas de mercado.

Omelete: O Filme da Minha Vida compõe uma espécie de coletivo sobre família com O Palhaço, Feliz Natal e o curta Quando o Tempo Cair, os três filmes que você dirigiu antes. É claro para você o caminho que você vem percorrendo como diretor?

Selton Mello: Eu não penso no tipo de cineasta que estou me tornando, mas eu diria que o diretor que eu me tornei é alguém que quer contar pequenas grandes histórias humanas. Fui filmar no Sul do Brasil, uma região que ainda é pouco retratada nas telas, se comparada com o Sudeste de Rio e SP, e do Nordeste. Mas a paisagem que mais me interessava buscar ali é o rosto do Johnny Massaro, que eu considero hoje um dos maiores atores da geração dele. E tudo o que eu espero é que este filme projete ele para muitos outros longas. O cinema precisa dele.     

Omelete: Vivemos um momento de muita instabilidade para o cinema brasileiro mais autoral radical, que sua a camisa para segurar mais de uma semana em cartaz. Mesmo as comédias mais populares estão penando em circuito. Qual é a apreensão que isso causa?

Selton Mello: Sei que está difícil mas não quero me amedrontar com issoMeu filme anterior, O Palhaço, foi um sucesso. Se eu tivesse que fazer um slogan para O Filme da Minha Vida, seria assim: “Se você gostou de O Palhaço, veja este filme”.

Omelete: O ator que vive o pai em O Filme da Minha Vida é um dos maiores astros da Europa, o francês Vincent Cassel, que embora tenha casa no Brasil e já tenha feito alguns filmes aqui, vai, vira e mexe, para Hollywood, brigar com Jason Bourne ou fazer participações luxuosas em franquias como Onze Homens e Um Segredo. Como é dirigir uma estrela desse porte?

Selton Mello: Cassel é uma figura muito doce, fácil de lidar, que se enquandra numa expressão típica de sets: é um “bicho de cinema”. Tem ator com quem você precisa conversar muito até encontrar a expressão que precisa ir pra tela. E tem ator a quem você não precisa passar instrução alguma: só é preciso cruzar com ele no set. Com o Cassel, eu apenas bati um papo sobre o que era o filme e qual era seu papel. Pronto. Mais nada. Na hora de filmar, botei a câmera, liguei e o personagem estava lá.  

Omelete: Em O Filme da Minha Vida, você contou com a parceria do mais aclamado diretor de fotografia do Brasil, Walter Carvalho, com que já trabalhou outras vezes. Como é a construção da luz, entre vocês, para um longa-metragem como esse?

Selton Mello: A luz deste filme é muito onírica, pautada pela tentativa de criar um sonho. Eu tive a referência do (diretor italiano Bernardo) Bertolucci para criar esse visual e tem um filme dele com um título que caberia bem aqui, Os Sonhadores. Às vezes eu penso que toda essa história poderia ser um sonho do Tony Terranova, o personagem do Massaro.

Omelete: Como ator, um dos mais premiados do país, você trabalhou com diretores míticos como Carlos ReichenbachWalter Lima Jr.Hector BabencoBruno Barreto... O que fica de cada um deles na hora que você dirige?

Selton Mello: Tem um pouco de cada um sim. O Carlão Reichenbach, por exemplo, tinha um tesão sem freios quando filmava, parecendo um menino. Eu filme assim também. Já o Walter Lima Jr. acredita que o cinema não existe para contar a vida e sim para recriá-la, buscando uma vida inventada. O Filme da Minha Vida vai por essa trilha lúdicaMas há outras influências, dos demais cineastas... Foram muitos, todos muito importantes para a minha formação, a começar pelos diretores de dublagem com quem eu trabalhei ainda menino, como Newton DaMatta e o Mario Monjardim.

Omelete: Antes de O Filme da Minha Vida, agora em 6 de julho, vemos você ao lado de Seu Jorge numa estação de pesquisa na neve em Soundtrack, dirigida pelo 300 ML, o mesmo coletivo que fez o icônico curta Tarantino’s Mind (2006) com você. Como foi essa experiência?

Selton Mello: Ficou muito bacana o resultado e é um filme diferente de tudo o que anda por aí no cinema brasileiro até agora.

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