Filmado no decorrer de seis anos, em quatro países (Portugal, Brasil, Colômbia e Estados Unidos), com foco numa história de amor multinacional, Love Film Festival, que estreia no próximo dia 27, marca a estreia de uma das mais aclamadas roteiristas da TV na atualidade, a baiana Manuela Dias, na direção de longas-metragens. Leandra Leal interpreta uma roteirista brasileira que vive uma paixão por ator colombiano (Manolo Cardona, o Eduardo Sandoval de Narcos) em diferentes mostras cinematográficas pelo mundo afora. Nesta entrevista ao Omelete, Dias, que escreveu filmes premiados como A Hora e A Hora e A Vez de Augusto Matraga (2011), fala da experiência de ser cineasta.
Omelete: Como foi o processo - na prática - de filmar em quatro países e o quanto essa vivência em outras praças enriqueceu teu olhar na direção?
Manuela Dias: O filme estabelece um diálogo intenso com a linguagem documental. Ao invés de nos isolarmos do meio, mergulhamos em tudo que nos rodeava para contar essa história. Nesse sentido, cada país nos fez uma “proposta” com sua geografia, temperatura, comidas, bebidas. O encontro amoroso dos personagens inclui um encontro amoroso com a cidade. O espaço é um elemento chave para qualquer narrativa. Assim como o Tempo. Não à toa, descrevemos Love Film Festival como um amor que acontece "ao longo de seis anos em quatro países diferentes". Tempo e espaço são elementos dramatúrgicos por excelência. Tudo se infiltra na narrativa desse encontro amoroso, o que estava fora e o que estava dentro da gente. Sobre o meu olhar, acho seguro afirmar que as viagens são momentos que aguçam, educam e desafiam nosso olhar. Filmagens também operam nesse sentido. Ou seja, viajar e filmar ao mesmo tempo é um privilégio em todos os sentidos! E no caso desse filme criou uma família de 10 amigos. Tanto que queremos continuar a contar a história de Luzia e Adrián. A GloboFilmes mostrou interesse em fazer uma parceria com o Love Film Festival II!
Omelete: Qual é o maior desafio de se investir numa história de amor num cinema tão voltado a questões sociais como o nosso?
Manuela Dias: Existe espaço para muitos universos narrativos e nós precisamos que eles variem. O amor mudou muito nos últimos tempos. Já aprendemos a ter vários amores, mas ainda não sabemos viver as separações, por exemplo. A perspectiva de ser feliz “para sempre” é cada vez mais remota na nossa experiência “líquida” do amor, como bem definiu o Bauman. Investir em contar uma história de amor contemporâneo é um desafio para experimentar novos paradigmas de comportamento no campo simbólico das histórias. Tecer um fio onde uma traição é superada e não o fim de um casamento. Tecer outro fio onde o amor é interrompido e atropelado pela vida diversas vezes mas nunca acaba. O desafio é tecer fios que participem da malha simbólica que nos ajuda a viver.
Omelete: De que maneira a prática da direção interfere no teu olhar de autora? O quanto a experiência de dirigir atores modifica sua forma de escrever diálogos?
Manuela Dias: Eu fui atriz dos sete aos 19 anos, quando escrevi minha primeira peça, na qual atuei como despedida. A experiência de fazer passar o ar por centenas e centenas de palavras como atriz me ensinou muito sobre diálogos, acho que muito mais do que a experiência como diretora. Assim como, ouvir as pessoas. E não estou falando de bisbilhotar a conversa da mesa ao lado em um restaurante, estou falando de ouvir as pessoas que estão falando conosco. É preciso ouvir, não só para escrever diálogos, mas para a vida e para amar. Para concluir queria contar o que eu mais ouvi ontem na pré estréia: 'Manu, eu saí do filme querendo me apaixonar.' ou 'Saí mais apaixonada pelo meu marido.' Love Film Festival é um filme que se passa no meio do cinema mas que aponta para a vida. E isso é muito importante para mim.
