Filmes

Entrevista

O Ornitólogo | "Quero inventar uma mitologia que alargue o universo dos meus filmes", revela diretor

Novo filme do português João Pedro Rodrigues chega ao Brasil esta semana

29.03.2017, às 17H19.
Atualizada em 29.03.2017, ÀS 18H00

Ao conquistar o troféu de melhor diretor no Festival de Locarno, na Suíça, em 2016, e mais sete prêmios internacionais, O Ornitólogo, que estreia no Brasil na quinta-feira (30), fez de seu realizador, o português João Pedro Rodrigues, avançar (muitas) casas na lista dos diretores mais importantes da Europa hoje. Não por acaso o lançamento desta produção sobre um observador de pássaros perdido numa ilha misteriosa vem associada a uma mostra, no Instituto Moreira Salles (IMS), do Rio de Janeiro, com a obra mais expressiva do cineasta. Sob a curadoria de Kleber Mendonça Filho (o diretor de Aquarius), a retrospectiva promove projeções em 35 mm de produções aclamadas de Rodrigues – muitas delas de linhagem LGBT - como O Fantasma (2000), Odete (2005) e Morrer Como um Homem (2009).

Em O Ornitólogo, que conta com participação da atriz sino-brasileira Chan Suan em seu elenco, Fernando (Paul Hamy) é um estudioso de aves que pesquisa cegonhas pretas raras. Em suas pesquisas, ele sofre um acidente e acaba sendo resgatado por duas chinesas de atitudes suspeitas. Amarrado por elas, ele se vê em meio a uma floresta onde estranhos acontecimentos místicos e míticos vão mexer com sua razão e com seu desejo.  Na entrevista a seguir, Rodrigues fala ao Omelete sobre mitos, sobre o cinema português do presente e sobre questões de gênero.

Omelete: Qual é a dimensão mítica e fabular de um filme como O Ornitólogo? O quanto esse toque fabular dialoga com a tua obra pregressa? Qual é o elemento trágico da tua representação para o desejo?

João Pedro Rodrigues: O que me interessa em O Ornitólogo é inventar uma espécie de hagiografia pessoal, uma mitologia que alargue o universo dos meus filmes. É claro que, ao escrever o filme, com o João Rui Guerra da Mata, convocamos (ou evocamos) muitas mitologias: cristãs, católicas, pré-cristãs, pagãs, populares, greco-romanas... Mas este é o material de que todas as histórias são feitas. Como em muita pintura, que na origem era, sobretudo, religiosa, interessa-me a aparente contradição na representação deste mundo mítico em que o sagrado e o profano andam de mãos dadas. Sobretudo a partir do Renascimento, os santos e santas, homens e mulheres, foram muitas vezes erotizados, sendo representados como seres transcendentes, mas carnais e desejáveis. É o martírio como forma de transcendência. Estamos muito próximos de um universo trágico, mas alegremente S&M (sadomasoquista), em que estes homens e mulheres se entregam às mais variadas e sádicas torturas olhando para o céu.

Omelete: Que lugar a tua obra ocupa no atual cinema feito em Portugal?

João Pedro Rodrigues: É difícil responder a esta pergunta, pois a leitura da minha obra no contexto do cinema português deve (ou pode) ser feita pelos outros, não por mim... Em Portugal, continua a poder fazer-se um cinema livre. É a liberdade que herdamos dos cineastas nossos antecessores: Manoel de Oliveira, Paulo Rocha, António Reis, Margarida Cordeiro, João César Monteiro e outros. Não quer dizer que essa liberdade não seja regularmente ameaçada: agora pelos operadores privados de televisão e estruturas de produção que fazem um cinema medíocre que não sai do país.

Omelete: Existiria lugar pruma estética LGBT mais autoral no cinema de vcs?

João Pedro Rodrigues: Parece-me que existem cada vez mais realizadores/as com um pensamento queer, é a evolução normal deste pequeno país católico e provinciano que se abre ao mundo...

Omelete: Como é que a tua estética dialoga com a tradição do cinema luso? Com que autores seus filmes conversam?

João Pedro Rodrigues: Penso que os meus filmes podem “dialogar” com muitos filmes e realizadores não só portugueses, ou sobretudo não portugueses, atuais e do passado, mas também não me cabe traçar estas “afinidades eletivas”.

No dia 8 de abril, no IMS, às 16h30, após a sessão de O OrnitólogoKleber conversa com o realizador e com o roteirista João Rui Guerra da Mata numa troca aberta com a plateia. 

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