Filmes

Entrevista

"Ter um filme da Venezuela em Cannes é um sopro de resistência cultural", diz diretor do aplaudido La Familia

Gustavo Rondón Córdova faz uma radiografia afetiva da pobreza em Caracas

23.05.2017, às 12H12.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H37

Pátria de pouca produção cinematográfica, mais expressiva no terreno da telenovela, a Venezuela trouxe a dura realidade das favelas latinas de volta a Cannes - festival onde nasceram pilares da estética de periferia, como Amores Brutos e Cidade de Deus - com um retrato tocante da relação pai e filho: La Familia. Atração da Semana da Crítica, uma seção competitiva paralela à Palma de Ouro, cujo júri é presidido pelo pernambucano Kleber Mendonça Filho (diretor de Aquarius), esse drama venezuelano arrancou o fôlego da plateia ao fazer uma radiografia afetiva da pobreza em Caracas. A direção é do estreante Gustavo Rondón Córdova que explora a luta de Andrés (Giovanny García) para salvar seu rebento de 12 anos, Pedro (Reggie Reyes), da mira do tráfico.

"Tentei aqui quebrar o paradigma latino do matriarcado e mostrar uma história familar de sobrevivência pela ausência da mãe", disse Córdova ao Omelete, ao fim de uma projeção coroada de aplausos. Na trama, filmada com um realismo sufocante, mas não documental (pois há doses fartas de melodrama na narrativa), Pedro fere mortalmente um menino de sua comunidade que tentava assaltá-lo. Uma vez que o garoto ferido tem parentes no crime, Pedro é jurado de morte. E cabe a seu pai, Andrés, lutar para salvar o menino, fugindo como pode, fazendo bicos, lutando contra a miséria. 
 
"Essa pobreza é fruto da falta de democracia em solo latino. Ter um filme de um país como a Venezuela em Cannes é um sopro de resistência cultural", disse Córdova. Seu La Familia encerra, no menu da Semana, o que o diretor da seção, Charles Tesson, chama de "trilogia da América Latina", que ele compôs no cardápio deste ano com o chileno Los Perros e o brasileiro Gabriel e a Montanha, nosso único longa no festival. Nesta quinta (25), o balneário confere o curta-metragem carioca Vazio do Lado de Fora, de Eduardo BP, concorrente da mostra Cinéfondation, dedicada a estudantes de cinema. Seu curta representa a Universidade Federal Fluminense, de Niterói.
 
Filme japonês se destaca
 
Deu Japão na cabeça e no boca a boca popular na competição pela Palma cannoise desta quarta (24), em reação à poética linha narrativa da diretora Naomi Kawase e seu novo longa-metragem: a love story Radiance. Mais do que uma história de paixão, ao retratar o enlace entre uma jovem cineasta e um fotógrafo que está perdendo a visão, seu filme é um ensaio sobre transendência pela imagem. 
 
"O Japão que mais me interessa filmar é aquele da intimidade das pessoas, do espírito, do que atravessa o real", diz a diretora, premiada aqui em 2007 por A Floresta dos Murmúrios.
 
A leveza de seu roteiro e a delicadeza com que estabelece uma relação entre o sentido da visão e a arte de filmar podem render a ela um prêmio de direção - o mais merecido até agora. Mas há quem aposte em prêmio de roteiro, quesito no qual seu principal concorrente este ano é o cineasta americano Noah Baumbach, pela dramédia familiar The Meyerowitz Stories. Se Naomi levar a Palma - é sabido o respeito do atual presidente do júri, Pedro Almodóvar, por sua obra - ela será a segunda mulher a ganhar o troféu em 70 anos de festival, sendo a neozelandesa Jane Campion a primeira, com O Piano (1993).
 
Cannes chega ao fim neste sábado (27) e os favoritos à Palma de Ouro até agora são 120 Batimentos Por Minuto, de Robin Campillo; Happy End, de Michael Haneke e The Square, de Ruben Ostlünd. O francês Louis Garrel é o destaque entre os atores pela comédia Le Redoutable e a coreana Kim Min-hee é a mais quente candidata ao prêmio de melhor atriz por The Day After.
 
Na quarta (24), Sofia Coppola chega com fôlego para desestabilizar esse jogo com seu O Estranho Que Nós Amamos (The Beguiled), com Colin Farrel na pele de um soldado ianque salvo da morte por internas de um colégio confederado para moças, cuja reitora é Nicole Kidman. A última vez que concorreu aqui, em 2006, com Maria Antonieta, ela saiu da Croisette sob vaias. Mas isso pode mudar.
 

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