Xodó do Festival de Cannes, onde surgiu como mascote autoral em filmes sintonizados com a cena LGBT, o canadense Xavier Dolan conquistou, com apenas 27 anos, um lugar de honra entre os cineastas de maior prestígio (e polêmica) da atualidade, com histórias sobre o poder avassalador do desejo e sobre os esforços de uma instituição secular – a família – para se manter de pé. Mais do que isso, longas-metragens como Amores Imaginários (2010) e Mommy (2014) deram a ele uma legião de fãs entre os jovens, ao mesmo tempo que lhe rendaram a antipatia de uma ala mais conservadora da crítica, gerando um Fla x Flu de olhares e opiniões a cada novo trabalho seu. Sua abordagem para enfermidades familiares deu a ele o Grande Prêmio de Júri da seleção de Cannes de 2016 com É Apenas o Fim do Mundo (Juste La Fin Du Monde), que chega nesta terça (11) ao Brasil, numa sessão de gala no Festival do Rio, no Cine Odeon, 21h15.
Campeã de bilheteria na França, onde estreou no fim de setembro, atraindo 650 mil pagantes às salas de exibição em apenas duas semanas, a produção é uma releitura audiovisual de um texto teatral autobiográfico de Jean-Luc Lagarce (1957-1995) – o dramaturgo contemporâneo mais encenado do teatro francês – montada no Brasil em 2006, com Simone Spoladore e Lourinelson Vladimir. E é um dos longas mais procurados pelo público do festival carioca.
“Eu filmo muito e monto rápido, não apenas pelo prazer de fazer, mas pela urgência de compartilhar com o mundo histórias que me mobilizam por falar da paixão, força mais importante deste mundo”, disse Dolan em entrevista ao Omelete em Cannes. “Esta é uma história sobre imperfeições nas relações e nos reencontros, construída numa atmosfera sufocante”.
O fato de ter Léa Seydoux (a bondgirl de Spectre), Marion Cotillard (de Macbeth) e Vincent Cassel (Cisne Negro) em papéis de destaque transformou É Apenas o Fim do Mundo em um fenômeno popular na Europa. Este drama, sobre lavação de roupa suja entre parentes, é embalado, em sua trilha sonora, pela versão original, romena, do hit Festa no Apê, que se chama Dragostea Din Tei, ressaltando o lado pop de Dolan. Na trama, baseada em experiências pessoais de Lagarce ligadas à Aids, o ator e diretor teatral Louis (Gaspard Ulliel) volta para casa de seus pais, após um sumiço de 12 anos, para contar sobre sua morte iminente. Mas lá, vai cair em um bate-boca com seu irmão brutamontes (Cassel) e emendar uma conversa cheia de mágoas com a irmã mais moça (Seydoux).
“Lagarce foi um artista muito particular no teatro, pois encontrou uma língua própria para traduzir a violência familiar. Tudo em suas palavras aponta para um sofrimento crescente”, disse Dolan. “No teatro, o texto dele é muito frio, calcado no silêncio, mas eu optei por trazer barulho, por investir num excesso de palavras capaz de mostrar o quanto as pessoas são incapazes de escutar uma às outras. É um filme de histeria”.
Em Cannes, em maio, a plateia não dava um pio diante das cenas do embate entre os personagens. “O que eu busco aqui é uma tentativa de entendimento das amizades que podem nascer entre irmãos, entre pais e filhos, dependendo da tolerância e da disposição para amar”, diz o cineasta, que filma agora, em inglês, o longa The Death and Life of John F. Donovan, com Natalie Portman.
Com encerramento marcado para o dia 16, o Festival do Rio exibe É Apenas o Fim do Mundo ainda nesta sexta, às 13h e às 19h, no Reserva Cultural Niterói, no sábado, às 17h40m, no Roxy, e no domingo, às 14h30m, no Kinoplex São Luiz. Na ala estrangeira de atrações do evento, os longas estrangeiros de melhor boca a boca são o terror iraniano Sob as Sombras, de Babak Anvari, e o drama americano Capitão Fantástico, com Viggo Mortensen, além do documentário De Palma, de Jake Paltrow e Noah Baumbach, sobre o diretor de Carrie, a Estranha (1975).
