Eis uma coisa interessante: Final Fantasy VII está fazendo 20 anos, e a essa altura do campeonato, é quase cretinice tentar falar qualquer coisa sobre como esse jogo foi importante para o gênero, para a indústria, para a (então) Squaresoft ou outra organização imaginária. Porque foi, mas essencialmente todo mundo já falou o que tinha pra falar.

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Para mim, o RPG estrelado por Cloud foi um grande companheiro. Meu pai ficou muito doente logo depois do jogo sair, e o clima em casa não era dos melhores. Meu melhor amigo tinha se mudado para longe. Então eu passava minhas tardes pós-escola em casa, jogando e ouvindo rock no rádio.

Mas gosto mais de lembrar dessa turma da pesada como pano de fundo para algumas das maiores loucuras que cometi durante minha pré-adolescência. A saber: virar a noite jogando videogame, tomar leite com coca-cola, e comer bolacha de chocolate com aquele molho 3 em 1 nojento que mistura kecthup, mostarda e maionese.

Meus primos sempre foram meus companheiros de jogatina, e era costumeiro eu ir até a casa deles passar o fim de semana. Eu tive PlayStation antes, então ficava a meu encargo levar o console com qualquer jogo maneiro da vez, pra curtir entre uma e outra partida de Magic. Foi assim que a gente terminou Resident Evil 2 de cabo a rabo e, um pouco antes, fez todos os finais de Chrono Trigger no Super Nintendo.

Eu já tinha terminado FF VII uma vez, mas não tinha completado todos os desafios do jogo - pegar todos os Limit Breaks nível 4 e matado os dois chefes opcionais, a Ruby Weapon e a Emerald Weapon. O grande problema é que, como a internet em 1997 não era a de 2017, nós mal tínhamos como saber, por exemplo, que dava para matar a Emerald sem o limite de tempo. Ou pra que serviam os itens que as Weapons dropavam.

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Mas o que faltava de internet sobrava de revistas com os mais variados truques, detonados, manhas, macetes e estratégias. E a gente logo descobriu que uma Materia especial tirava o limite de tempo da Emerald Weapon, e um combo vencedor pra vencer a Ruby - juntar Final Attack com a Summon "Phoenix", o que fazia com que você atacasse e, ao mesmo tempo, revivesse quem estivesse morto (inclusive você mesmo).

As estratégias pareciam ser vencedoras, mas as duas batalhas ainda são longas. Especialmente para três adolescentes (de 13, 14 e 15 anos) não particularmente inteligentes. E nós sempre jogávamos à noite, porque durante a tarde o meu tio nos levava para alguma loja jogar Magic, ou coisa parecida. Então a sessão começava de fato só depois do jantar, e continuava até as energias acabarem.

Mas naquele dia as energias PRECISAVAM durar mais, porque a gente PRECISAVA matar esses dois chefes. O problema é que a preparação das lutas demorou mais que o esperado, e o relógio foi andando (o plano era matar primeiro a Emerald, que supostamente era mais fácil, e depois a Ruby). Eu não lembro em que parte do jogo nós estávamos quando começaram as batalhas de verdade, mas já dava pra saber que a situação não era das melhores quando bateu duas da manhã e nenhum dos gigantes tinha morrido.

Como situações desesperadas requerem medidas desesperadas, fomos à cozinha ver o que tínhamos de "combustível gamer", e aquele pareceu o melhor momento para realizar o I Encontro de Ideias Culinárias Imbecis, e levar o desejo de misturar refrigerantes que todo mundo tem a outro nível.

Talvez eu não precise dizer, mas caso mais alguém tenha dúvida: leite com coca-cola e bolacha de chocolate com molho nojento três em um não é gostoso, por mais subjetivas as noções de "gostoso" sejam. Mas em 1997, quando Final Fantasy VII tinha acabado de sair e eu vendi meu Super Nintendo para comprar uma cópia original, não havia Youtube para saciarmos esse tipo de curiosidade doentia.

E afinal de contas, nós éramos três pré-adolescentes jogando videogame na década de 90. A boa notícia é que sim, nós conseguimos matar ambas as Weapons naquela noite fatídica. Já era quase 4 da manhã quando desligamos o videogame, e eu tenho a impressão de que nunca terminamos aquele save.

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Esse texto faz parte do especial sobre 20 anos de Final Fantasy VII do Omelete. Leia mais sobre Final Fantasy VII.

Fernando Mucioli hoje é tradutor de mangás e animes para JBC e Crunchyroll. Siga-o aqui.