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Melancolia | Crítica

Nada é sagrado para Lars Von Trier, com a exceção do sofrimento

04.08.2011, às 16H00.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H42

Por algum alinhamento dos astros, a competição do Festival de Cannes deste ano teve dois filmes que colocam dramas humanos sob a perspectiva do cosmos, A Árvore da Vida e Melancolia (Melancholia). Filmes que têm a mesma disposição de combinar a sinfonia dos planetas - a dramaticidade da música clássica com efeitos visuais que logo remetem a 2001 - com as dores das coisas mundanas.

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São dois filmes, porém, com fins opostos. A Árvore da Vida nos coloca nessa perspectiva grandiloquente para sacralizar a existência. Já para Lars Von Trier, como é de esperar, nada é sagrado - com exceção do sofrimento.

O filme-catástrofe narra o fim do mundo em duas partes, ao som de Richard Wagner. Na primeira, acompanhamos o casamento de Justine (Kirsten Dunst), organizado com zelo por sua irmã, Claire (Charlotte Gainsbourg). Na segunda, ambientada nas semanas que sucedem a festa, já é possível notar no céu a aproximação do planeta Melancolia, que passou séculos "escondido" atrás do Sol e agora se aproxima ameaçadoramente da Terra.

Dunst levou o prêmio de melhor atriz em Cannes pela sua atuação, mas é a segunda parte de Melancolia, dedicada à personagem de Charlotte, que traz uma sensibilidade renovada à já previsível misantropia de Von Trier.

Na primeira parte, temos um cenário que lembraria Festa de Família, com sua lavagem coletiva de roupa suja, mas a encenação do dinamarquês está mais próxima do humor negro e da criação fake de situações de O Grande Chefe. O cinismo fica pontuado nos diálogos - já sabemos da catástrofe iminente, e o texto não nos deixa perder a escala ("o wedding planner mais caro do mundo", "o homem mais sortudo do mundo") - mas o tom farsesco dos encontros de Justine com seus convidados (especialmente a subtrama do slogan publicitário) tira dessas situações sua gravidade.

Von Trier parece organizar as cenas da primeira parte não por seu peso dramático, mas por seu potencial de constrangimento. Quando todos se despedem e temos, na segunda parte, a atenção voltada apenas para as irmãs e para o astrônomo John (Kiefer Sutherland) - casado com Claire e cunhado da noiva - o filme fica mais focado e se torna, enfim, melancólico de fato.

As ironias ainda estão lá ("temos que confiar nos cientistas"), mas agora têm uma função dramática. A segunda parte se organiza de forma pendular com Claire ora antevendo a destruição (quando se aproxima da depressiva Justine) ora acreditando na salvação (quando cai para o lado do marido "que estuda coisas"). A câmera na mão de Von Trier, que antes procurava por close-ups cômicos, agora se atenta aos detalhes do paternalismo do marido, a forma como John toca e lida com Claire para confortá-la.

Há mais honestidade, crê Von Trier, na forma como Justine esculacha sua irmã com frases de efeito ("o mundo é mau, ninguém vai sentir a falta dele") do que na complacência "científica" de John. Não se esperaria outra coisa de um pessimista espetaculoso como o roteirista e diretor, é claro, mas Charlotte Gainsbourg se entrega a esse jogo de um jeito insuspeito, e seguimos com ela.

É notório o processo de depressão que o dinamaquês atravessou enquanto filmava Anticristo, e Melancolia foi desenvolvido, em boa parte, para que ele lidasse com essa depressão - pela qual Kirsten Dunst também passara. Fazem os dois, aqui, uma sessão fúnebre de terapia, que abraça a derrota porque a entende, mas Melancolia não é só fatalismo. Embora tenha começado como circo em família, aos poucos torna-se um justo retrato de uma irmandade - irmãs que Von Trier respeita porque são unidas pela dor.

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Nota do Crítico
Bom
Melancolia
Melancholia
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Ano: 2011

País: Dinamarca, Suécia

Classificação: 14 anos

Duração: 130 min

Direção: Lars von Trier

Elenco: Kirsten Dunst, Charlotte Gainsbourg, Kiefer Sutherland, Charlotte Rampling, John Hurt, Alexander Skarsgård, Stellan Skarsgård, Brady Corbet, Udo Kier, Jesper Christensen, Cameron Spurr, Deborah Fronko

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