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Leonard Cohen | Como Hallelujah foi de fracasso comercial a hino pop

Canção foi regravada cerca de 300 vezes e tocou em diversos programas de TV e filmes

11.11.2016, às 14H18.
Atualizada em 11.11.2016, ÀS 16H03

A morte de Leonard Cohen é mais um duro golpe para a música em 2016, que, após se despedir de ícones como David Bowie e Prince, perde o artista conhecido como A Voz de Deus. Dono de uma grave voz, o cantor escreveu ao longo de sua carreira de 49 anos e 14 discos grandes clássicos como "Suzanne", "So Long", "Marianne", "Sisters of Mercy", e "Hallelujah", canção mais famosa de Cohen. A canção, lançada em 1984, foi regravada cerca de 300 vezes e usada em diversos momentos de séries e filmes ao longo das décadas. Porém, como a emocionante canção de Cohen se tornou tão famosa?

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A história de Hallelujah começou com um agonizante processo de criação que durou quase cinco anos. Cohen, um compositor meticuloso, passou anos escrevendo a canção, que teve cerca de 80 versões. Planejada para ser o grande destaque do disco Various Positions, de 1984, a música não teve a recepção esperada pelo cantor. "Cohen passou muito tempo tentando solucionar a canção, e quando a mostrou ao presidente da gravadora, a primeira reação do executivo foi extremamente negativa. Walter falou que a música era uma abominação, bem longe do pop que a gravadora buscava, e resolveu não lançar a faixa", revelou o escritor Alan Light, que publicou em 2012 The Holy or the Broken, livro sobre Leonard Cohen.

Indignado, Cohen modificou a música, tornou-a mais longa, sombria e alterou os primeiros versos. Various Positions acabou sendo lançado nos Estados Unidos por uma gravadora independente, e falhou em causar alguma impacto no rádio ou nos rankings, quando Cohen, já com 50 anos, disputava espaço com titãs da música pop como Michael Jackson e Madonna. A história de Hallelujah só começou a mudar no início da década de 90. O primeiro artista a gravar uma versão da canção foi o ex-Velvet Undergound John Cale.

"Me lembro de ouvir a música em uma participação de Cohen num show de Bob Dylan em Nova York, e pensei 'nossa, esse é um refrão bom', revelou Cage em 2013. O cover apareceu no CD tributo I’m Your Fan, de 1991, organizado pela revista musical francesa Les Inrockuptibles, que reunia artistas como Pixies, Nick Cave e REM interpretando clássicos de Cohen. "Fiz algumas alterações na letra, suprimi alguns versos que não me sentia confortável para cantar, e cheguei à minha versão", continuou Cale. "John Cale conseguiu a proeza de ser o cara que realmente conseguiu desvendar os mistérios da música", disse Alan Light.

Um ano depois, a versão de Cale chegou aos ouvidos de Jeff Buckley, jovem cantor e compositor da California que ouviu Hallelujah pela primeira vez no apartamento de um amigo, enquanto cuidava de seu gato. Buckley classificou o cover de Cage como "um orgasmo de aleluia, uma ode à vida e ao amor", e começou a tocá-la em bares do East Village em Nova York. A emocionante rendição do jovem cantor chamou a atenção de um executivo da gravadora Columbia, que a ouviu em uma das apresentações de Buckley, o ofereceu um contrato e garantiu que o músico gravasse sua própria versão de Hallelujah para Grace, disco de estreia lançado em 1994.

O disco e a música só conseguiram alcançar o sucesso esperado após a trágica morte de Buckley em 1997, que se afogou em um rio no Tennessee. "Jeff nos deu a versão que esperávamos que Leonard Cohen fizesse, como se fosse uma música de amor. Ao interpretá-la dessa forma, Jeff se apossou de Hallelujah e a transformou em uma música original", comentou o músico Glen Hasard, vencedor de um Oscar pela trilha sonora do filme Once e amigo pessoal de Buckley. Se Hallelujah alcançou prestígio dentro do cenário musical após o falecimento de Jeff Buckley, sua popularidade explodiu em 2001 após aparecer em Shrek de uma maneira bastante inusitada, embalando um breve momento de tensão entre o ogro e Fiona.

"Estávamos testando qual seria a melhor música triste para ilustrar aquela cena, e Hallelujah meio que caiu em nosso colo", comentou o diretor musical do filme Andrew Adamson. "Testamos as versões de Cohen e Buckley, mas escolhemos a de Cale. Mostramos o resultado para o comitê e, para nossa surpresa, todos adoraram. Eu esperava que o estúdio fosse optar por algo mais popular, mas no fim das contas tudo casou tão bem que eles aceitaram", completou. Por questões contratuais, a trilha sonora de Shrek não incluiu a versão de John Cale, mas uma interpretação de piano e voz feita pelo cantor canadense Rufus Wainwright. A união das duas versões aliada à popularidade do filme fez com que Hallelujah ficasse conhecida por um público amplo, indo de crianças de seis anos aos pais que conheçam a música como sendo "aquela do Shrek".

"Ao longo dos anos, Hallelujah foi sofrendo uma verdadeira metaformose, indo de um b-side cafona de um disco rejeitado de Cohen para se transformar em um cântico místico, tocado em todo e qualquer tipo de cerimônia, indo de casamentos à funerais. E talvez isso seja a melhor característica da música; ela se adapta aos sentimentos das pessoas", finalizou Alan Light.

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