Depois de lançar o premiado Channel Orange e de elevar sua fama a um nível que até o motivou a deletar sua conta no Twitter, a evitar a imprensa e a tomar outras atitudes, Frank Ocean volta de sua reclusão e lança um dos melhores discos do ano.
Não só um dos melhores como um dos mais esperados. Deu para sentir a ansiedade do público com os diversos “teasers” que anteciparam o álbum (o vídeo de "Nikes", o álbum visual Endless) até a chegada do disco novo em si - em CD físico para alguns sortudos que ganharam o seu disco com a revista Boys Don’t Cry e exclusivamente em digital pela Apple Music e iTunes Store.
Sua decisão de romper com o selo Def Jam mostra que Ocean está menos preocupado com contratos e com o que os executivos estão pensando e mais focado no que ele quer. E não é só nas questões burocráticas que isso fica evidente.
Blonde está correspondendo às altas expectativas porque é exatamente o que Ocean queria fazer. O disco é um mar intenso de sentimentos, lirismo e beleza, onde ele faz sua mistura única de rap com falsetes de R&B em arranjos densos e abstratos. Ele está mais introspectivo e o disco é emocionalmente muito rico.
Para participar do álbum, Ocean convidou ninguém mais ninguém menos que Beyoncé, Kendrick Lamar, Rosie Watson, Jonny Greenwood, guitarrista do Radiohead (só para citar alguns) e mais um elenco de primeira para lapidar as músicas.
Em relação a Channel Orange, o novo trabalho é um grande contraste. O single "Nikes" deixa clara a preocupação e reflexão de Ocean sobre o futuro de um mundo onde adolescentes perdem suas vidas e homenageia o jovem Trayvon - morto na Flórida há 4 anos.
Apesar do forte tom político do single, o disco não é um manifesto - até porque o resto das músicas aborda outros temas - mas sim um artista que passou um bom tempo refletindo em casa sobre vários aspectos da vida, acompanhado de um violão, um piano, um computador. E que agora quer contar pra gente o que andou pensando.
São histórias do cotidiano, de amor, de decepções, de perdas, contadas com uma alma que agora, mais do que nunca, não tem medo de se expor. E chora, ri, sangra, e consola.
"Nights" é um dos melhores exemplos de como Blonde vem carregado de informações que não se revelam numa audição desatenta. Aqui o negócio é lapidar, como se você estivesse numa sessão de terapia com Ocean, dissecando cada confissão, cada desabafo, cada suspiro que conduz o artista numa íntima e profunda análise de si próprio.
"Pink + White" - colaboração com Beyoncé - tem um dos melhores refrões do disco e "Self Control" é quase incômoda, com sua agonia intrínseca, enquanto "Futura Free" abusa das distorções na voz. Em "Seigfried" ele flerta com a bissexualidade num dos muitos momentos em que deixa a guarda baixa para se expor. Blonde é pessoal ao extremo.
A falta de bateria e os arranjos super etéreos podem assustar logo de cara, mas é uma obra coesa e com uma proposta clara, que desafia o ouvinte, faz pensar, provoca reflexões e entrega uma experiência musical complexa e prazerosa ao mesmo tempo.
É a afirmação de um artista que tem muito a dizer e que está descobrindo suas imprevisíveis e inovadoras formas de fazer isso.