Música

Crítica

Jack White - Blunderbuss | Crítica

Sem grandes surpresas, mas tão excelente quanto se esperava

23.04.2012, às 16H08.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H40

Após moldar e influenciar o rock da década passada, com os dez ótimos discos lançados pelo trio de bandas que liderou (ou co-liderou), Jack White finalmente optou por lançar seu primeiro trabalho solo, Blunderbuss.

O ponto de partida para analisar uma obra deste tipo costuma ser a comparação entre ela e o restante da discografia do artista em questão. Assim, logo na primeira audição, Blunderbuss deixa claro que não pode ser descrito como um simples ponto médio entre os três antigos grupos de White, mas também não foge daquilo que já foi ouvido neles. Sonoramente, está mais próximo do The Raconteurs, tanto pela instrumentação (guitarra, baixo, bateria, piano), quanto pelo rock setentista influenciado pelo country. Também há escassas amostras do punk/blues imediato do The White Stripes, e pouquíssimo do som mais dançante e abrasivo do The Dead Weather.

Ainda referindo-se a comparações, é importante notar que, nos últimos trabalhos de cada um dos três projetos, houve evoluções aos saltos. Respectivamente, Consolers of The Lonely (2008) partiu do rock quase-pop para o quase-progressivo; Icky Thump (2007) abrangeu tantos gêneros que chegou perto de perder seu rumo; e Sea of Cowards (2010) mais parecia uma furiosa, ininterrupta jam session de meia-hora. Tendo isso em mente, é curiosa a forma como Jack White não está preocupado em ampliar seus limites em Blunderbuss, mas sim em se aperfeiçoar dentro do rock que já fazia bem. Livre das restrições e opiniões alheias que fazem parte da dinâmica de qualquer banda, White adotou vários estilos, mas não experimentou nem flertou com nenhum novo; apenas cuidou para que não soasse como uma cópia de si mesmo.

Como principal medida para evitar o déjà vu, a utilização de guitarras foi restringida, mas de maneira a não descaracterizar o álbum como um trabalho de rock. A maior parte parte das canções é conduzida pelo piano (ou teclado), acompanhado de um violão, com White resgatando texturas que começou a explorar no único de seus dez álbuns que não foi dominado pela guitarra - Get Behind Me Satan (The White Stripes, 2005). Dentre as faixas que exemplificam isso, destacam-se as sombrias "Hypocrytical Kiss" e "Weep Themselves to Sleep", ambas escalando e liberando sua tensão por diversas vezes, graças a um bom uso do piano, em perfeita sintonia com o ritmo e os vocais de White. Claro, a guitarra faz várias aparições, mas muitos ouvintes ficarão primeiro chocados ao descobrir que "Sixteen Saltines" é a única música introduzida por um riff em todo o disco, e, depois, aliviados ao perceber quantos solos este contém.

A implementação dos instrumentos de teclas em detrimento dos de cordas não funciona tão bem durante todo o álbum. Após a ótima cover "I'm Shakin'" (de Little Willie Johnson), há uma sequência de quatro faixas com humores tão uniformemente alegres, que um ar desnecessário de ingenuidade é gerado. Logo, chega como um alívio o riff da faixa final "Take Me With You When You Go", que resgata os últimos minutos de Blunderbuss, reinserindo a variedade que é tão presente em sua primeira metade.

Como de costume, as melhores letras de White são aquelas que falam, sem reservas, de sua relação com o sexo feminino - aqui, praticamente todas se encaixam nessa categoria. Porém, o mesmo homem que já compôs versos de auto-confiança e conquista como "All the white girls trip when I sing at Sunday service" e "Let's have a ball and a biscuit, and take our sweet little time about it", encontra-se, agora, tratando de relacionamentos com uma mistura de desprazer e rancor. Na abertura, "Missing Pieces", culpa alguém por necessitar tanto dele, que acabou levando alguns de seus "pedaços" quando partiu; próximo ao fim, em "I Guess I Should Go To Sleep", lamenta a impossibilidade de se discutir com uma mulher aos prantos; enquanto que, em "Love Interruption", resume, perfeitamente: "I won't let love disrupt, corrupt or interrupt me, anymore". O disco está repleto de exemplos similares, onde White expressa um ressentimento que pareceria irreparável, não fosse pela sua forma ácida e quase humorística de lidar com o problema. Para aqueles que decidirem se aprofundar numa análise das letras, uma obra melhor aguarda.

Tal qual todo bom álbum deve tentar ser, Blunderbuss se aproxima de ser absolutamente coeso. Certamente, há momentos mais excitantes ou memoráveis que outros, mas todos fazem sentido e têm sua função dentro da obra. No geral, é tão consistente em qualidade quanto qualquer outro dos dez trabalhos anteriores do músico, mas deverá gerar reações tão variadas quanto aquelas que surgiram quando ele alternou entre grupos, bem como um número ainda maior de comparações. Por conta própria, sem limites para sua criatividade, Jack White fez um rock que mantém-se dentro de seus padrões - os quais, felizmente, são extraordinários.

Nota do Crítico
Bom

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