Música

Entrevista

Música política e de sonoridade única, assim é o disco Craca, Dani Nega e o Dispositivo Tralha

Felipe Julián, criador do projeto, conversou sobre letras engajadas e misturas sonoras

01.02.2017, às 18H08.
Atualizada em 02.02.2017, ÀS 12H50

Craca, Dani Nega e o Dispositivo Tralha, é o primeiro trabalho do projeto Craca Beat, encabeçado pelo produtor musical Felipe Julián, e que tem na mistura com os vocais e letras entoados pela MC Dani Nega grande parte do seu destaque e ineditismo. Julián, que atende pelo nome artístico de Craca Beat, afirma que o nome Craca, surgiu enquanto andava em uma praia e ao observar as pedras e as cracas, teve um insight.  “A craca é um crustáceo muito símbolo da cultura brasileira. Eu achei, né? É um desses crustáceos que se alimentam da sujeira e purifica a água, e por vários motivos me soou poeticamente como nome artístico. E tem a coisa de o Craca ser um som multicultural, também. A craca se fixa nos cascos do navio e acaba circulando o mundo inteiro de gaiato”, enfatiza.

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Logo, com esse fator, a mistura entre muitas sonoridades, sendo tão importante para a existência do projeto, o músico e produtor comenta que o processo de produção de seu primeiro disco foi lento. Não houve uma conceituação sonora, tudo aconteceu ao longo de dois anos e cresceu de uma performance, um live set de DJ "com o objetivo de ser dançante” até se tornar o material que ele tem hoje. O produtor confessa também que, por muitas vezes, iniciou a produção no estúdio, mas o interesse no som ao vivo era dominante. “Durante esse período [de experimentações ao vivo] eu encontrei a Dani Nega e começamos a fazer coisas juntos. E no caldo de coisas que eu estava juntando, com sons latinos, entrou toda a informação dela”.

Assim, até o disco realmente acontecer, depois da junção com Dani Nega, se passou mais um ano no qual Craca realizou algumas apresentações ao vivo com ela cantando para depois partir para a gravação. “Fizemos um laboratório de palco”. Craca, comenta também que no início, tinha interesse em ter participações de outros vocalistas. “[...]Minha ideia no início é que rolassem participações especiais, numa pegada Massive Attack. No entanto, a participação de Dani se tornou mais efetiva e a ideia foi deixada para trás". O encontro entre Julián e Dani aconteceu por conta de um projeto de performance e música no qual o produtor fazia o apoio musical. “O projeto contava com diversas participações especiais e um dia a Dani foi a convidada, as coisas foram se encaixando e ficou muito legal. A gente começou a se encontrar posteriormente, a convidei ela pra participações ao vivo e o resultado evoluiu até chegar onde chegou”.

Além dessa mistura sonora proposta por Craca em seu disco, outros detalhes que chamam a atenção são os dispositivos construídos pelo produtor que confessa ter interesse em produzir sonoridades novas, que não existam, com instrumentos “aparentemente novos, porque isso induz o ouvinte a perceber que tem uma identidade sonora lá, mas ele não sabe exatamente o que que é”, destaca.

Assim, sobre os instrumentos que desenvolve, Craca conta que não chega a construir novas peças, mas que adapta criações já existentes. “Tem uma pesquisa minha que já vinha de muitos anos sobre uma forma de transformar a produção da música eletrônica em algo híbrido e focar no lado orgânico. E com isso eu pensei como eu posso fazer para ter uma interação com o computador de uma forma não muito besta, como eu posso ter uma interação mais corpo a corpo com o computador. Utilizei muitos tipos de controladores, mas acabei desenvolvendo minhas traquitanas para lidar com a máquina”. Entre um dos projetos que Craca desenvolveu, está um controlador com o qual ele consegue realizar várias funções simultâneas utilizando todos os dedos das mãos, o dispositivo Tralha.

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Craca e a arte
Julián, antes de entrar no processo de gravação de seu álbum, se dedicou a projetos artísticos e posteriormente partiu para a produção do álbum. Essa mudança de ares, para ele, um retorno a um ambiente com o qual tem intimidade - o estúdio - não alterou sua forma criativa. “Esse formato pra mim, não tem muito segredo”. Ele conta que deixou a rotina de produção em estúdios, pois estava saturado do meio. “Eu estava saturado desse meio, comecei a buscar outras possibilidades, artes visuais e performances... E passei a ter uma outra vertente de instalações interativas que às vezes se juntam ao show. E isso veio muito de uma necessidade de expandir o diálogo. [Fazer] Música é maravilhoso, é muito bom, mas o meio musical é um pouco limitado. Ideologicamente ele está sempre atrás de dar certo e fazer um certo sucesso. Fica muito refém do mercado e é um mercado que não é fabuloso, é um mercado pequeno. Então, não só fica escasso de projetos e financiamentos, como, também, fica escasso de ideias, de reflexão e aprofundamento”.

Por causa dessa limitação, Craca diz que percebeu as artes visuais como uma forma de  dialogar politicamente com outras coisas, “interagir com o espaço de outras formas, discutir política de forma diferente da letra de uma canção”.

Craca ainda aproveita para sugerir algumas músicas de seu trabalho para quem não teve contato com o projeto. O produtor destaca que as sugestões com letras seriam "Sou Preto Mesmo" e "Papo Reto". “'Sou Preto' já existia e a Dani adicionou uma letra nela, é uma canção que faz um trocadilho de palavras e que nos faz refletir sobre apropriação cultural. É uma letra muito boa, porque tem a ironia da Dani. 'Pato Reto' também é uma música que já existia e a Dani encaixou a letra muito bem. Ela ganha força pela forma como o texto é falado na faixa”. E segue, “neste momento particular que a gente tá vivendo, extremamente machista e racista no Brasil, falar diretamente às vezes se faz necessário

Por fim, ele também sugere uma faixa instrumental, a música “Thoracica". “Essa é uma cumbia, meio abrasileirada. Uma faixa que eu gosto muito e que trabalha muito com a ideia da guitarrada, do pandeiro e é um exemplo claro do que que é o som do Craca quando é instrumental”.

O disco já está disponível nas diversas plataformas de streaming e pode ser ouvido na íntegra abaixo.

Atualmente, o músico trabalha na divulgação do disco com shows em diversas partes do Brasil. Veja as próximas datas:

11/2 - Venga Venga - rooftop do Shopping Light VENGA, VENGA - São Paulo -SP.
23/2 - RedBull Station - Red Bull Station - São Paulo -SP.

CRACA e DANI NEGA - Agenda de shows ( FEVEREIRO)
* 02/2 - Campus Party Br 2017 ( #CPBr10 )
* 11/2 - Venga Venga - rooftop do Shopping Light VENGA, VENGA
* 23/2 - RedBull Station Red Bull Station
 

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