HQ/Livros

Artigo

Wild Cards 30 anos | As origens e legado da outra série criada por George R.R Martin

Universo compartilhado por superheróis já conta com 23 livros e vai ser adaptada para televisão

25.01.2017, às 11H27.
Atualizada em 02.02.2017, ÀS 14H27

Uma década antes de mergulhar no mundo medieval e criar crônicas de gelo e fogo, George R.R. Martin se aventurava pelo universo dos RPGs. Noite após noite, o autor se reunia com amigos e imaginava enredos para os mais diversos personagens e cenários quando percebeu que as histórias poderiam ir além de um simples jogo: era a gênese de Wild Cards. Ao lado de escritores talentosos, George começou a criar um universo onde heróis e vilões habitam a Manhattan real e sofrem com as consequências de um vírus alienígena que altera de maneira imprevisível suas estruturas genéticas. 30 anos depois do primeiro livro, a série já conta com 23 livros – o último lançado em agosto do ano passado – aqui no Brasil, sete livros já foram lançados. Confira agora uma breve retrospectiva da construção do intrincado universo compartilhado de Wild Cards e sua influência ao longo das décadas.

O começo de tudo

Tudo começou em 20 de setembro de 1983, no aniversário de 35 anos de George R.R Martin. O autor ganhou de presente um RPG chamado SuperWorld, que tinha como premissa um mundo de superheróis que utilizava um sistema de jogo parecido com Call of Cthultu, grande sucesso da época. SuperWorld logo caiu nas graças de George e seus amigos, com o autor assumindo o papel de ‘mestre’.

"O jogo se tornou um grande vício, e o maior viciado era eu. Por dois anos estive à frente da criação, poderia ter escrito pelo menos um livro nesse meio tempo, mas fiquei brincando de criar vilões. Era um jogo muito bom para se jogar em grupo, mas focamos bastante na criação do universo. Um dia percebi que poderia ganhar dinheiro em cima disso, e a resposta era ‘mundos compartilhados", disse George.

O grande boom das antologias de mundos compartilhados começou no fim da década de 70 com a publicação de Thieves’ World, primeiro volume de uma longa série de fantasia sobre a cidade imaginária de Santuário e seus cavaleiros, feiticeiros, príncipes , patifes e ladrões. O grande mérito da obra de Robert Asprin foi a definição de um mundo compartilhado moderno e com ramificações para outros meios. Empolgado com o sucesso de Thieves, George começou a pensar na transição dos personagens criados no jogo para as páginas. Ainda sem muita experiência editorial, o autor convocou os amigos para lhe ajudar na missão.

"Se fôssemos apenas escrever nossas aventuras favoritas, teríamos uma revista em quadrinhos em prosa, repleta de clichês. Para criar algo realmente único, seria necessário rever alguns aspectos fundamentais do universo. Sempre fui fã confesso de HQs, mas algumas convenções eram bobas, para dizer o mínimo. Uniformes apertados, a utilização de superpoderes para combater o crime, tudo era meio bobo. E chegamos ao mais delicado: as origens dos poderes. Nos livros e em nossos jogos, os personagens adquiriam os poderes de diversas fontes. Para criar um cenário legítimo dentro do contexto de ficção científica, precisávamos de uma causa plausível para os poderes".

E a causa veio por sugestão de Melinda Snodgrass, braço-direito de Martin na concepção de Wild Cards: um vírus alienígena que altera de maneira imprevisível as estruturas genéticas dos personagens. Ao trazer a ideia da causa única, Melinda também criou Dr. Tachyon, o personagem que tenta controlar os efeitos do vírus após a liberação na Terra. Tachyon se transformaria em um dos personagens mais emblemáticos da série.

A importância dos curingas

Outra preocupação de George e Melinda era como limitar os poderes dos personagens. A solução veio com o conceito de que nem todos iriam contrair o vírus. Para o autor, o importante era deixar claro que a vasta maioria das mutações – tal como a vida real – trariam mudanças maléficas. Além disso, existia uma preocupação em limitar os efeitos do vírus dentro do universo.  Após experimentar restringir a atuação do vírus de forma geográfica, os escritores chegaram à uma solução: nem todos seriam infectados, e a maioria iria morrer.  Com isso, 9% dos infectados sobreviventes sofreriam deformações; os curingas; contra 1% dos infectados ganhariam poderes incríveis – os ases.

"De certa forma, são os coringas que fazem o universo de Wild Cards realmente único. Os ases já têm suas contrapartidas no universos de Marvel e DC (os superheróis), mas queríamos criar personagens de personalidade complexas e sombrias. Nossos coringas são uma ruptura dentro do universo de superheróis. Na época, não existia ninguém pensando em uma ideia como Jokertown – o bairro dos curingas.", relembrou George. Os vilões ganhariam em um momento seguinte quatro livros dentro da série, com histórias focadas no bairro.

O legado

Com os personagens definidos, George e Melinda começaram a convocar o time que iria ajudar a dupla na construção de Wild Cards. Naturalmente, os escritores que já participavam da turma dos jogos de tabuleiros foram os primeiros a embarcar na missão, trazendo novos e velhos personagens. Howard Waldrop foi o responsável por criar Jetboy, uma homenagem ao herói dos quadrinhos Airboy, que morreria no dia 15 de setembro de 1946 na tentativa de evitar a dispersão do vírus. Com isso, o primeiro livro teria que cobrir um período de 40 anos, já que a maioria dos colaboradores estavam escrevendo contos que se passavam no presente.

O desafio imposto por Howard veio junto à uma feliz coincidência, quando a Bantam ofereceu a George um contrato para três livros, facilitando uma criação de enredos conectados em um universo maior. O formato provou-se um sucesso, com 12 obras publicadas em um espaço de 7 anos e o surgimento de derivados como jogos e revistas em quadrinhos.  Porém, a série perdeu força nos anos 90. Três livros foram lançados em outra editora, mas o sucesso não se comparou às obras da Bantam.  A série ganhou uma sobrevida no começo durante a primeira metade dos anos 2000, com a reimpressão dos oito primeiros livros e o lançamento de duas novas obras.  No fim de 2008, a Tor, atual casa da série, anunciou um grande investimento para Wild Cards, com o lançamento de seis tomos (incluindo High Stakes, lançado em agosto do ano passado), a reimpressão dos cinco livros iniciais e outros cinco novos lançamentos.

O futuro

A mudança de casa editorial provocou uma mudança nos rumos da série, que conquistou uma nova geração de fãs graças ao trabalho da Tor e naturalmente ao sucesso da ‘outra’ série de George RR Martin. No entanto, o grande boom de Wild Cards pode estar prestes a acontecer. Em agosto do ano passado, o autor anunciou em seu blog que a Universal adquiriu os direitos da adaptação da série.

"Espero que vocês estejam empolgados como eu. Claro, Hollywood é Hollywood, e nada é certeza durante o desenvolvimento de uma série... Mas espero, cruzo os dedos, que Wild Cards esteja nas suas telas nos próximos dois anos", escreveu o autor, ressaltando que não se envolverá na adaptação, já que ele tem contrato de exclusividade com a HBO, por conta de Game of Thrones.

Mesmo sem envolvimento direto na adaptação, o nome de George deverá ser utilizado pelos executivos como um chamariz e certamente terá a atenção dos fãs de Game of Thrones, mesmo aqueles que não tenham familiaridade com o material. Com uma base fiel de fãs, Wild Cards também sempre contou com um esforço de controle de continuidade e enredos amarrados, facilitando o trabalho dos produtores em adaptar personagens consagrados da série como JetBoy, Croyd, os Quatro Ases, O Grande e Poderoso Tartaruga, Fortunato, Astrônomo, entre outros. "Wild Cards é um conjunto de histórias de superheróis para grande grande, uma representação mais fiel de como os poderes iriam afetar o mundo e seus habitantes. Acho que ao longo dos anos podemos perceber que é uma série que aprendeu com os erros e acertos e sempre buscou um crescimento realista. A Marvel por exemplo apresenta um mundo real, mas um mundo que é constantemente reiniciado. Aqui,  buscamos contar histórias que os quadrinhos não têm coragem de contar.”

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.