HQ/Livros

Entrevista

Omelete entrevista Eduardo Spohr

Autor de Anjos da Morte fala sobre o futuro de seus anjos, adaptações de livros e o novo momento da literatura brasileira

06.06.2013, às 00H18.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 15H00

Você já disse que Anjos da Morte é o livro que você sempre quis escrever. Por tal motivo, achas que ele é a sua melhor obra?

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Eduardo Spohr - Crédito: Extra

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É difícil julgar. É como me perguntar qual o filho que eu mais gosto. Cada um deles tem um processo diferente. Batalha do Apocalipse, por exemplo, foi o livro que escrevi quando estava desempregado e foi difícil por causa disso. Eu acordava de manhã não sabia o que ia acontecer. Era prazeroso, mas ao mesmo tempo eu fiz sem saber no que ia dar.

Filhos do Éden - Herdeiros de Atlântida, eu reinventei toda a minha escrita. Quis fazer algo mais simples com uma linguagem mais rápida. Eu o escrevi uma vez e depois fiz tudo de novo, o reescrevi inteirinho. E Anjos da Morte teve a dificuldade pela parte histórica, toda a pesquisa também.

Levo um ano e meio para escrever um livro, não posso dizer que prefiro esse àquele, quem pode dizer isso é o leitor. Acho difícil falar qual é o meu preferido. Mas Anjos da Morte é sim o livro que sempre quis escrever. Eu sempre quis falar sobre o século XX.

Leia a resenha de Anjos da Morte

Para retratar essa época, você viajou, pesquisou livros, filmes e outras fontes. Como foi esse processo? Como você fez para transpor a sensação de estar no meio de um conflito como a Segunda Guerra Mundial?

A pesquisa no local é sempre uma boa opção. Não diria que essencial, mas ajuda bastante. Escrevi sobre Israel em A Batalha do Apocalipse, por exemplo, e nunca estive lá. Pesquisei como um louco para conseguir retratar bem como seria estar lá.

A pesquisa em si traz a emoção para os romances. O romance é emoção pura, esta é a principal caraterística de um livro. É como um filme: o principal objetivo é emocionar quem está usufruindo daquela obra. Por isso que ir até o local me ajudou muito em Anjos da Morte.

Quando cheguei na Normandia, por exemplo, que vi os sítios históricos, o clima da região - lá era muito úmido, as pessoas se comportavam de forma peculiar - influenciou demais na hora de escrever. Em um momento do livro os personagens vão pra Amsterdã e lá é uma cidade muito peculiar. As pessoas te tratam de um jeito muito especial. As vezes, talvez nem o livro consiga passar essa sensação genuína, mas o importante é ir lá e sentir isso, depois tentar transpor pelas palavras um pouco do que é estar lá.

Depois de Anjos da Morte, vem Paraíso Perdido. Ele encerrará uma trilogia? Qual é o seu próximo passo?

Com certeza o arco destes personagens, desta história, vai acabar em Paraíso Perdido. O que não quer dizer, por exemplo, que eu não possa fazer outras histórias dentro deste universo. Pensando assim, pode ser até que eu faça outro livro intitulado Filhos do Éden. Mas, sem dúvida, a história que comecei em Herdeiros de Atlântida se encerra em Paraíso Perdido.

Um de seus personagens favoritos é Denyel, protagonista de Anjos da Morte. O que mais o atrai e como você se relaciona com ele?

Ele é o contrário do Ablon, protagonista de A Batalha do Apocalipse. Eles dois são meus preferidos, pois chegam ao mesmo ponto: nós somos responsáveis por tudo que conquistamos e construímos. Existem fatalidades, mas em geral, nós construímos tudo que acontece conosco.

Tem gente que vive reclamando: "estou mal no meu trabalho". Amigo, você precisa fazer alguma coisa para mudar. Se você está sofrendo, a responsabilidade por isso é sua. Você precisa saber se superar. O seu sucesso e seu fracasso são cultivados por você. É duro ouvir, mas quando fracassamos a culpa é nossa.

Dentro deste contexto, o Ablon é o lado bom. Ele constrói uma trajetória de honra e glória, pois sempre perseguiu tudo que acreditava e uma hora teve sua recompensa. Já Denyel é o contrário: por não correr atrás de seus princípios ele acaba recebendo o que ele merece - o que, obviamente, não é algo bom.

Isso acontece muito no nosso trabalho. Quando recebemos alguma tarefa que não concordamos em fazer, a escolha é sempre nossa. No caso do Denyel, mesmo ele achando aquilo errado ele foi lá e fez. Seja na ficção ou na vida real, esse tipo de escolha sempre volta e acaba por influenciar diretamente na nossa vida. Eu acredito bastante neste tipo de metáfora.

Após dois livros de grande sucesso, como é a sensação de um novo lançamento? Há insegurança, ansiedade? Como são os dias antes ver sua obra nas mãos dos leitores?

Não tem porque se sentir inseguro. Mesmo que ele não vá bem, isso pode acontecer. O importante é saber que você fez o máximo que pôde. Pensando nisso, não tem o que lamentar. Se me pedissem para lançar um livro em quatro meses e eu o fizesse sem cuidado, aí sim lamentaria, pois não dei meu melhor.

Todos os livros que lancei até agora, posso falar com certeza, eu realmente fiz o máximo que pude. Se ele não for bem, é algo que está além dos meus poderes. E se for mal, mais uma vez, é algo que está além dos meus poderes. Como disse, acredito que o que construí é de minha responsabilidade. Eu faço o que eu posso então não tem o que lamentar.

Leia a resenha de Anjos da Morte

Estamos em um ótimo momento da literatura brasileira. Temos muitos leitores, mas há também a parte do preconceito. Qual é a sua visão desta nova fase?

É a melhor possível. Na verdade, acho que ia acabar acontecendo de qualquer maneira. Não fosse eu, Raphael Draccon ou o André Vianco, por exemplo, as pessoas acabariam se interessando por isso. Antes da internet o acesso a este tipo de livro era mais limitado. Agora, com ela as pessoas começaram a ter acesso a este material.

No passado, a comunicação estava restrita aos grandes veículos e talvez não tivesse espaço. Mas enfim, cada um tem o direito de gostar do que quer. Mas hoje é melhor por termos acesso ao material que quisermos.

O contato com os leitores hoje é muito maior devido à internet. Quais os pontos positivos e negativos disso?

Negativo, nenhum. Positivo é poder saber do que eles gostam de fato e o que eles pensam da sua obra. O melhor é escutar crítica, pois ela te ajuda, de verdade. É claro que tem a construtiva e a destrutiva - essa última, na maioria das vezes, não tem nada a ver com você, mas com alguma coisa na vida dele. As construtivas são positivas, me ajudam a crescer.

Eu não tenho problema com trolls, por exemplo. Se ele quer falar, deixa falar. Como falei, às vezes o cara destrói sua obra sem nenhum respeito. Isso não tem nada a ver com você, mas sim algum problema na vida dele.

A literatura brasileira fantástica tem uma identidade?

Não sei. Nunca parei para pensar nisso. Acho que os autores que eu conheço e mantenho contato não estão muito preocupados com isso, mas sim em escrever o que gostam. E a identidade talvez venha de uma forma não-intencional.

Brinco sempre dizendo que a gente tem que escrever o que gosta e não fazer isso pensando em ser o novo Monteiro Lobato. Se começar assim já está errado. Acho que a gente (escritores fantásticos) não escreve para criar uma identidade de forma proposital. Penso em escrever e ser lido, somente.

Alguns escritores já fazem suas obras pensando em mostrá-las em outras mídias. Seja em filme, HQ ou série. Você acha que isso pode acabar diminuindo a qualidade da obra?

Na verdade, eu acho isso ótimo. Mas também varia de caso pra caso. Em geral, para passar de uma mídia para outra, não é necessário ficar igual, o importante é ser fiel à essência do livro. Por exemplo, o filme de O Senhor de Anéis não é igual ao livro, mas você sente Tolkien ali. O mesmo acontece com a série da BBC, Sherlock. É clara a influência de Conan Doyle.

Não acho que diminui a qualidade, não vejo problema em escrever pensando nisso. Mas claro, se isso não complicar o livro. Há de ser um bom material para o que será adaptado, por exemplo.

Leia a resenha de Anjos da Morte

E se você fosse adaptar suas obras? O que você gostaria de fazer?

Adoraria fazer algo assim. Mas cada coisa no seu tempo. Primeiro o livro tem que ser levado para a língua inglesa. Pois não tem como um filme com grande produção ser apenas um sucesso local, é preciso vender no mundo inteiro. Não que ele precise ser falado em inglês e produzido lá fora, mas precisa ter o valor fora de sua fronteira nativa - por isso ele precisa do inglês.

Estou empenhado nisso agora, em passar o livro para o inglês. Ele já foi publicado na Holanda, na Alemanha e em Portugal - mas ainda é pouco. É preciso ter ele em inglês para os próprios editores avaliaram o material. Estou correndo atrás disso. Bancar uma tradução é algo caro, precisa ser uma pessoa muito boa. É um objetivo próximo e claro: fazer o livro acontecer fora do Brasil e ir ao exterior para promovê-lo.

Em sua opinião, qual o legado que seus livros deixam para a literatura brasileira?

Acho que cabe ao leitor dizer isso. Vai ter gente que não gosta e outros que gostam. É difícil essa avaliação partir de mim. Gosto de todos, pois, como disse, são como filhos. Mas fico feliz em ver que as pessoas gostam. Assim como tenho livros que me marcaram, posso ver que é possível marcar a vida das pessoas de alguma forma.

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