Séries e TV

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Arquivo X - 20 Anos | Os Fãs

Conexões emocionais, sociais e postais que se estenderam além da geografia

13.09.2013, às 18H39.
Atualizada em 29.06.2018, ÀS 02H25

Em meados de 1995, no período entre a segunda e terceira temporadas de Arquivo X, as legiões de fãs de ficção científica ao redor do mundo se faziam a mesma pergunta: os fãs da série poderiam chegar a exercer sobre a mídia a mesma influência que os stars warriors ou os trekkers? E essa peculiar pergunta partia de um crescente e assustador apelo que a tal série, do tal Chris Carter, vinha alcançando junto a esse mesmo público.

Arquivo X

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Parece impossível conceber tal mundo, onde a Internet não fosse preponderante para  o estabelecimento de qualquer coisa, mas quando Arquivo X notou-se como obra criativa influente e bem sucedida, a rede era uma realidade de proporções limitadas, incapaz de ser responsável por qualquer transformação massificada. Se a série se tornou o que se tornou, isso só aconteceu devido a uma forma de transmissão de informação milenar e unificada, também subestimada pelos circuitos menos eruditas: o boca-a-boca.

Orgulho de ser Nerd

Imagine-se como um fã de ficção científica que passava muito tempo imerso em universos fantásticos que reuniam elementos atrativos desse gênero, trabalhando galáxias e tecnologias impensáveis e quase sempre imponderáveis... Imagine-se assim e, ao mesmo tempo, descobrindo Arquivo X, que na contramão de tudo isso, trazia o "possível" para o jogo do improvável e o fazia com lógica e seriedade. Era como o Santo Graal da existência nerd. Algo que se poderia defender diante de qualquer leigo, fazendo parecer que todas aquelas tramas, agora sim, despertavam para uma existência justa.

De espectador pra espectador, virando de fã pra fã. É mais do que óbvio que o apelo ambiguo da série era seu verdadeiro trunfo. Os espectadores regulares assistiam e se fascinavam com a condução do embasamento teórico perante o fantástico. Os espectadores esclarecidos assistiam para se orgulhar de terem confirmadas as suas crenças. Mais de uma vez durante os nove anos de série ouvi teorias de Mulder (David Duchovny) sendo usadas como fundamentais, ouvi os contra-argumentos de Scully (Gillian Anderson) sendo repassados como base verídica. A série foi se tornando uma espécie de enciclopédia involuntária, que tornava a discussão sobre vampiros ou alienígenas - antes ridicularizadas - em sérias e importantes para o desenvolvimento intelectual das pessoas.

Não demorou muito para que Arquivo X tivesse suas complexidades transformadas em estudo, em pesquisa, em prêmios, em cartilha... Todo fã de ficção científica é um apaixonado nato por razões óbvias. O universo do gênero é tão flexível e dependente da crença que seus admiradores precisam de uma imensa capacidade de defenderem suas perspectivas. Reconhecer a importância ou a inteligência por trás da criação de planetas e civilizações alienígenas nunca foi fácil para a mídia ou para a crítica especializada. Se hoje em dia isso se alcança com mais facilidade, provavelmente Arquivo X tem algo a ver com isso.

Arquivo X Os Fas 01

Com isso em mente, Chris Carter e sua equipe conduziram a série poupando o público do fantástico visível e trabalhando apenas com a sugestão. Quando o público cético via Scully reagindo mal ao momento em que Mulder dizia a palavra "lobisomem", se identificava com ela. Mas quando a condução do episódio colocava-a diante de evidências científicas ou mitológicas que sustentavam tal hipótese, esse mesmo público era seduzido pela possibilidade daquela tão irresistível "verdade". Dentro de todos nós sempre existiu, em alguma instância, um infante louco para acreditar em vampiros. Arquivo X tinha muitos motivos para ser tudo que acabou sendo, tinha tudo para conquistar mais e mais.

Excers

Falar sobre a minha experiência como excer talvez ajude a entender a dimensão da série. Conheci Arquivo X quando ela estava na sua quarta temporada. Morava na Baixada Fluminense, no interior do Rio de Janeiro, no interior do interior da cidade e do bairro em questão. O primeiro episódio que assisti foi exibido na Record, numa postura do canal que precisa ser louvada até hoje. Arquivo X chegou até a televisão brasileira da mesma forma discreta com a qual chegou na televisão estadunidense. Não demorou muito e a audiência da série começou a chamar a atenção e a incomodar a concorrência.

Os episódios eram exibidos aqui com um atraso considerável. Ainda que a Record tenha exibido a série inteira (entre altos e baixos), as temporadas demoravam muito para chegar. Eu, lá no meu interior, para conseguir ver os episódios anteriores aos da quarta temporada, precisava de medidas drásticas. Ainda que já existisse a Internet, ela não era popular e passava batida pelo meu universo campestre. Porém, existiam as publicações, e no que diz respeito a Arquivo X, elas eram vastas e valiosíssimas. A Starlog e a Sci-Fi News foram algumas das que me ajudaram muito a ficar por dentro de tudo, de alguma maneira. O apelo de Arquivo X crescia tanto que a Sci-Fi News, por exemplo, não deixava uma só edição sair sem alguma chamada de capa dedicada à série.

Nesse final da década de 90, enviei uma cartinha para uma dessas publicações, pedindo para que outros fãs me contactassem para me ajudar com o que tinha perdido. Fiz isso sem nenhuma expectativa e, duas semanas depois que o endereço foi publicado, as cartas começaram a chegar de todas as partes do país. Eram em média 50 cartas diferentes por semana, e continuei recebendo de remetentes novos durante meses, num sinal claro de que a revista continuava sendo adquirida ou repassada de várias formas. Várias dessas pessoas me ajudaram muito com a série. Eu enviava a elas fitas de vídeo virgens e elas gravavam os episódios da Fox para depois me mandar as fitas de volta. Assim consegui assistir tudo que estava atrasado e tudo que veio depois disso.

Arquivo X Os Fas 02

As trocas de informações eram constantes e vinham das mais diversas maneiras. Havia todo tipo de associação a fã-clubes e de busca por itens da série. Convenções, encontros, maratonas, vigilias... Minha realidade para discutir teorias não era a Internet (os fóruns já eram bem estabelecidos nessa época), mas páginas e páginas de cartas entravam e saíam da minha casa com discussões a respeito. Logo eu mesmo comecei a gravar fitas para outros que tinham estado na mesma situação que eu, formando uma rede extensa de ligações sociais e emocionais. E o mais importante: nada disso passou incólume pela mídia, que pela primeira vez parou de avaliar criticamente esses movimentos, passando a abraçá-los como manifestações do que seria o verdadeiro futuro da fórmula seriada para a televisão. Arquivo X era uma obra de vanguarda - e seus fãs também eram vanguardistas.

Um segundo filme só foi possível por conta desses fãs e se houver um terceiro, esse também será o maior dos motivos. A Fox sempre entendeu a força da série em números e capital, sendo ela a primeira a lançar edições especiais das temporadas em DVD, acreditando fortemente no interesse do fã por boxes tão luxuosos e caros. Cada um desses aspectos é cultivado até hoje sob forte atenção. O fã de Arquivo X pode sim reconhecer todos os problemas que envolveram a série, mas nunca abandonará a máxima pouco elegante, mas inocentemente honesta, que permeou toda a história dele e tudo que ele representa. O fã de Arquivo jamais deixará de ser um fã. Forever Excer.

E para você? Como foi a experência de assistir e acompanhar Arquivo X? Conte-nos nos comentários!

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