Cena de A Concierge Pokémon (Reprodução)

Créditos da imagem: Cena de A Concierge Pokémon (Reprodução)

Séries e TV

Crítica

A Concierge Pokémon usa utopia da marca como plataforma para aprendizado

Contida na fofura e generosa na esquisitice, série tem um charme surpreendente

Omelete
4 min de leitura
03.01.2024, às 15H25.
Atualizada em 03.01.2024, ÀS 15H41

Por baixo de todo o seu espírito marketeiro, a franquia Pokémon sempre foi, narrativamente falando, uma história sobre autoaperfeiçoamento. Ash Ketchum queria ser um mestre, e para isso tinha que colecionar centenas de criaturinhas adoráveis (facilmente reproduzíveis em mil produtos, é claro) e vencer milhares de batalhas épicas - mas também tinha que aprender a confiar, a entender o outro, a abandonar a própria mentalidade adolescente autocentrada que parecia tão fundamental para o seu sucesso carreirista e se integrar ao mundo com mais harmonia, mais gentileza e, enfim, mais sabedoria. Ash estava a caminho de ser um grande campeão, mas também a caminho de ser uma parte funcional da sua sociedade.

A Concierge Pokémon, nova série da franquia, troca os traços do anime pela técnica stop-motion, mas entende essa ambição narrativa da franquia como poucos produtos a sair dela nos últimos anos. Ash sai de cena para dar espaço a Haru (voz da atriz Non no original em japonês), jovem cheia de inseguranças que é contratada como a nova concierge do Pokémon Resort, um local paradisíaco onde as criaturas e seus donos podem aproveitar uma variedade de atividades relaxantes. Para quem não está familiarizado com o termo, o concierge é o responsável por receber e acompanhar hóspedes durante sua estadia em um hotel ou resort, dando dicas e resolvendo problemas que possam surgir pelo caminho.

O impulso a partir daí é seguir uma abordagem episódica, apresentando um hóspede diferente a cada episódio, com um dilema Pokémon diferente para Haru resolver, certo? Bom… mais ou menos. Com apenas quatro capítulos à sua disposição, A Concierge Pokémon até ensaia um estilo caso-da-semana, mas deixa muito claro que sua prioridade narrativa é a transformação da própria Haru, em vez dos milagres que ela opera (meio estabanadamente) na vida daqueles que cruza.

Daí que a série se mostra surpreendentemente comedida no apelo à fofura, por exemplo. A direção de Iku Ogawa, profissional pescado dos curtas-metragens de stop motion japoneses, está mais interessada nas excentricidades do mundo que é capaz de construir com feltro e massinha do que em povoá-lo com o maior número de criaturinhas fofas possível. Não nos leve a mal: os Pokémon ficam, mesmo, uma gracinha quando renderizados dessa maneira artesanal, e o trabalho técnico da produção é rico e detalhado, não só para os personagens como também para os ambientes tropicais que eles habitam (é sempre bacana ver a água se misturando às criações sólidas do stop motion, por exemplo).

Mas é em piadas visuais surpreendentes, como aquela recorrente em que a câmera dá um zoom inesperado no rosto de sua protagonista, de preferência congelado em uma expressão bizarra, e tinge a tela em preto-e-branco, tentando traduzir um momento de angústia e ansiedade dela, que A Concierge Pokémon nos convence de verdade. Ogawa se delicia em pequenas quebras de expectativa como essa, que pontuam a série com um charme esquisitão inegável, perfeitamente encaixado ao texto de Doki Harumi, leve mas singularmente focado em sua protagonista cheia de neuroses.

É claro que a transformação de Haru só é possível por conta de outro elemento que é inextricável da franquia Pokémon: o utopismo. Como Ash, a protagonista de A Concierge Pokémon acredita estar no caminho da realização profissional. Como o de Ash, esse objetivo de Haru é só plataforma para o aprendizado de uma vida mais orgânica, de menos bravata, menos nervosismo de performance - uma vida que todo mundo ao redor dela já parece conhecer, e tem toda a paciência de ensiná-la. Com colegas de trabalho sábios e prestativos, uma chefe desinteressada em qualquer medida concreta de desempenho, amplo espaço para errar e se redimir depois, e clientes que nunca demonstram qualquer sombra de destempero, é muito mais fácil se tornar a melhor versão de si. 

Mas esse é justamente o ponto, na verdade. Na tradição das melhores aspirações narrativas da franquia em que está inserida, A Concierge Pokémon nos mostra que, em um mundo no qual todo mundo (ou quase, pelo menos) se importa com o bem-estar de todo mundo, todo mundo está a caminho da felicidade.

Nota do Crítico
Ótimo
A Concierge Pokémon
Em andamento (2023- )
A Concierge Pokémon
Em andamento (2023- )

Criado por: Doki Harumi

Duração: 1 temporada

Onde assistir:
Oferecido por

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