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Crítica

Gypsy - 1ª Temporada | Crítica

Série estrelada por Naomi Watts deveria ser drama psicológico sobre obsessão, mas acaba sendo um exercício de paciência para o espectador

01.08.2017, às 14H30.
Atualizada em 06.08.2017, ÀS 00H07

Buscando explorar os limites do subconsciente, Gypsy traz a indicada ao Oscar Naomi Watts no papel de Jean Holloway, uma mulher que usa o ofício de psicoterapeuta para finalidades obscuras. A personagem aparenta ser uma típica mãe do subúrbio norte-americano com uma vida mais estável do que empolgante, mas se revela alguém capaz de ultrapassar os limites éticos da sua profissão, colocando em risco seu emprego e criando uma bola de neve que afeta sua família, suas amizades e a segurança dos seus pacientes.

A série começa colocando um grande ponto de interrogação sobre a cabeça de Jean. Em um primeiro momento, fica a dúvida se ela é uma profissional que usa de meios pouco ortodoxos para tratar seus pacientes ou se ela é alguém que inveja a intensidade da vida deles de tal modo que se torna obcecada em viver as mesmas experiências que eles relatam. Os pacientes contam durante as consultas sobre seus problemas familiares e conjugais e, partindo disso, Jean cria situações para, por exemplo, conhecer a filha relapsa de uma paciente que se mostra uma mãe controladora ou a ex-namorada de um paciente que segue obcecado pela antiga relação. O assustador disso tudo é perceber que Jean, usando a alcunha de Diane, não se limita a colher os pontos de vistas anonimamente dessas pessoas, mas começa a se envolver com todas elas.

O grande problema - mas não o único - de Gypsy está na velocidade dos acontecimentos. É impossível assistir os dez episódios sem oscilar entre as recorrentes ondas de sono e a ansiedade em adiantar momentos completamente inúteis. Lisa Rubin, a idealizadora novata da série, claramente teve dificuldades em aplicar técnicas mais atraentes para contar a história sem precisar ser didática a ponto de mostrar sistematicamente cada passo dado pela protagonista. O espectador não precisa perder tanto tempo vendo Jean andando de um lado para o outro, ou esperando alguma coisa, ou parada pensando - isso só ajuda a tornar a trama mais entediante.

Outra coisa que pesa contra a série é a personalidade dos personagens: todos eles têm zero ou nenhum carisma. Isso talvez não fosse um problema se soasse intencional - de fato, há personagens feitos para serem pessoas sem graça, com vidas tingidas em tons pastel. Contudo, há outros construídos sobre a ideia de que são avassaladores, sedutores e perigosos, mas, mesmo esses soam no máximo como pessoas irritantes. Um exemplo gritante disso é Sidney Pierce, vivida por Sophie Cookson, mais conhecida por Kingsman: Círculo Dourado. A barista é descrita por dois personagens como uma espécie de furacão magnético que atrai todo mundo para sua confusão irresistível. Mas, no fim das contas, Sidney é só uma jovem com síndrome de Peter Pan, mimada, egoísta e cansativa.

E não é só ela: a série é um festival de clichês. A própria Sidney é uma barista que canta em uma banda de rock e usa um discurso de espírito livre para justificar a falta de perspectivas. Michael Holloway - interpretado por Billy Crudup, de longas de sucesso como Jackie e Spotlight -  é o marido de Jean, um advogado sem graça que começa, de certa forma, a flertar com a atraente secretária. Até as mães da escola de Dolly (Maren Heary), filha de 9 anos de Jean e Michael que começa a dar sinais de não se adequar ao gênero que foi designada ao nascer, são caricaturalmente chatas. Na reta final, a mãe de Jean, vivida pela ganhadora do Emmy Blythe Danner, é introduzida na série e não é nada mais que um estereótipo da matriarca invasiva e constrangedora.

Ainda que a família de Jean tenha grande peso na história, o núcleo central gira em torno de Jean, Sidney e, é claro, o paciente que liga as duas. Sam Duffy (Karl Glusman, de Animais Noturnos) se trata com Jean e seu principal assunto sempre é o fracasso de seu relacionamento com Sidney. A relação da barista com Sam é problemática de todos os lados: enquanto Sidney não tem a menor responsabilidade afetiva com o rapaz, ele demonstra todos os sintomas de alguém com uma obsessão amorosa - uma combinação potencialmente destrutiva. Os dois são pessoas problemáticas e emocionalmente estáveis, e quando manifestam o mínimo sinal de recuperação, Jean induz de forma sádica situações que os levam novamente em direção às suas fragilidades.

Uma coisa que é realmente interessante da série é ver o desdobramento do potencial de cada personagem. No caso de Sam, fica claro que ele fantasia situações relacionadas à ex-namorada e a culpa por suas expectativas que atrapalham sua própria saúde emocional. Sidney nega qualquer responsabilidade sobre a obsessão do rapaz, mas, com o tempo, vemos que ela alimenta isso sempre que possível pelo conforto de ter alguém absolutamente dependente dela. A própria Jean, na reta final da série, se mostra muito mais problemática quando começa a manipular as pessoas ao seu redor só pelo prazer de ter controle.

Contudo, o desfecho da primeira temporada é tão decepcionante quanto todo o resto. Até as histórias em segundo plano, focadas na relação de Jean com a viciada em drogas Allison Adams (Lucy Boynton) e com a neo-hippie Rebecca Rogers (Brooke Bloom) são desinteressantes e contraditórias em relação a tudo que é apresentado sobre a protagonista. Os pontos de convergência que fazem com que personagens se esbarrem no encerramento da série são extremamente forçados e todas as pontas soltas deixadas por Jean são questionáveis demais para uma personagem obcecada por controle. No fim, só o que salva é a reunião de um elenco interessante - e mesmo assim é uma pena ver rostos talentosos sendo desperdiçados em uma trama modorrenta como a de Gypsy.

Nota do Crítico
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