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Crítica

Manhunt: Unabomber | Crítica

Apesar de produzida por um canal documental, Manhunt:Unabomber surpreende como uma produção dignamente artística

29.12.2017, às 09H06.
Atualizada em 30.12.2017, ÀS 20H06

O último quadro de Manhunt:Unabomber é a mais perfeita síntese da surpreendente discussão filosófica proposta pelos roteiros. Nele, o protagonista Fitz (Sam Worthington) está numa estrada deserta e para o carro em frente a um semáforo. Ele olha fixamente para o vermelho que simboliza a parada e mesmo que não diga nada, está exercitando na própria mente uma série de questionamentos com os quais conviveu durante todo o seu tempo trabalhando no caso do “homem-bomba”. A tecnologia e seus códigos foram criados para que a controlemos ou são elas que nos controlam e nos provocam um cego exercício constante de obediência?

Produzida pelo Discovery, Manhunt:Unabomber começa com a sensação daqueles documentários dramatizados que colocam atores ruins para encenarem o que as narrações dizem. É quase como se esse formato fosse inevitável e ficar procurando pelos códigos estilísticos do gênero se torna até mesmo natural. A tarja de “Baseado em Fatos”, a imagem clara e sem filtros... Ninguém pode culpar o espectador por achar que estaria prestes a assistir algo menos apurado.

A sensação morre ainda no primeiro episódio. O ótimo elenco que também inclui Chris Noth e Jane Lynch, se impõe nas cenas rapidamente e o texto corretíssimo logo vai afastando a atmosfera de “produção B” típica desse mercado. A história de Fitz - que com o que chamava de Linguística Forense ajudou a capturar um dos maiores terroristas do país - vai se desenvolvendo de forma tão envolvente e bem organizada – emocionalmente falando – que sem dúvida tudo seria diferente se ela tivesse nascido em outra emissora.

Desarmando

A primeira coisa que salta aos olhos é o texto apurado que contorna os roteiros da minissérie. Os produtores não se esquecem que estamos falando de Ted Kaczynski (Paul Bettany), um prodígio que entrou em Harvard aos 16 anos e estabeleceu uma filosofia de vida que foi eruditamente redigida e publicada. Então, tudo que sai da boca de Ted (o terrorista) precisa ser coerente perante as manipulações idealistas que ele propaga. Com narrações que invocam trechos do manifesto de Ted, os episódios não demonizam suas ideias, mas aproveitam para estudar o impacto delas em pessoas que não estão dispostas a explodir outras para bradar um ponto de vista.

Fitz é o mais afetado. A série começa quando ele chega para ajudar no caso com uma função muito inusitada para os anos 90: linguística. A busca pelo unabomber era tão improdutiva que o bureau já estava apelando para tudo. Fitz chega ao departamento como o patinho feio, desacreditado de seus métodos e precisando se impor o tempo inteiro. A fórmula é irresistível, já que o espectador começa muito cedo a torcer para que as análises textuais de Fitz apresentem resultados que façam os que o denegriram se envergonhem disso. Como com todo bom roteiro do gênero, a cada vitória do “herói”, a vontade de continuar só aumenta.

A direção dos episódios é discreta, evita muitos adornos lúdicos, mas tem um cuidado especial em não deixar que o público pense que se trata apenas de algo documental. Por tratar-se de uma história real, o fim é previsível e inevitável, mas os roteiros buscam formas constantes de fugir da burocracia histórica. Esses esforços são guiados por um ótimo texto, que sempre usa as ideologias de Ted como base, desafiando Fitz com elas ou simplesmente mostrando como elas são correlacionáveis.

Manhunt:Unabomber é mais uma série para a galeria de antologias criminais que American Crime Story popularizou. O seu estilo ainda é ligeiramente pautado pelo canal que a produz, mas quem se der a oportunidade de conferi-la, vai se surpreender com um trabalho artístico que vai além da simples “encenação documental”.

*Manhunt:Unabomber está disponível pela Netflix no Brasil

Nota do Crítico
Ótimo

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