Atendendo a pedidos, o Omelete cria uma coluna irmã para a LÁ FORA e mergulha nas bancas e livrarias para comentar os principais lançamentos recentes. Nesta primeira coluna: Criaturas da Noite, Crise de Identidade, Narrativas gráficas e Slam Dunk & Vagabond.
Criaturas da Noite
Por Érico Borgo
|
Depois de um início que ficou devendo em qualidade gráfica, a Ediouro Quadrinhos apresentou neste mês uma sensível melhora nas suas publicações.
A bacana HQ franco-belga Aquablue, por exemplo, ganhou em sua edição número 3 um papel superior ao jornal em que ela vinha sendo publicada (além de um acréscimo de 60 centavos no preço). Valeu a pena, já que a mudança valorizou a arte de Olivier Vatine e não deve impactar muito nas vendas, já que o público consumidor desse tipo de história provavelmente aprovará o reajuste em função da edição mais agradável. O mesmo aconteceu com Arthur - Uma epopéia celta.
Mas o grande salto qualitativo da editora é a recém-lançada edição especial Criaturas da Noite, de Neil Gaiman e Michael Zulli. O gibi teve um tratamento esmerado e ótimo acabamento, prova de que o selo felizmente também planeja vôos mais altos do que aproveitar o papel das revistas de cruzadas.
A edição traz a adaptação em quadrinhos de dois contos do livro Fumaça e Espelhos: O preço e A filha das corujas. No primeiro, um sujeito comum que vive no campo começa a notar que seu gato chega cada vez mais machucado de suas excursões noturnas. A situação piora a cada dia, até que o dono do bicho decide ficar de tocaia para ver o que está maltratando seu animal daquela maneira. No outro, o inglês conta a história de uma menininha abandonada na escadaria de uma igreja. Enviada para ser criada por uma freira, a criança torna-se uma mulher de beleza incomparável, que começa a deixar os homens da cidade violentos.
É curioso notar como o conto de Gaiman - um dos melhores do livro Fumaça e espelhos - perde força quando levado aos quadrinhos. Apesar do belo traço de Zulli, a idéia da maligna aparição descrita no romance é muito mais sugestiva e aterradora que a pintada pelo artista no gibi. Já na segunda história o caminho é inverso. Zulli é mais feliz nas imagens da protagonista e o conto nos quadrinhos fica mais interessante que no livro.
Criaturas da noite tem 56 páginas e custa 14,90 reais.
Crise de Identidade
Por Érico Borgo
|
Chegou às bancas brasileiras o aguardadíssimo pontapé inicial das mudanças no universo dos super-heróis da DC Comics. Trata-se de Crise de Identidade, primeira edição de uma minissérie em sete partes com roteiro de Brad Meltzer, ilustrações da dupla Rags Morales e Michael Bair e capas de Michael Turner.
Bastante comentada pelo teor polêmico, já que tira o DCU (DC Universe) de seu habitual cenário fantástico e deixa-o mais pé-no-chão como a concorrente Marvel Comics, a trama do romancista Brad Meltzer (Os milionários) faz uma exploração da moral dos combatentes do crime e coloca-os em situações de ambigüidade, num contexto sombrio. Tudo isso desencadeado por um estupro brutal de alguém que a editora alardeou na época como sendo uma importante personagem de seu panteão. Balela... a sujeita é tão importante quanto aqueles oficiais de segurança que ganham destaque em episódios de Jornada nas Estrelas só para serem mortos na metade do episódio.
Mesmo assim, o covarde sacrifício é o bater das asas da borboleta das teorias do caos. Como a HQ foi um sucesso enorme de crítica e público, a editora levou adiante o projeto - agora com mais peito - e promete que a contagem de corpos vai aumentar no vindouro evento Infinite Crisis, que começa em outubro e terá um salto cronológico de um ano em todas as revistas da editora.
Se o final da minissérie-estopim de todo esse furdunço é boa ou não, ainda estamos há seis meses de saber. No entanto, é inegável que Meltzer sabe como criar um bom suspense e Morales tem competência para colocar as idéias do escritor no papel com dramaticidade sem perder a cara de gibi de herói. Começo interessante. Tomara que continue assim.
Crise de identidade tem 44 páginas e custa 5,50 reais.
Narrativas gráficas
Por Fabrício Grellet
|
Demorou... mas chegou a hora do público brasileiro ter acesso à segunda grande obra teórica escrita pelo mestre Will Eisner: Narrativas Gráficas. O volume que faz companhia ao célebre livro Quadrinhos e Arte Seqüencial, foi lançado recentemente pela Devir Livraria e é leitura obrigatória não somente para quem comprou o livro anterior, mas também para todos aqueles que são fãs ou "praticantes" das histórias em quadrinhos.
Ao longo de suas 170 páginas, a obra nos mostra indagações, caminhos e soluções para este meio narrativo em capítulos interessantes e - claro - inteligentes como: "O que é uma história? / A função de uma história"; "Contando uma história"; "Imagens como ferramentas narrativas"; "Todos os tipos de histórias" - um capítulo que é um verdadeiro show, com diversos exemplos ilustrados de cada uma das possibilidades narrativas de uma história; "O leitor"; "Influências do leitor"; "Idéias"; "O processo da escrita"; "Narradores"; "Estilo de arte e narrativa" e alguns outros de fazer cair o queixo.
A qualidade geral e o nível de aprofundamento existente em Narrativas gráficas são sublimes, e o "tratado" começa em seu prefácio indicando que: "As histórias em quadrinhos são, essencialmente, um meio visual composto de imagens. Apesar das palavras serem componentes vitais, a maior dependência para descrição e narração está em imagens entendidas universalmente, moldadas com a intenção de imitar ou exagerar a realidade. O layout da página possui efeitos de grande impacto, técnicas de desenho e cores chamativas que conseguem captar a atenção do criador. Apesar da grande visibilidade e da atenção compelida pelo trabalho artístico, a história ainda é o componente crítico de uma revista em quadrinhos. Não é somente a estrutura intelectual na qual se baseia toda a arte. É mais do que qualquer outro elemento, é aquilo que faz o trabalho perdurar. Este é um grandioso desafio para um meio que sempre foi considerado coisa de criança. A tarefa é trazer à tona a reação do leitor através das imagens. Em Narrativas Gráficas a concentração está na compreensão básica da narração com desenhos. Este livro irá examinar a narrativa e pesquisar os fundamentos de sua aplicação no meio das histórias em quadrinhos".
Precisa mais?
Narrativas gráficas tem 168 páginas e custa 40 reais.
Slam Dunk & Vagabond (Edição definitiva)
Por Érico Borgo
| ||||||
|
Não sou um apreciador de mangás. Acho as HQs japonesas mal escritas e atropeladas (como boa parte dos gibis de heróis também, vale dizer). Com raras exceções, claro, como a dupla Koike/Kojima (Lobo Solitário), Akira Toriyama (Dragon Ball) ou Katsuhiro Otomo (Akira)... isso sem falar no genial Osamu Tezuka. Aos 38 anos, Takehiko Inoue é outra delas. O mangaká (criador de mangás) é um autor de mão cheia. Consegue escrever ação, romance, comédia e suspense com a mesma habilidade.
São de Inoue dois dos melhores mangás que você pode encontrar nas bancas brasileiras. Slam Dunk foi sua primeira obra de destaque, seguida por Vagabond. Curiosamente, o caminho das duas aqui no Brasil foi invertido. Por tratar-se de obra de apelo mais fácil, lutas de espadas e samurais, Vagabond chegou primeiro às bancas pela Conrad. Slam Dunk veio bastante tempo depois, pela mesma editora.
Vagabond conta a história de Miyamoto Musashi, o maior samurai de todos os tempos. A HQ se passa por volta de 1600, quando um sangrento conflito culminou na unificação do Japão. Nesse cenário devastado, Musashi vaga em busca de guerreiros poderosos para enfrentar e ampliar seu domínio sobre as técnicas de lutas com espadas. No traço deslumbrante de Inoue e seu texto conciso, a história poderia figurar ao lado das maiores obras de arte da história japonesa. Todos os exemplares da HQ disponíveis já foram publicados no Brasil, mas o autor voltou a escrevê-la e novas edições devem aparecer futuramente nas bancas. Enquanto isso, a Conrad publica as Edições definitivas do mangá. Os belos livros tem acabamento mais nobre que as edições previamente publicadas e merecem lugar de destaque na estante. Inicialmente, vinte edições bimestrais (269 páginas, 25 reais) estão previstas para esta nova fase.
Completamente diferente de Vagabond em tema, menos relevante para a nona arte, porém ainda mais divertida é Slam Dunk. Nele conhecemos Hanamichi Sakuragi, um adolescente grande, encrenqueiro e desengonçado, apaixonado por Haruko, uma jovem que é entusiasmada pelo basquete. Para impressioná-la, e sem pensar muito, ele se enfia no time da escola, capitaneado pelo irmão mais velho de sua amada. Pra piorar, o astro da equipe é o disciplinado e habilidoso Rukawa, por quem Haruko está verdadeiramente apaixonada.
A arte de Inoue aqui é bem mais convencional, dentro dos padrões do mangá, mas chama atenção principalmente nos momentos de ação - nos jogos. Já o texto é engraçadíssimo. Sakuragi é um idiota adorável e o autor sabe como conduzir a trama para torná-lo ainda mais cativante. As três primeiras edições desta nova publicação já estão nas bancas. Cada uma tem 200 páginas em preto e branco, capa colorida, tamanho 13,5 x 20 cm. (formatinho), e custa 9,90 reais.
Antes de encerrar esta nova coluna, uma curiosidade sobre Slam Dunk. Quando Inoue alcançou a incrível marca de 100 milhões de exemplares vendidos de seu gibi, trancou-se em uma escola pública e durante três dias ilustrou todas as lousas das salas de aula. O resultado foi a criação, registrada em documentário, de uma HQ inédita de Slam Dunk. Quando ele terminou, a escola foi aberta para visitantes, que puderam acompanhar essa incrível exposição. Enquanto isso, o quadrinhista jogava basquete na quadra com quem quisesse. Ao final, tudo foi apagado e ficou apenas o filme e a lembrança de quem esteve por lá. Legal, não?