|
||||
O cinema e a vida ensinam: casamentos, festas e aniversários são a melhor oportunidade para quebrar o pau em família. Os créditos floreados e as primeiras cenas de A noiva síria (The syrian bride, 2004), de Eran Riklis, sugerem um conto-de-fadas. Aos poucos, porém, o acerto de contas entre parentes brigados leva a crer que um novo Casamento à indiana (Monsoon Wedding, de Mira Nair, 2001) está a caminho.
Mona (Clara Khoury) vive com os pais nas Colinas de Golã, território militarizado tomado da Síria pelos israelenses em 1967, na Guerra dos Seis Dias. Ir e vir é proibido nessa terra de ninguém. Por isso, assim que se casar com o astro da TV síria Tallel (Derar Sliman), Mona não poderá voltar para casa nem rever os seus entes. No entanto, esse é o menor dos problemas da família.
O pai vive preso pelos israelenses por protestar a favor da devolução das colinas. Um dos irmãos casou-se com uma russa e ganhou a ira do pai e dos religiosos locais. Sem contar a irmã mais velha, que quer estudar mas o marido não deixa, a sobrinha que namora um israelense em segredo... Enquanto aborda esses dramas pessoais, o diretor Riklis não consegue sair do trivial. Música melosa, humores inflamados, olhos marejados de choro, francamente, está longe de ser novidade.
A noiva síria cresce à medida que o destino de Mona se desenha. A noiva segue em carreata à fronteira, assim como os chegados de Tallel. Mas os empecilhos burocráticos perigam sabotar o casório. Nesse ponto, aquilo que até agora se apresentou didático e superficial ganha uma profunda metáfora política. O casamento - não é exagero concluir - representa a reunião impossível entre as Colinas de Golã e a sua Síria natal.
Entender o contexto sociopolítico é imprescindível para que o espectador capte esses desdobramentos do filme. Tanques da ONU vagabundeiam sem autoridade nesse terreno arenoso cuja paisagem só vislumbra cercas e postos de controle. Uma bela francesa, no seu último dia de serviços na Cruz Vermelha Internacional, corre desesperada de um lado para o outro atrás de legitimar o casamento. Mas não há solução no horizonte: só o café e as maçãs vindas de Golã parecem importar para quem vive dos dois lados da fronteira.
Seria uma comédia de absurdos se o drama não fosse real. E o fato do filme ser co-escrito e dirigido por um judeu israelense, com dinheiro de companhia israelense, só realça a sua pertinência. Apesar das fraquejadas iniciais, A noiva síria vale a atenção.
Ano: 2004
País: França, Alemanha, Israel
Classificação: LIVRE
Duração: 97 min
Direção: Eran Riklis
Roteiro: Suha Arraf, Eran Riklis
Elenco: Hiam Abbass, Makram Khoury, Clara Khoury, Evelyn Kaplun, Uri Gavriel