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Crítica

Crítica: Antes da Lua Cheia

Bahman Ghobadi continua registrando as fronteiras sempre em mutação de Irã e Iraque

10.06.2010, às 18H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 14H03

Mudança é palavra de ordem nos filmes do curdo Bahman Ghobadi. Nascido no Curdistão iraniano, próximo da fronteira entre Irã e Iraque, o diretor sempre conviveu com essa sensação de transitoriedade. Tempo de Embebedar Cavalos e Tartarugas podem Voar (os dois longas de Ghobadi lançados no Brasil) recorrem ao gênero do filme de estrada para dar forma a essa urgência.

Produzido em 2004, após a invasão do Iraque pelos EUA, Tartarugas podem Voar já abordava o cenário novo: particularmente, a passagem de uma realidade medieval, mas conhecida, para uma moderna, mas imprevisível. Ambientado nos primeiros dias após a queda de Saddam Hussein, Antes da Lua Cheia (Niwemang, 2006) volta a trabalhar nessa chave. Mas o gênero escolhido, parente do road movie, é um pouco diferente: o filme de travessia.

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O protagonista é Mamo (Ismail Ghaffari), popular cantor curdo que, findo o regime do sunita Saddam, é convidado a voltar para o Iraque para se apresentar num concerto público. Já idoso, Mamo reúne seus filhos músicos num ônibus estrada afora - mas, como em toda aventura de travessia, essa "Sociedade do Anel" sofrerá baixas e talvez não chegue a seu destino na hora marcada.

Elementos consagrados do gênero, como o momento da clarividência no início da jornada (no lugar do clássico cego maltrapilho entra um filho de Mamo com visões de mau agouro) e o vale que ecoa vozes sem rosto (a vila onde foram exiladas as mulheres curdas, as "sereias" do filme), são adaptados por Ghobadi à realidade local. Essa aderência às aventuras de travessia favorece uma opção que o cineasta faz pela fantasia - enquanto os seus longas anteriores tinham um viés mais naturalista, aqui há espaço para delírios oníricos e até operísticos.

O que permanece é a obsessão de Ghobadi pelo choque das transformações. O filme já abre com uma tradição secular, uma rinha de galos, interrompida por esse símbolo do ocidente que é o toque de um celular. A violência gerada pela mudança, porém, é mais sutil neste longa. Saem os arames farpados e as minas terrestres que mutilam crianças de Tempo de Embebedar Cavalos e Tartarugas podem Voar, entram as torres de transmissão que cortam toda a paisagem iraniana-iraquiana.

É um tipo distinto de impacto, como se as mudanças, embora constantes, já tivessem sido assimiladas. Deve ser por isso que Ghobadi opta em Antes da Lua Cheia por acompanhar os adultos (os últimos a lembrarem do passado), e não as crianças.

Nessa trajetória, faz todo o sentido que o cineasta tenha decidido, no ano passado, filmar o longa descolado e urbano Ninguém Sabe dos Gatos Persas. Cronista de uma região que não para de mudar, Ghobadi deve seguir nessa linha temática ainda por um bom tempo.

Saiba onde o filme está passando

Nota do Crítico
Bom
Antes da Lua Cheia
Niwemang
Antes da Lua Cheia
Niwemang

Ano: 2006

País: Irã, Iraque, Áustria, França

Classificação: 14 anos

Duração: 107 min

Onde assistir:
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