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Crítica

Girimunho | Crítica

O sobrenatural no dia a dia e o tempo como companhia

26.04.2012, às 22H26.
Atualizada em 11.11.2016, ÀS 19H00

O sobrenatural é um elemento importante em Girimunho, filme dirigido por Helvécio Marins e Clarissa Campolina a partir de uma pesquisa de anos que Marins faz com potenciais personagens no sertão de Minas Gerais. Mas não é aquele "sobrenatural" típico, história de fantasma (embora tenha um pouco disso no fiapo de trama do filme), e sim sobrenatural em uma das definições da palavra: que vai além do natural.

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Assim como é habitual nos filmes do coletivo mineiro Teia, como O Céu Sobre os Ombros, é muito difícil divisar encenação e documental em Girimunho. Bastu, a senhora de longos cabelos grisalhos que protagoniza o filme, acaba de perder seu marido, que faleceu no sono. Acontece que Bastu continua ouvindo-o pela casa, como se a permanência das coisas - a passagem do tempo e o trânsito de pessoas na cidade de São Romão obedecem à lógica cíclica do eterno retorno - ganhasse aqui uma manifestação física, a do morto que não quer partir.

Esse luto não declarado, disfarçado de paranormalidade, pode servir de chave para o espectador assistir a Girimunho com o olhar ideal de quem desconfia de tudo que está diante dos olhos. Em outras palavras, pode tornar acessível aos desatentos um filme de imersão cujo público primeiro é aquele que procura sempre, no estado de suspensão que só o cinema permite, a oportunidade de espantar-se com o mundo.

As "assombrações" presentes em Girimunho são do mesmo tipo que povoam filmes de Lucrecia Martel, Jia Zhang-ke ou Apichatpong Weerasethakul, cineastas que enxergam pulsão em cenários cansados, que filmam o banal e o estanque com a consciência de que mesmo o banal e o estanque estão sujeitos a mudança. Cineastas, enfim, que tornam sobrenaturais as coisas naturais justamente para devolver-lhes - neste nosso século em que os sentidos se perderam em meio à oferta absoluta de sentidos - a sua própria natureza.

De Martel, especialmente em A Mulher sem Cabeça, Girimunho pega a predileção pelo extracampo, pelo que acontece fora de enquadramento, como na cena em que a mesa da máquina de costura é arrastada pela casa sem que vejamos a pessoa que a arrasta - solução literal para a ideia de devolver vida às coisas. Com Jia e Apichatpong, Marins e Clarissa dividem um senso de memória coletiva que é muito caro a essa geração de cineastas. Especificamente com Mal dos Trópicos, de Apichatpong, Girimunho se assemelha na forma como o folclore local se materializa como legado - nem que seja somente numa música que Maria do Boi, amiga de Bastu, tenta impedir sem sucesso que seu neto saia cantando pelas ruas.

O principal parentesco de Girimunho, porém, é com outro filme nacional de 2011, igualmente excepcional, o inédito em circuito Histórias que só Existem Quando Lembradas (Marina Meliande é montadora de ambos). São esforços de procurar no Brasil Profundo - o Norte de MG em Girimunho e o Vale do Paraíba em Histórias... - um espaço de fantasmagoria que permita, ao mesmo tempo, resgatar um sentido da imagem e criar novos vínculos com ela. A questão, então, é deixar que esses filmes cheguem a nós.

Girimunho | Cinemas e horários

Nota do Crítico
Excelente!
Girimunho
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Girimunho

Ano: 2011

País: Brasil

Classificação: 10 anos

Duração: 90 min

Direção: Clarissa Campolina, Helvécio Marins Jr.

Elenco: Maria Sebastian Martins Alvaro, Luciene Soares da Silva, Wanderson Soares da Silva, Maria da Conceição Gomes de Moura

Onde assistir:
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