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Voando Alto | Crítica

<i>Voando alto</i>

07.08.2003, às 00H00.
Atualizada em 05.11.2016, ÀS 12H06

Voando alto
View from the Top
EUA - 2003 - 87min.

Comédia / romance

Direção: Bruno Barreto
Roteiro: Eric Wald


Elenco:
Gwyneth Paltrow, Christina Applegate, Mark Ruffalo, Candice Bergen, Kelly Preston, Mike Myers, Marc Blucas, Jessica Capshaw, Andrew Chitko

Bruno Barreto e Paltrow

Em Voando alto (View from the top, 2003), de Bruno Barreto (Dona Flor e seus dois maridos, O que é isso, companheiro?, Bossa Nova), Gwyneth Paltrow interpreta Donna, uma garota de família fragmentada do interior dos Estados Unidos, que sonha em mudar de rotina e, literalmente, subir na vida. Depois de acompanhar pela TV o depoimento de uma famosa comissária de bordo, Sally Weston (Candice Bergen), Donna decide ingressar na carreira de aeromoça. A partir daí, o filme mostra o seu empenho em entrar para a Royalty Airlines junto com as amigas do interior, até que um caso amoroso, com o bonitão Tim (Mark Ruffalo), abala os planos profissionais de Donna.

Pronto. Se você procura exclusivamente uma indicação para uma noite descompromissada de sábado, saiba que Voando alto sofre, como fica evidente, de falta de personalidade, com um roteiro preguiçoso e melodramático do estreante Eric Wald. Vale ressaltar, em meio à pasmaceira, a fotografia sempre belíssima do brasileiro Affonso Beato (Deus e o Diabo na terra do sol, Tudo sobre minha mãe, Mundo cão, Deus é brasileiro) e os coloridos uniformes kitsch da figurinista Mary Zophres, colaboradora habitual dos irmãos Coen. De resto, sobram as fórmulas que você já viu incontáveis vezes, como o conflito de interesses entre o amor e a carreira profissional.

Detalhe: um outro conflito de interesses, que aconteceu fora de cena, vale algumas linhas a mais. Principalmente porque evidencia como funciona a força centralizadora de produtores e megaestrelas e, no geral, a máquina hollywoodiana.

Como Voando alto custou 35 milhões de dólares à Miramax e parou nos 15 milhões de bilheteria, configura-se o fracasso. Com isso, surgem desabafos como o de uma Gwyneth revoltada, apelidando o filme de View from my ass, em referência aos inúmeros closes que recebe seu formoso bumbum. Na verdade, a calipígia atriz não percebeu, ou espertamente não quis aceitar, que o alicerce do filme é exatamente essa mistura de espírito vulgar com atitude suburbana, e que os dotes de Christina Applegate e Kelly Preston são igualmente bem focalizados.

Mas não é esse o centro da questão, e sim o peso que recai sobre o diretor. Afinal, não é todo dia que um brasileiro assume responsabilidades dessa tonelagem no mercado norte-americano. E, em uma entrevista ao Jornal do Brasil, Barreto deu, entre outras justificativas, que a interferência do estúdio prejudicou o filme, originalmente escrito, filmado e editado como uma sátira de humor negro, com final romântico. Aí veio a primeira projeção-teste, com uma audiência de meninas adolescentes. A reação não foi boa, e a Miramax decidiu refazer o início, na forma de uma comédia romântica, para que o público tivesse maior empatia pela protagonista. Assim, entre tons doces e amargos, o filme ficou desequilibrado, defende-se Barreto.

E vendo o filme, compreendemos a posição do diretor. Algumas piadas investem, sim, no sarcasmo corrosivo - coisa que a maquiagem carregada e o kitsch ajudam a reforçar. E como em todo bom humor negro, as personagens são maltratados, zoados mesmo que indiretamente. Toda a condição do papel de Mike Myers - um instrutor estrábico que nunca chegou a comissário devido à sua condição física, apesar da nota máxima no exame teórico - deixa claro essa acidez que Barreto procurava. Mas a ela segue-se (por possível orientação dos executivos) uma sucessão interminável de canções melosas dos anos 80, pitadas de sentimentalismo e de flertes pueris. O Omelete cronometrou: em apenas vinte minutos de película, tocaram cinco músicas de menina ao fundo.

Resta lamentar. Voando alto já não era grande coisa, mas, se tivesse liberdade e controle de criação, o brasileiro poderia ter feito um Enfermeira Betty (Nurse Betty, de Neil LaBute, 2000) todo seu. Acontece que Barreto não trabalha no esquema independente de LaBute, mas sob a supervisão da gigante do setor. Por outro lado, o diretor não tem do que reclamar. Trabalha desde 1990 com filmes nos Estados Unidos. Ninguém no Brasil conhece como ele as engrenagens de Hollywood. E Barreto sabe que as regras do jogo, como os clichês de seu filme, são mais do que evidentes e manjadas.

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