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Um Homem Perdido

Filme francês faz interessante retrato do fotógrafo enquanto vampiro de almas

12.06.2008, às 16H00.
Atualizada em 06.01.2017, ÀS 06H02

A década de 80 foi de conflito no Líbano, com sucessivas invasões israelenses que forçavam a fuga de civis muçulmanos. Esse contexto não é explicado no início do filme francês Um Homem Perdido (Un Homme Perdu, 2007), mas é fácil pensar nele quando vemos um misterioso homem (vivido por Alexander Siddig, das séries 24 Horas e Star Trek) fugindo ensanguentado. A legenda nos diz que estamos na capital, Beirute, e que corre o ano de 1985.

Corta para 20 anos depois, no norte da Síria, e o tal homem perdido agora se "camufla" entre lavradores. Não trabalha e é expulso. Vai parar num posto de fronteira, onde seduz uma mulher e é rendido por policiais. Mais do que o seu silêncio, o que chama atenção no homem é o misto de desapego e urgência - desapego das coisas banais que o cercam, urgência com que olhou para a mulher como se fosse reviver uma memória que perdera.

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Se não fosse o flashback do começo saberíamos ainda menos desse misterioso homem perdido, e aí entra o fotógrafo francês Thomas (Melvil Poupaud). A primeira vez que o francês viu o libanês foi quando o flagrou com a câmera beijando aquela estranha. Curioso, Thomas então se aproxima: descobre que o homem se chama Fouad. Fouad e Thomas então dividem um táxi para Amã, na Jordânia, onde a história dos dois se aproxima mais.

Não convém explicar demais como essa relação se dá, mesmo porque Thomas e Fouad trocam poucas palavras e muitas imagens. A cineasta franco-libanesa Danielle Arbid constrói a personalidade dos dois ao longo do filme na base da oposição silenciosa: Thomas é aberto, corre o mundo sem raízes, fotografa sem respeitar a privacidade alheia. Fouad é recluso, perdeu-se de Beirute mas sua alma parece ter ficado lá, e apega-se aos seus segredos com as unhas.

Depois de uma exposição bem trabalhada, sem pressa, aos poucos Arbid começa a sugerir ao espectador que o tal homem perdido do título pode não ser apenas Fouad, mas Thomas. O caráter nômade, a dificuldade com a língua estrangeira, o desespero para guardar imagens de intimidade, tudo em Thomas subentende uma espécie de busca. A questão em Um Homem Perdido não é tanto saber se Fouad um dia se reencontrará com seu passado, e sim entender se Thomas encontrará a si mesmo.

Há muito de trágico, de vazio existencial nessa busca incerta, e o que impacta mais é saber que a história de Thomas é livremente inspirada nas andanças reais do fotógrafo Antoine d'Agata, que serviu de consultor para Arbid. O vampirismo implícito na arte de vagar pelo mundo atrás da verdade dos outros - e tomar essa verdade para si - é o que Um Homem Perdido tem de mais interessante.

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