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Neste fim de semana de feriado religioso, três estréias abordam o tema de maneiras diferentes. Padre Marcelo Rossi homenageia Nossa Senhora, Amos Gitai escava o conturbado nascimento do Estado judaico e Gosta-Gavras investiga o silêncio do Vaticano diante do Holocausto nazista. Escolha difícil, hein? Pois pense duas vezes antes de descartar, ou eleger, Amém (Amen., 2002). O polêmico cartaz que mescla a suástica e a cruz, assinado por Oliviero Toscani, autor das campanhas da grife Benetton, sugere uma ofensa que o filme não ostenta.
O cartaz impacta pela violência simbólica. O filme analisa e convence pelo racionalismo.
Baseado na peça The Representative (Der Stellvertreter), do dramaturgo alemão Rolf Hochhuth, encenada pela primeira vez em 1963, Amém acusa, de fato, a Igreja Católica de silenciar. Em certos momentos até acusa de cooperar com a perseguição anti-semita da SS, o exército do III Reich. Mas o método de denúncia é cauteloso, paulatino e, sempre que possível, baseado em fatos históricos. Constantin Costa-Gavras faz um cinema acessível, sem grandes floreios ou hermetismo. Poderia ser confundido com um daqueles inúmeros filmes sobre a Segunda Guerra, não fosse o conteúdo explosivo e inédito.
A narrativa é conduzida por dois personagens, o primeiro verídico, o segundo ficcional. De um lado, Kurt Gerstein (1905-1945), tenente da SS, perito em química - interpretado por Ulrich Tukur. Do outro, Riccardo Fontana (Mathieu Kassovitz), jesuíta, filho de um conde de enorme influência junto ao papa Pio XII. Criador do gás Zyklon-B, inicialmente desenvolvido para purificar a água dos soldados em campo de batalha, Gerstein assiste, pasmo, a um novo fim dado à fórmula: acelerar a morte dos prisioneiros nas câmaras de gás dos campos de concentração.
Cristão fervoroso, Gerstein se revolta. Procura os seus amigos protestantes, acaba encontrando ajuda em Riccardo. Mas o jovem jesuíta, mesmo munido de farta documentação e do testemunho do tenente, não consegue mobilizar a alta cúpula do Vaticano. A justificativa do papa, seus cardeais e bispos é, apesar de revoltante, de fácil compreensão. Mantendo uma boa relação com os alemães que tomaram Roma, evitam que o Vaticano seja invadido, saqueado, desrespeitado. Além disso, se colocar contra o Eixo seria aceitar Joseph Stalin (1879-1953) e os seus comunistas como aliados. Somando a isso a personalidade apaziguadora de Pio XII, configura-se um acordo nefasto de cavalheiros pela não-agressão mútua.
Como Costa-Gavras convence? Criando um exame moral sem posar de dono da verdade, elencando as razões oficialescas da Igreja sem que essas pareçam inverossímeis. Assim, nocauteia o espectador não pelo choque, mas pelo cansaço - o simples fato de exibir a burocracia hierárquica e diplomática da Igreja no seu auge gera uma raiva muito mais eficiente.