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Crítica

A Menina Santa | Crítica

<i>A menina santa</i>

04.08.2005, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H17

A menina santa
(La Niña santa)
, 2004
Argentina/França/Itália
Drama - 106 min.

Direção: Lucrecia Martel
Roteiro: Lucrecia Martel & Juan Pablo Domenech

Elenco: María Alche, Carlos Belloso, Mercedes Morán, Alejandro Urdapilleta e Julieta Zylberberg

Amalia (María Alche) estuda em colégio católico. Quer saber quando, como e onde Deus lhe dirá qual a sua vocação neste vida. A professora afirma que os desígnios divinos surgirão sem aviso. Na rua, a adolescente se embrenha numa multidão para assistir a uma apresentação musical. O sujeito toca teremim, aquele instrumento eletromagnético movido não a toques, mas a movimentos das mãos no ar. Atrás da pequena Amalia surge um adulto, que a bolina. Ela não recusa a encoxada. Ao som do teremim, uma luz ilumina o seu rosto - é o sinal celeste que Amalia tanto esperava.

Se você acompanha cinema, sabe que a nueva onda argentina está com tudo. E se você conhece bem os hermanos, sabe também que Lucrecia Martel já se impõe como um dos principais nomes desse movimento - mesmo que A menina santa (2004) seja apenas o seu segundo filme. Lucrecia tem a segurança da narrativa dos grandes mestres. Como em sua estréia, O Pântano (La Ciénaga, 2001), os seus corrosivos comentário sociais se revestem de uma linguagem sofisticada. Humor negro de luxo. Veneno em vidro de perfume.

Nessa trama, Amalia é o centro de um carrossel diverso. O pervertido, Jano (Carlos Belloso), é médico convidado para uma convenção hospedada no mesmo hotel onde a menina mora. Coincidência maior, durante o evento Jano engata um flerte com Helena (Mercedes Morán), irmã do dono do hotel - e mãe de Amalia. A situação do doutor piora quando a menina passa a persegui-lo. A menina santa utiliza elementos do filme-mosaico e da comédia de erros para pintar um drama amargo desse mundo em constante desencontro e iminente caos.

Mas não pense que o escândalo tomará conta da história. Isso fica por conta da imaginação do espectador. O que interessa a Lucrecia não é a ação em si, o conflito, mas antes a psicologia dos personagens. E mesmo essa análise foge do didatismo. Nada é explícito, muita coisa fica subentendida. Diálogos aparentemente banais revelam, por exemplo, o desgosto de Helena por não ter dado filhos homens ao ex-marido. Movimentos de câmera e closes calculados sugerem que Amalia, já descrente das aulas de religião, nutre interesse pelo doutor por pura pulsão sexual.

A menina santa pode não ser impregnante como O Pântano, mesmo que seja tão visceral quanto. Mas a evolução é visível, técnica e também narrativa. Não à toa, o crítico Inácio Araújo diz na Folha de S. Paulo que parece que os atores de Martel estavam lá desde sempre esperando por ela, tal o ajuste a seus personagens.

Essa fidelidade com que encena a realidade fica expressa no retrato dos índios, maioria da população mas tratados como sub-raça pelos europeizados. Lucrecia nasceu em Salta, Norte precário do país, e sabe do que fala. Aqui eles surgem como empregados do hotel, seres praticamente invisíveis, mas sem os quais esse ambiente desmoronaria. Repare na cena em que a arrumadeira índia espalha spray em toda a sala, enquanto uma mulher descobre estupefata o segredo de Dr. Jano. Uns poucos fazem a sujeira, outros tantos limpam. O hotel se transforma em alegoria para a própria Argentina, numa das leituras possíveis desse filme de imensa abrangência.

Nota do Crítico
Ótimo
A Menina Santa
La Niña Santa
A Menina Santa
La Niña Santa

Ano: 2004

País: Argentina

Classificação: 14 anos

Duração: 106 min

Direção: Lucrecia Martel

Elenco: María Alche, Mercedes Morán, Carlos Belloso, Alejandro Urdapilleta, Mía Maestro

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