Filmes

Entrevista

Anna Muylaert | Meus filmes são sobre as mulheres, diz diretora

Cineasta fala sobre seus novos projetos e a ida ao Festival de Berlim

23.01.2016, às 00H23.

Ainda recuperando-se do furacão Que Horas Ela Volta? e de toda uma campanha para brigar pelo Oscar, que acabou não se concretizando, a cineasta paulistana Anna Muylaert já tem uma nova maratona internacional em vista, com a inclusão de seu mais recente trabalho, Mãe Só Há Uma, na seção Panorama do 66º Festival de Berlim(11 a 22 de fevereiro). Ela saiu de lá no ano passado laureada com o prêmio do júri popular pelo drama estrelado por Regina Case. Agora, vai regressar à Berlinale com um drama sobre um jovem, Pierre (Naomi Nero), às voltas com a notícias de que sua mãe biológica não é a que ele pensava, sendo forçado a mudar de identidade, sob o teto de novos pais (vividos por Dani Nefussi e Matheus Nachtergaele). 

None

Volto agora para Berlim com menos expectativa, levando um filme menor do que era Que Horas..., feito com apenas R$ 1,8 milhão, todo rodado com câmera na mão em locações, que está acabando de nascer”, admite a diretora, agora às voltas com menos pressão, mas uma vez mais apanhada num turbilhão de holofotes inerentes ao sucesso que vem fazendo no exterior. “Volto lá agora relaxada. Relaxei para ser feliz”. 

Na entrevista a seguir, Anna fala de sua trajetória internacional e do que espera da Berlinale, encarada como um dos maiores festivais do planeta.     

Qual é a representatividade estética (e mesmo política) de voltar a pôr um filme no mundo via exterior, via Berlim?

Eu fui muito bem tratada em Berlim com Que Horas Ela Volta? no ano passado, por isso resolvi voltar. Mas eu pensei várias vezes se mandava Mãe Só Há Uma pra lá agora ou não, porque ele é um projeto menos pretensioso e menos popular em sua narrativa, construído como um B. O. (sigla para filmes de baixo orçamento) que custou cerca de US$ 450 mil. É difícil que ele ganhe prêmio de público como aconteceu no ano passado com o Que Horas..., mas, ao mesmo tempo, ele tem toda a cara da mostra Panorama, ao tratar de afirmação de identidade. Então eu relaxei. E mandei. Mas estou sem expectativa.     

O que a maternidade representa nesse novo projeto?

Agora é menos sobre mães e mais sobre identidade. Sobre alguém que aprende a afirmar o que é. Quando eu resolvi que seria diretora de longas, lá atrás, eu me tranquei no meu escritório e fiquei pensando que tipo de cineasta eu queria ser. Cheguei a conclusão de que queria ter um repertório. Decidi que faria poucos filmes, mas todos sobre um tema: a mulher. Nessa época eu tinha escrito um livro de contos, Quando o Sangue Sobe à Cabeça, com 25 histórias de mulheres, e a trama de Que Horas... tinha gênese numa delas. Mas eu achei que não estava preparada para estrear falando desse tema, pois seria muito complexo, e acabei fazendo Durval..., cujo protagonista é um homem, embora um homem frágil, pouco viril, meio Hamlet. Depois veio Proibido Fumar, que mostra uma mulher fragilizada, e em seguida Chamada a Cobrar, com uma mulher refém de um homem. Eram sempre mulheres abusadas até que a Jéssica, a personagem da Camila Márdila, em Que Horas..., forte e determinada, chegou para quebrar esse paradigma. 

E de que maneira você aborda a condição da mulher agora? 

Criar a Jéssica me deixou mais forte. Mãe Só Há Uma foi gerado no momento dessa minha mudança. Ele nasceu na barriga do Que Horas Ela Volta? enquanto eu o estava pós-produzindo e foi montado enquanto ele estava sendo lançado pelo mundo. Ele não tem foco na mãe e sim no filho, a partir da troca de identidade. Ele não tem muito a ver com meus outros filmes. Talvez seja até mais difícil do que os outros, por partir de uma tragédia: a tragédia de perder tudo, até a própria identidade. Mas é uma história de afirmação, tendo um adolescente de 17 anos, o Naomi Nero, que é sobrinho do Alexandre Nero como protagonista... e numa entrega total, decidido a ser ator.  

Seu primeiro longa, Durval Discos, de 2002, fez carreira lá fora, mas foi lá no início dos anos 2000, em meio à ebulição da Retomada. Qual é a diferença que você encontrou no tratamento dado ao cinema brasileiro lá fora entre Durval e seus dois últimos longas?

Tenho a sensação de que o Que Horas... teve o tratamento que teve lá fora por ser o melhor filme que eu fiz até agora. Como ele é mais universal, a resposta foi melhor. Em geral, os meus filmes são mais bem tratados nos Estados Unidos, talvez pela minha pegada mais pop. Tanto Durval... quanto Proibido Fumar tiveram direitos de remake negociados lá fora.  

Além de Mãe Só Há Uma, a seção Panorama da Berlinale estende o tapete vermelho para o Brasil a partir da ficção Antes o Tempo Não Acabavade Sérgio Andrade e Fábio Baldo, com foco na ciranda de descobertas afetivas de um jovem indígena em Manaus, e do documentário Curumim, de Marcos Prado sobre o brasileiro fuzilado na Indonésia em 2015. O cinema nacional aparece com produções ainda na mostra Fórum Expanded, com Ruínade Gabraz Sanna, e com Muito Românticoum projeto gestado ao longo de uma década por Melissa Dullius e Gustavo Jahn. Há, na mostra oficial, em luta pelo Urso de Ouro, um curta-metragem capixaba em concurso: Das Águas Que Passam, de Diego Zon.

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.