Filmes

Entrevista

<i>O jardineiro fiel</i>: Omelete entrevista Fernando Meirelles

<i>O jardineiro fiel</i>: Omelete entrevista Fernando Meirelles

13.10.2005, às 00H00.
Atualizada em 21.09.2014, ÀS 13H19

O jardineiro fiel

The Constant gardener
EUA, 2005 - 129 min.
Drama/Suspense

Direção: Fernando Meirelles
Roteiro: Jeffrey Caine

Elenco: Ralph Fiennes, Rachel Weisz, Danny Huston, Anthony LaPaglia, Pernilla August, Sidede Onyulo





Fernando Meirelles
© Gabriela Magnani


Fernando Meirelles
© Gabriela Magnani


O jardineiro fiel
© UIP


O jardineiro fiel
© UIP

Assim como mostrou a história de Buscapé por trás da câmera no início de Cidade de Deus (2003), é preciso voltar no tempo para saber quem é e o que já fez Fernando Meirelles.

Quando ainda estudava arquitetura na FAU-USP, ele começou a fazer vídeos experimentais com um grupo de amigos. No início dos anos 80, esta mesma turma fundou a produtora independente Olhar Eletrônico, responsável pela definição da linguagem do vídeo brasileiro. Além do famoso quadro do videorepórter Ernesto Varella, interpretado por Marcelo Tas, produziu a TV Mix, da Gazeta, e infantis como Rá-Tim-Bum, para a TV Cultura. Nos anos 90, fundou ao lado de Paulo Morelli e Andrea Barata Ribeiro, a O2 Filmes, responsável por diversos filmes publicitários premiados. Enquanto ganhava dinheiro e mais experiência fazendo comerciais, começou a se enveredar para o lado cinematográfico. Primeiro fez O menino maluquinho 2 (1998), co-dirigido com Fabrizia Pinto. Em Domésticas (2001), teve ao seu lado Nando Olival. Palace II (2002), seu curta ao lado de Kátia Lund, serviu como treino para o filme que lhe rendeu fama internacional, o já citado Cidade de Deus. Meirelles foi convidado, então a dirigir seu primeiro longa-metragem internacional, O jardineiro fiel (2005). Foi mais difícil? Quais as dificuldades neste projeto? Houve disputa com o estúdio pela versão final? Saiba tudo isso na entrevista abaixo.

Omelete - Como foi filmar um roteiro que não foi escrito por você?

Fernando Meireles - Essa foi à parte mais difícil do processo todo. Mas consegui chegar a um roteiro que contasse a história que eu queria contar. Recebi o roteiro e 40 dias depois já estava na África procurando locação. Fui trabalhando e mexendo no roteiro o tempo inteiro. Parava a filmagem e mexia no roteiro, estava montando o filme e ainda mexia no roteiro, colocando linhas e tal. Se eu tive alguma dificuldade ou angústia nesse processo foi em relação a isso.

Você tem objetivo de sempre a dirigir filmes que tenham algum engajamento social?

Não sou militante de nada nem ativista de nenhuma organização, só faço filmes sobre assuntos que me interessam. Na verdade os três filmes que fiz até agora, falam sobre exclusão. Domésticas e Cidade de Deus falam sobre exclusão social e esse agora parece voltado a uma exclusão global. Mas esse não será o tema de todos os meus filmes. Estou trabalhando em mais dois projetos que são muito mais filosóficos do que sobre problemas sociais. A razão de nossa existência, a felicidade, eles já vão por outro caminho.

Havia a intenção de dar um tom documental neste filme?

Nós visitamos as locações e a idéia seria filmar na África do Sul a parte do Quênia, reconstruir tudo em cenários. Ficamos tão impressionados com que vimos, as paisagens, as favelas, que eu fiz pressão na produção para que pudéssemos filmar lá. Então as grandes cenas, dentro da favela ou no mercado, foram feitas com uma equipe pequena usando uma câmera de 16 mm, assim o ator pode andar no lugar de verdade, sem que ninguém percebesse que estivesse sendo feito um filme. Todas as cenas feitas nas ruas, a equipe usada era menor do que as usadas em documentários.

No Cidade de Deus você desenvolveu um estilo visual muito forte com o fotógrafo César Charlone. Levar o César foi uma exigência para poder realizar O Jardineiro Fiel?

O César não foi apenas uma garantia, como também uma condição para que eu fizesse esse trabalho. Por ser um filme inglês, teria que ser feito inteiro com uma equipe inglesa. Mas ter o César foi uma condição sine qua non. Sem ele, eu não teria entrado no projeto. Muito do que é atribuído a mim, na verdade é trabalho dele e se ele se dispuser, eu nunca vou largar dele.

A história fala de idealismo e a perda de valores morais. Você poderia falar um pouco sobre isso?

Quando pensei em fazer o filme, eu tinha interesse em colocar um pouco de luz sobre a indústria farmacêutica, que são poderosos e sabem como usar esse poder, mas também nessa nova maneira de controle que está havendo no mundo, através das grandes corporações que mandam no governo e acaba sobrando para a população.

Como foi a pós-produção do filme? Foi você o responsável pelos cortes finais?

O filme foi rodado em 16 mm e 35 mm misturados, passamos para digital em Londres e foi finalizado todo lá. Depois voltou para a película, cada vez mais filmes estão sendo feitos dessa maneira. A montagem levou três meses para ficar pronta, e foi feita em São Paulo. A montagem foi exatamente aquela que eu queria fazer, ninguém me impôs nada.

O livro em que foi baseado o roteiro não é proibido no Quênia? Houve então problemas para filmar lá?

De fato o livro foi banido porque foi escrito durante o governo Daniel Moi, que foi o governo mais corrupto que eles tiveram. Logo o livro faz muitas críticas ao governo queniano. Ao adaptar o livro, nós tiramos um pouco dessa parte, centramos a história na indústria farmacêutica e os arranjos com o governo inglês. Claro que o governo do Quênia não queria que filmássemos lá, então nós íamos filmar na África do Sul. Porém eles perceberam que seria melhor para eles se deixassem as filmagens serem feitas lá, pois traria visibilidade ao país e dinheiro, já que empregamos mão-de-obra local.

Como foi trabalhar com uma produção estrangeira?

Foi bastante tranqüilo, eu tinha uma produção bastante competente e que não deixava que nenhum problema chegasse até a mim. Eu sempre produzi os filmes que dirigi, isso faz com que você fique envolvido com muitos aspectos diversos do processo. Nesse filme eu era apenas o diretor, não me impuseram nenhum limite e isso me fez sentir livre e apoiado para fazer o filme.

Qual será seu próximo projeto?

Eu estou trabalhando em um roteiro que se chama Intolerância 2. É uma história sobre globalização que se passa em sete paises no total de seis histórias. São como se fossem curtas metragens e os personagens estão ligados um ao outro sem saberem, mas a atitude de um interfere na vida do outro. E estou escrevendo um outro roteiro com um roteirista aqui do Rio, só que não vou contar sobre o que é (risos).

Já que é no Rio de janeiro, fatalmente não irá contar com os milhões que você contou para fazer o Jardineiro. Isso será um problema?

Não vejo problema. São duas coisas diferentes. Numa produção feita aqui, preciso ver tudo. Dá muito mais trabalho, mas também o controle é total. Já numa produção internacional, você não se preocupa com nada. Tudo está preparado para você. Você tem tudo na mão. Acho bacana fazer cinema das duas formas.

Mas quanto mais dinheiro, maior é o controle por parte do estúdio

É verdade. Mas gostaria de fazer um filme de 100 milhões de dólares. Até porque faço cinema para o público e não para um grupo pequeno.

Já foi convidado para um projeto desse e se foi, qual?

Fui chamado para fazer Colateral. Mas acabou não acontecendo. Mas sei que ainda outras oportunidades surgirão.

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Omelete no Youtube

Confira os destaques desta última semana

Ao continuar navegando, declaro que estou ciente e concordo com a nossa Política de Privacidade bem como manifesto o consentimento quanto ao fornecimento e tratamento dos dados e cookies para as finalidades ali constantes.