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Nossa Vida não Cabe num Opala

Discussão sobre adaptação do teatro ao cinema é mais interessante que o filme em si

14.08.2008, às 17H00.
Atualizada em 28.11.2016, ÀS 21H02

O inconstante Nossa Vida não Cabe num Opala é tradução fiel dos problemas que cercaram sua realização. Em seu blog, mais de uma vez, o dramaturgo Mário Bortolotto, autor da peça que deu origem ao filme, expressou suas discordâncias em relação ao trabalho feito pelo roteirista Di Moretti - no centro da discussão, a forma como um texto teatral é transferido para um texto de cinema.

De um para outro mudaram-se personagens e diálogos; resiste a premissa: depois da morte do patriarca (Paulo César Pereio), uma família de quatro irmãos de classe média baixa paulistana precisa lidar com a herança maldita deixada por ele, uma dívida com um mafioso de desmanche (Jonas Bloch). Os tais Opalas são a especialidade dos dois irmãos mais velhos, puxadores de carro. Mas, como o título diz, essa vocação é um motivo de orgulho amargo.

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Em última instância, cabe ao diretor Reinaldo Pinheiro - curta-metragista desde os anos 80, em seu primeiro longa-metragem - zelar pela boa transição do teatro para o cinema. Essa passagem se dá aos trancos. Há cenas visivelmente teatrais, como o momento na sala diante da TV, em que a câmera mantém da ação uma distância típica de quarta parede, com os atores atravessando o "palco" pelos lados, como num proscênio. E há as cenas de invenção de sala de montagem, notadamente a não-linearidade nas cenas que envolvem a personagem lynchiana de Maria Luísa Mendonça, Silvia.

São essas as cenas mais inspiradas, porque transcendem o texto. Nossa Vida não Cabe num Opala trata de vidas sufocadas por um misto de determinismo social e hereditariedade falida, e é na hora em que o primogênito (vivido por Leonardo Medeiros) fala de si mesmo para Silvia que isso fica mais claro - do pai, sempre oculto no porta-retrato, ele herdou a mulher, o nome, o vinho... A forma como Medeiros se comunica com meias-palavras, como se as outras metades das palavras já estivessem ditas mesmo antes dele nascer, é bem poética. Poética e natural, uma naturalidade que acaba anulada, dentro do esquema, pela interpretação truncada do caçula (Gabriel Pinheiro).

O filme todo é assim: a cada momento sublime segue um momento precário. A boa premissa da herança de pai e filhos é engessada pela trama maniqueísta do mafioso. Pinheiro não consegue dar unidade ao todo - unidade em termos de trilha sonora (há várias músicas sem um tema a ligá-las), inclusive. Para cada uma boa troca de falas entre Pereio e Milhem Cortaz saem duas constrangedoras entre Bloch e Maria Manoella: "não adianta fugir do seu destino", "você é uma lutadora sem compaixão", etc.

Aí já volta-se àquela discussão inicial, das licenças que Moretti toma em relação ao original... Como a peça de Bortolotto, Nossa Vida Não Vale Um Chevrolet, está regularmente em cartaz, está aí uma boa oportunidade para comparar.

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