Ensaio sobre fraturas afetivas do amadurecimento, Ausência, do cineasta Chico Teixeira, foi o melhor filme do 43º Festival de Gramado, encerrado na noite de sábado sob o açoite de protestos políticos contra as manifestações de repúdio à Presidência da República, na atual gestão de Dilma Rousseff. Centrada na angústia de uma adolescente (Matheus Fagundes) diante do sumiço do pai, do alcoolismo da mãe e do clamor do sexo, a coprodução Brasil/Chile, orçada em cerca de R$ 4 milhões, conquistou ainda os Kikitos de melhor diretor, roteiro e trilha sonora. Em meio a uma quimioterapia, Teixeira não compareceu ao evento, mas enviou um vídeo (doce, como lhe é peculiar) para agradecer ao carinho do evento, que acabou convertido em láureas.
"Chico é o diretor que todo ator sonha ter", gritou no palco a atriz (e musa de Ausência) Gilda Nomacce, em agradecimento pelo sucesso do colega.
Responsável pelos momentos de maior emoção de Gramado em 2015, a dramédia brasiliense O Último Cine Drive-In, de Iberê Carvalho, com estreia marcada para quinta-feira, foi coroado com três prêmios de peso. Venceu nas categorias melhor direção de arte, atriz coadjuvante (Fernanda Rocha, numa interpretação antológica) e ator, dado ao estreante em longas Breno Nina. “Foi uma coragem sua, Iberê, de confiar seu filme a um ator que está no primeiro longa”, disse Breno, festejando um desempenho comovente como Marlombrando, um jovem em busca do pai há muito ausente. O longa de Iberê conquistou ainda o troféu da imprensa especializada, coroando o esforço da Associação Brasileira de Críticos de Cinema em flertar com narrativas de tônus mais popular. O trabalho do cineasta de Brasília é uma ode à resistência cultural das salas de exibição de rua.
Com visual de HQ e energia de filme de animação, a sci-fi Um Homem Só (grande surpresa do festival deste ano - leia mais) foi terceiro longa brasileiro mais premiado da noite. Rendeu a Mariana Ximenes um merecidíssimo Kikito de melhor atriz e a Otávio Müller o troféu de melhor ator coadjuvante. Fechou o pacote com o prêmio de melhor fotografia, consolidando o esforço de Gramado em ressaltar produções com fôlego para dialogar com plateias inchadas de gente.
Na seara latino-americana o vencedor foi o argentino La Salada, de Juan Martín Hsu, sobre imigrantes asiáticos em territórios de colonização hispânica. O melhor curta foi o terror O Corpo, uma aula de direção (assinada por Lucas Cassales) na composição de uma localidade do interior gaúcho onde a aparição de um corpo provoca gestos insólitos e liberta carregos. A fotografia do curta foi a melhor de todo o festival, que peca por ter ignorado, em sua premiação, filmes de solidez inquestionável como Os Fins e Os Meios, de Murilo Salles, e Ochientaisiete, de Anahí Hoeneisen, do Equador. Da mesma forma, foi injusto o desempenho dos atores veteranos Ney Latorraca (em Introdução à Música do Sangue) e Othon Bastos (em O Último Cine Drive-In) não ter recebido uma distinção com um prêmio especial do júri. Que melhor sorte os aguarde.